Título: CVM muda regras de securitização e pode tornar viável CRI de varejo
Autor: Fariello, Danilo
Fonte: Valor Econômico, 11/12/2006, Finanças, p. C2

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) publicou na sexta-feira as instruções nº 442, 443 e 444, sobre securitização de recebíveis, com novidades que poderão tornar viável o lançamento de Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI) para investidores de varejo, ou seja, para quem queira aplicar menos de R$ 300 mil. Em janeiro, a Receita Federal tornou isentas de imposto de renda aplicações nesses papéis por pessoas físicas, mas a rigidez de regras da CVM não motivou nenhuma empresa a lançar os títulos para esse mercado.

A principal mudança, que agora poderá levar o CRI de varejo a estrear, é a flexibilização da exigência de concentração de créditos por devedor de 0,5% para 20%. Na prática, essa mudança permitirá que se lance o investimento no mercado com apenas cinco diferentes devedores, sendo que antes eram 200 os exigidos.

O mercado, porém, ainda tem receios quanto ao lançamento do produto ao varejo. Alexandre Assolini, da PMK Advogados, ajuda a estruturar operações de securitização e diz que, apesar de flexibilização na exigência do número de cedentes de crédito, as novas regras trouxeram mais obstáculos ao mercado. Entre elas a exigência de uma instituição financeira para fazer a intermediação do processo de distribuição dos títulos em ofertas acima de R$ 30 milhões. "Isso poderá encarecer o processo", diz.

A superintendente de desenvolvimento de mercado da CVM, Aline de Menezes Santos, explica que, na audiência pública das normas, a autarquia recebeu opiniões favoráveis e desfavoráveis à intermediação e resolveu adotá-la apenas acima do limite de R$ 30 milhões. "Entendemos que, nesses casos, o possível custo seria justificável acima desse valor."

Nos moldes definidos pela CVM, serão viáveis apenas CRIs de varejo de empreendimentos residenciais, porque somente nesses casos será viável estruturar uma operação com tantos cedentes, prevê Assolini. Ele lembra que, atualmente, mais de 70% das ofertas de CRI têm lastro em créditos de um devedor.

Para alinhar as regras desses produtos similares, a CVM instituiu também o limite de 20% por cedente em Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC). Esse limite antes não existia e poderá ser suprimido em casos específicos, de empresas com boa oferta de informações, como companhias abertas, bancos ou empresas com demonstrações financeiras conforme a Lei nº 6.404/76 verificadas por auditoria independente. A CVM também passou a exigir ainda a divulgação de mais informações caso os fundos tenham em carteira recebíveis não performados. "A filosofia da regulação é cuidar para que o investidor saiba o risco que está correndo, que no caso do FIDC é o do cedente dos créditos." Para esses fundos, a CVM manteve o piso de aplicação mínima em R$ 300 mil.

Mas para um público específico de investidores qualificados dos FIDCs, com cotas superiores a R$ 1 milhão, a CVM abriu concessões quanto à oferta de informações, que aumentou para os demais aplicadores. Para esse público de maior porte, a autarquia criou a figura do FIDC não-padronizado. Entre os títulos considerados não-padronizados estão papéis de securitização vencidos e pendentes de pagamento, decorrentes de receitas públicas, entre outros.

O diretor da securitizadora Rio Bravo, Alexandre Rhinow, acredita que a CVM está dando mais liberdade para constituição de FIDCs desde que as carteiras sejam vendidas a grandes investidores. "Antes havia dificuldades para aprovar fundos com políticas de investimento muito abrangentes, que incluem, por exemplo, crédito consignado e recebíveis de companhias", diz Rhinow. Agora, os fundos qualificados como não-padronizados poderão comprar créditos em atraso, ou decorrentes de ações judiciais, ou de receitas da União, estados e municípios.

Mas a exigência de investimento mínimo de R$ 1 milhão é alta, acima do critério de "investidor qualificado" normalmente usado pela CVM, que é de R$ 300 mil. Por conta disso, teme-se que os FIDCs possam começar a ser lançados apenas para esses grandes investidores, no modelo não-padronizado. "A aplicação poderá vir a ter um público mais elitista", teme o advogado Alexandre Assolini, do PMK.

Com a criação dos fundos não-padronizados, será mais fácil acompanhar a evolução dos FIDCs padrão, porque estarão apresentados em categorias segregadas nas estatísticas da CVM.

Nas novas normas, estão claramente exigidas a produção de prospectos nas emissões de CRI e de FIDC, explica Aline. Essas regras são distintas das exigidas para a oferta de ações, explica ela. Portanto, foi criado também um novo anexo à Instrução nº 400 da CVM, que trata das ofertas públicas. "Assim, as regras ficaram mais flexíveis, sem colocar ônus desnecessário à indústria, mas preservando certas garantias ao investidores."

A autarquia definiu, ainda, a responsabilidade dos custodiantes para verificação do lastro dos FIDCs, que não era clara. "Isso quer dizer que ele terá de verificar se o crédito existe, ou seja, se não existem duplicatas frias, por exemplo", diz a superintendente.

Aline, da CVM, diz ainda que a entidade não descarta nova revisão em um futuro próximo das regras agora definidas. "O setor imobiliário apresenta forte crescimento e certos limites são sempre adaptáveis, conforme a evolução do mercado." Neste ano, a CVM registra, até agora, R$ 978 milhões em ofertas de CRI e R$ 10,5 bilhões em distribuições públicas de costas de FIDC, este já superior ao total verificado no ano passado. (Colaborou Tatiana Bautzer)