Título: Sarney apela a Lula por veto a projeto
Autor: Jayme, Thiago Vitale
Fonte: Valor Econômico, 06/12/2006, Política, p. A10

O senador José Sarney (PMDB-AP) subiu ontem à tribuna para, num discurso exaltado, criticar o Senado pela aprovação, na semana passada, de um projeto com um dispositivo que extingue o princípio da "impenhorabilidade" da casa própria e do salário. Sarney fez um apelo para que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vete o dispositivo, que chamou de "aberração".

Ex-presidente da República (1985-90), afirmou que a proibição de penhora da casa própria foi instituída em seu governo. "Uma das coisas de que mais tenho orgulho é de ter aplicado no Brasil o que se chama de Homestead, quer dizer, a impenhorabilidade da casa própria. A casa própria não pode ser penhorada por dívidas. Isso já existe no Direito americano e em quase todos os países do mundo, há muitos e muitos anos, há séculos mesmo. Há mais de 100 anos nos Estados Unidos se exerce o instituto do Homestead. Instituí esse princípio quando era presidente e acrescentei que não se podia penhorar salários, bens de trabalho, aqueles das pequenas propriedades que serviam ao sustento das pessoas", disse.

O projeto original foi encaminhado ao Congresso pelo Executivo. O relator foi o senador Fernando Bezerra (PTB-RN), líder do governo no Congresso. Aprovado na terça-feira da semana passada, o projeto altera o Código Civil, mudando as regras de execução de dívidas extrajudiciais (cheques, duplicadas e promissórias) e buscando reduzir a inadimplência. Como já havia sido aprovado na Câmara, espera agora a sanção presidencial.

Pelo texto, passa a ser permitido que imóvel considerado bem de família com valor superior a mil salários mínimos (equivalente, hoje, a R$ 350 mil) seja vendido para saldar dívida. Pela proposta, após a venda do imóvel, o devedor terá direito a receber esse valor (mil salários mínimos). O restante será utilizado para quitar a dívida.

O projeto também permite que até 40% do valor que ultrapassar 20 salários mínimos (R$ 7 mil) do salário do devedor seja penhorado para saldar dívidas.

"Como que no governo do presidente Lula, um homem que faz um programa social dessa grandeza, passa um dispositivo de lei como este aqui?", perguntou Sarney da tribuna do Senado. "Foi um erro que cometemos... É uma aberração que o Senado aprovou", criticou. Afirmando estar "revoltado", o pemedebista disse estar "fazendo um apelo" e "exigindo mesmo" que Lula vete o projeto. "Cometemos uma coisa errada, e mais errado ainda estará o presidente se não vetar esses dois dispositivos."

Com o alerta de Sarney, o senador Heráclito Fortes (PFL-PI) acusou o governo de armar "arapucas" para o Congresso. Numa espécie de protesto, os senadores decidiram não votar as indicações de autoridades que estavam na pauta.