Título: Vale cancela plano de exportar soja por Sepetiba e acirra briga com prefeitura
Autor: Góes, Francisco
Fonte: Valor Econômico, 11/12/2006, Empresas, p. B9

O município de Itaguaí (RJ), que abriga o porto de Sepetiba, trava uma batalha jurídica com a Companhia Vale do Rio Doce sobre o licenciamento ambiental do terminal de minério de ferro da empresa no porto. A discussão, que subiu de tom nos últimos dias, seguiu-se ao anúncio da Vale de engavetar projeto de R$ 80 milhões para começar a exportar soja pelo local.

O diretor-executivo de assuntos corporativos da Vale, Tito Martins, diz que a empresa tinha as licenças para construir os pátios e instalar os equipamentos para a movimentação de soja, mas o município não emitiu os alvarás para iniciar as obras. A prefeitura de Itaguaí teria pedido compensações, na forma de obras públicas, pelo investimento no terminal de soja.

A contra-partida solicitada teria sido de R$ 25 milhões, em um primeiro momento, e de R$ 8 milhões, em uma segunda etapa. A Vale se negou a dar qualquer compensação. O prefeito de Itaguaí, Carlos Busatto Junior, informou, por meio de sua assessoria, que não se pronunciaria enquanto o caso estiver tramitando na Justiça.

"O assunto soja passou, viramos a página, desistimos do investimento", disse Martins. Mas ele aposta no entendimento com a prefeitura para ampliar a capacidade de exportação de minério de ferro pelo terminal da Companhia Portuária Baía de Sepetiba (CPBS), que deverá exportar 21 milhões de toneladas em 2006. A CPBS é o alvo da briga entre a mineradora e o município.

Na sexta-feira, o secretário de Meio Ambiente de Itaguaí, Jaílson Barbosa Coelho, fez coleta de minério de ferro em 12 pontos das águas da Baía de Sepetiba, em torno ao cais da CPBS. Ele alega que a empresa vem operando em condições inadequadas de contenção do minério de ferro, que é depositado nos navios por correias transportadoras. A cada carga, partes de minério cairiam no mar poluindo a baía.

No fim de novembro, o município autuou a CPBS em R$ 200 mil por "poluição hídrica" causada pelo despejo de minério no mar. A coleta de água feita na sexta será examinada em laboratório e o laudo com as conclusões deve ser encaminhado à Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente (Feema), o órgão ambiental do Estado. Itaguaí quer que, enquanto o trabalho de análise das águas não seja concluído, a Feema não emita a licença de operação à CPBS.

Segundo Coelho, as águas da baía são muito oxigenadas. O oxigênio, somado ao minério de ferro e ao manganês, produz um fenômeno físico-químico que permite a associação de metais pesados, depositados na baía por outras empresas ao longo dos anos. Na própria sexta, a Vale divulgou nota contestando a Secretaria de Meio Ambiente de Itaguaí. No comunicado, a empresa diz que as operações da CPBS estão em consonância com a legislação ambiental vigente no país.

Martín Etchegoyen, gerente de operações portuárias da CPBS, diz que o terminal tem licença prévia de operação e de instalação. Ele reconheceu que o Termo de Compromisso Ambiental da CPBS venceu em 2004, mas afirmou que a Feema comunicou à empresa que as operações do terminal estavam de acordo com a legislação. "Aguardamos a licença de operação da Feema", disse.

O procurador geral de Itaguaí, Alexandre Oberz Ferraz, disse que o município fez duas notificações ao CPBS, em novembro, para que a empresa apresentasse a licença de operação e o Termo de Compromisso Ambiental, sob risco de interdição do terminal. Segundo Ferraz, ao invés de apresentar os documentos, a CPBS obteve liminar na 3ª Vara Cível de Itaguaí, para evitar uma possível interdição. Ferraz nega que a discussão sobre a licença ambiental da CPBS seja uma retaliação do município à decisão da Vale de desistir da exportação de soja pelo porto.

O projeto de soja da mineradora consistia em transportar a oleaginosa pela malha da Ferrovia Centro-Atlântica (FCA), controlada por ela, até Getulândia, no município de Rio Claro (RJ), onde seria construída uma unidade de transbordo para caminhões. Os caminhões seguiram até o porto de Sepetiba, onde seriam construídos silos para armazenagem. Ferraz disse que não haveria condições de suportar o tráfego de caminhões carregados com soja, já que a região tem intenso fluxo rodoviário.

A Companhia Docas do Rio de Janeiro, que é a autoridade portuária de Sepetiba, está preocupada com o conflito. Em 2005, a Vale assinou com Docas um aditivo ao contrato de arrendamento do terminal de minério que lhe permite movimentar soja. Uma fonte disse que a mineradora pagaria à Docas R$ 4,5 por tonelada de soja movimentada. Com base na previsão inicial de movimentar 1,5 milhão de toneladas do grão em 2007, Docas teria uma receita de R$ 6,7 milhões. É um dinheiro que agora pode não entrar no caixa da estatal. A fonte disse que a Vale dá indicações de que pode alegar "força maior" para não cumprir o aditivo, protegendo-se contra uma eventual ação de Docas.