Título: Lula culpa Aeronáutica por todos os problemas
Autor: Romero, Cristiano e Lyra, Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 07/12/2006, Brasil, p. A4

Ainda sem saber como enfrentar a crise do setor aéreo, o Palácio do Planalto responsabiliza a Aeronáutica pela situação. Na avaliação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, os controladores de tráfego aéreo boicotam o governo e o "problema maior está na Aeronáutica", que, segundo um assessor do presidente, detém "todas as informações", os sistemas e os controles, mas não resolve o problema.

Demonstrando, segundo esse assessor, "muita irritação" com o caos instalado nos principais aeroportos do país, Lula só se deu conta da gravidade do problema na terça-feira, o pior dia desde o início da crise, deflagrada há dois meses pela tragédia do vôo 1907, da Gol. Nesse dia, o presidente convocou reunião às pressas com os ministros da Defesa, Waldir Pires, da Casa Civil, Dilma Rousseff e do Gabinete de Segurança Institucional, general Jorge Félix, além do comandante da Aeronáutica, brigadeiro Luiz Carlos Bueno, e do presidente da Agência Nacional da Aviação Civil (Anac), Milton Zuanazzi. Ontem, voltou a se reunir com o mesmo grupo.

No encontro da noite de terça, que durou duas horas, Lula cobrou explicações dos ministros e exigiu uma solução "permanente". O brigadeiro Bueno explicou que o Cindacta 1, que fica em Brasília, é o mais bem equipado do país. Disse ainda os equipamentos que entraram em pane, na terça-feira, são novos e "muito modernos", mas que, mesmo assim, deram problema. O presidente decidiu, então, autorizar a liberação de verba de emergência para a compra de novos equipamentos.

A hipótese de sabotagem nos equipamentos está descartada por enquanto. O ministro das Relações Institucionais, Tarso Genro, contou que nenhuma das informações fornecidas pelos responsáveis pelo setor aéreo apontam para sabotagem. "A nossa informação é de que houve pane", sustentou.

Lula e seus ministros mais próximos acham que a situação é "grave", mas isentam o ministro Waldir Pires de responsabilidade. O presidente gosta do ministro, considera-o um "decano" da política brasileira, o "último remanescente do período pré-64", nas palavras de um colaborador.

Lula também julga que o problema não está na atuação da Anac. "Os integrantes da agência estão muito ativos nessa crise", garantiu um assessor do Planalto. Lula também acha que a propalada eficiência da ministra Dilma Rousseff não foi posta em questão.

A irritação do presidente é com a Aeronáutica e, principalmente, com os controladores de tráfego aéreo. Na segunda-feira, durante reunião com integrantes do Instituto da Cidadania, um velho amigo, ligado ao setor de aviação civil, sugeriu a Lula que recebesse representantes dos controladores de tráfego aéreo. O presidente reagiu com irritação. Disse que os controladores estão boicotando o governo e que só os receberia se eles acabassem com o "caos aéreo".

O amigo do presidente explicou que a situação dos controladores é delicada porque 95% deles são militares. Como fazem parte da corporação, ganham baixos salários, têm sobrecarga de trabalho e, por isso, gostariam de ter a chance de uma carreira civil, um pleito antigo da categoria. Como militares, eles ficam apenas como sargentos. Além disso, por causa da hierarquia militar, não há transparência de gestão e qualquer reclamação é vista como insubordinação.

Lula alegou que seu governo é democrático, que ele sempre acolheu reivindicações, mas que não há razão para os controladores de vôo estarem estarem agindo dessa maneira - promovendo operação-padrão, responsável pelos atrasos dos vôos. Lula acha que os controladores estão mesmo sendo insubordinados e que, por isso, está disposto a "jogar duro".

Na avaliação de um interlocutor do presidente, por trás dessa crise está uma disputa antiga, uma queda de braço entre os controladores de tráfego e os oficiais militares. Os militares não querem abrir mão do controle aéreo por dois motivos: o orçamento dessa área é grande e os cargos de chefia são ocupados por oficiais, funções que eles perderiam se o tráfego aéreo civil saísse de seu comando.

Aliados do presidente criticaram a lentidão do governo para enfrentar a crise. O prefeito de Belo Horizonte, Fernando Pimentel (PT), disse que o país precisa de um gabinete de crise para administrar o problema. "Isso parece que está indo além da possibilidade de resolução do próprio ministro", afirmou o prefeito petista, defendendo uma atitude "um pouco mais drástica". (Colaborou Ivana Moreira, de Belo Horizonte)