Título: Parecer técnico do TSE contesta contas de Lula
Autor: Basile, Juliano
Fonte: Valor Econômico, 06/12/2006, Política, p. A9

A equipe técnica do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) concluiu dois pareceres em que pede a desaprovação das contas de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do Comitê Financeiro do PT. Os técnicos do TSE questionam a legalidade de R$ 10,028 milhões em doações feitas por empresas com participação acionária em concessionárias de serviço público, de mais R$ 10,19 milhões em doações não identificadas e de CPFs de doadores que não batem com informações da Receita Federal.

Apesar do parecer, o TSE decidiu manter a data de diplomação do presidente Lula. A decisão foi tomada pelos ministros do tribunal, que continuaram reunidos na noite de ontem com o ministro Marco Aurélio Mello, presidente da Corte. Eles entenderam que esse intervalo de oito dias previsto na Lei Eleitoral entre a aprovação das contas de campanha pelo tribunal e a diplomação é o prazo máximo, e não o mínimo. Os ministros devem julgar as contas no dia 12 e o presidente, diplomado no dia 14.

A data da posse, marcada para 1º de janeiro, também deverá ser mantida. O adiamento chegou a ser cogitado, quando Mello admitiu que, com a necessidade de análise mais apurada das contas de campanha, a diplomação, que estava marcada para o dia 14, poderia ser adiada. O ministro José Gerardo Grossi, relator das contas, abriu, ontem, prazo de 72 horas para Lula e o Comitê Financeiro do PT responderem à equipe técnica do TSE.

Segundo o TSE, o maior problema nas contas do Comitê Financeiro do PT está nas doações feitas por concessionárias de serviço público. A Resolução n 22.250 veda este tipo de doação, em seu artigo 13. O problema é que o PT recebeu doações de empresas que possuem participações acionárias em concessionárias.

A MBR, por exemplo, doou R$ 2,25 milhões para o Comitê do PT e é uma empresa de mineração que participa do capital da MRS Logística. Os técnicos do TSE verificaram na Internet que a MRS é concessionária de serviço público de transporte de cargas no Sudeste. Por isso, recomendaram a reprovação das contas. Fizeram o mesmo com relação à Caemi, que doou R$ 1,8 milhão, e também tem participação na MRS.

Os técnicos também contestaram as doações de R$ 1,85 milhão da CSN, sob o argumento de que a empresa é dona da Companhia Ferrroviária do Nordeste - que obteve concessão junto à Rede Ferroviária Federal - e tem participação na hidrelétrica de Igarapava. Ainda no setor siderúrgico, o TSE alegou que o IBS, instituto que congrega as siderúrgicas brasileiras, não poderia ter feito doações por ser entidade de classe. O IBS doou R$ 2,25 milhões ao Comitê e o partido alegou que se trata de uma associação de pessoas jurídicas, e não de indivíduos de classe.

A Construtora OAS, que doou R$ 1,7 milhão, entrou na lista porque tem a concessão da linha amarela, das rodovias BR 116 e BA 099. A Tractebel doou R$ 300 mil é, segundo pesquisa do TSE na Internet, é uma das empresas do grupo Suez que tem a concessão da hidrelétrica de Estreito (TO). A Carioca Christiani Nielsen Engenharia contribuiu com R$ 1 milhão e, de acordo com o TSE, atua nos consórcios de rodovias CRT (Rio-Teresópolis) e Viapar (Maringá, Londrina e Cascavel). E, por fim, a Deicmar doou apenas R$ 10 mil e entrou na lista porque é administradora do Porto Seco, de Santos.

O PT se defendeu alegando que, se a lei for interpretada de forma restritiva, essas empresas não são titulares de contratos de concessão com o governo. No caso da CSN, por exemplo, o PT informou que é uma empresa privada de capital aberto. Com relação à OAS, o PT informou que se trata de uma tradicional doadora em campanhas políticas de diversos candidatos. A Deicmar é uma empresa de capital integralmente privado, informou o partido. A Tractebel não desenvolve diretamente atividade de concessão de serviço público, enfatizou o PT.

Já com relação às doações ao candidato Lula, os técnicos do TSE usaram informações da Receita para checar o CPF de pessoas físicas que contribuíram . Eles encontraram divergências entre os CPFs apontados pela campanha de Lula e os números da Receita. O PT reconheceu que alguns números não batiam e se comprometeu a corrigi-los.

O TSE também contestou doações sem a devida identificação. O tesoureiro da campanha petista, José de Filippi Júnior, informou que as divergências apontadas pelo TSE serão sanadas numa "prestação de contas retificadora", que será entregue ao tribunal "nas próximas horas".

O presidente do TSE disse que espera que as contas de Lula não sejam rejeitadas. Segundo ele, é preciso aguardar novas informações do PT antes de julgar as contas em definitivo: "Não cabe atuar com açodamento. Vamos esperar que as contas estejam em harmonia com os ditames legais e que não sejam rejeitadas".

A expectativa é que os ministros do TSE aprovem as contas, até porque as empresas listadas como doadoras irregulares contribuíram com as campanhas de outros eleitos (ver reportagem nesta página). Se essa expectativa se confirmar, o tribunal estará mais uma vez oscilando com relação às eleições deste ano.

Desde junho passado, o TSE tem tomado decisões diferentes sobre um mesmo assunto, provocando confusão no mundo político. Em junho, o tribunal decidiu que os partidos teriam de manter nos estados as mesmas alianças nacionais. Depois de criticado pelo meio político, o TSE resolveu flexibilizar a regra da verticalização, permitindo as alianças. O TSE também proibiu aumentos salariais para o funcionalismo público a 180 dias das eleições, mas, depois, considerou legal o aumento para categorias específicas de servidores. O tribunal também anunciou que poderia vetar a candidatura de políticos suspeitos de corrupção, mas permitiu as candidaturas. (Com agências noticiosas)