Título: INPI prevê aumento nos negócios com adesão ao Protocolo de Madri
Autor: Goulart, Josette
Fonte: Valor Econômico, 06/12/2006, Legislação & Tributos, p. E1

O engenheiro Jorge Ávila, servidor cedido pela Petrobras, assumiu interinamente a presidência do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) no lugar de Roberto Jaguaribe em novembro. Ávila, que já era o vice do diplomata e participou do projeto de reestruturação do órgão elaborado dentro do Ministério do Desenvolvimento, diz que parte dessa estratégia se deveu ao desejo do ministro Luiz Fernando Furlan em colocar o Brasil como signatário do Protocolo de Madri. Por este instrumento, as empresas podem pedir o registro de suas marcas simultaneamente em todos os países signatários. Mas a medida ainda enfrenta resistência por parte dos agentes da propriedade intelectual, que fazem a intermediação do INPI com as empresas. Nesta entrevista ao Valor, Ávila mostra que não está disposto a ceder a pressões desses agentes que questionam não só o protocolo como a própria estratégia do INPI de se tornar totalmente virtual, eliminando de vez o uso do papel em seus procedimentos.

Valor: Como foi elaborada a estratégia de reestruturação do INPI?

Jorge Ávila: Fizemos um grupo de trabalho antes de vir para cá para pensar qual seria o caminho da reestruturação que o INPI deveria seguir dentro da política nacional de comércio exterior. Duas linhas foram traçadas e as fizemos constar em todos os documentos da política industrial: ser mais eficiente e mais útil à indústria brasileira. Avançamos muito nas duas direções. No campo da eficiência o primeiro passo foi comparar o INPI com outros escritórios do mundo. Chegamos à conclusão que tínhamos muito menos gente face à demanda.

Valor: Quando vocês assumiram o INPI, o estoque de marcas era de 630 mil depósitos com uma perspectiva de seis anos...

Ávila: Levava muito mais tempo. Há duas maneiras de contar quanto tempo leva a concessão de uma marca. A maneira que sempre se usou é a de que hoje, se estou concedendo a marca que foi depositada em 2002, o prazo é de quatro anos. Só que não é bem assim, porque em 2002, quando essa marca entrou, a fila era menor, o que significa que quem entrou depois terá que esperar mais. A outra maneira de contar é pegar o tamanho da fila e dividir pela produtividade: quantos depósitos se processa por ano. Quando entramos éramos capazes de processar 50 mil marcas por ano. Dividindo 630 por 50, temos 12,5 anos. Esse era o número que apavorava todo mundo. Agora temos uma capacidade de 250 mil marcas por ano, com estoque de 450 mil depósitos na fila.

Valor: O prazo hoje é inferior a dois anos, então?

Ávila: Isso quer dizer que as marcas depositadas em janeiro serão decididas em um ano.

Valor: Há funcionários que dizem que se faz hoje um exame simplificado das marcas...

Ávila: A escolha desse nome - exame simplificado - foi muito infeliz e deu margem a especulações sobre o que foi simplificado, inclusive com manifestações de que estávamos reduzindo a segurança jurídica das marcas que estão sendo concedidas pelo instituo. É exatamente o oposto. O exame foi sim simplificado porque ele é feito todo no computador. Não Há mais manipulação de papel, o que tomava um tempo gigantesco. O processo logístico do exame foi muito simplificado e se ganhou em produtividade.

Valor: O uso de novas ferramentas tecnológicas foi o que levou à idealização do INPI sem papel, com o depósito de marcas totalmente eletrônico. Esse processo não está caminhando rápido demais?

Ávila: Não, acho que está indo numa velocidade normal.

Valor: Os agentes acham que está indo rápido demais...

Ávila: Eu acho que o país tem um pouco de pressa. Se não me engano foi o ministro Furlan que disse em uma reunião que no Brasil a gente faz todas as coisas certas, mas às vezes demora demais para fazê-las. Se temos condições de avançar porque vamos ficar marcando passo, esperando que os atores se acostumem com a novidade? Há uma lógica nessa argumentação, eu concordo, mas há coisas que são simples. O formulário de marcas eletrônico é muito mais simples de usar do que o sistema antigo.

Valor: Os agentes entraram com pedido no Ministério Público para que a Revista da Propriedade Industrial (RPI), o diário oficial do INPI, volte a ser no papel.

Ávila: Se de fato a revista vier novamente a ser feita em papel, vou cobrar integralmente do usuário esse custo, e não mais subsidiar, como antes. A gente imprimia mil exemplares e não tinha demanda. Eu ficava com aquele entulho de revistas. Isso é dinheiro jogado fora. O INPI pagou para a revista existir mas ninguém comprou porque a informação está na internet de graça.

Valor: Por que essa batalha constante entre o INPI e os agentes? O que está acontecendo?

Ávila: Há várias questões nisso. Quem lida mais diretamente com o assunto é quem sofre mais as mudanças. Então esses escritórios que se dedicam à propriedade intelectual tem uma reação maior à mudança. Mas também é fato que qualquer simplificação implica na redução dos custos de transação. Quando se faz um sistema eletrônico, há uma interface mais fácil que reduz a burocracia para determinado conjunto de procedimentos e os usuários tem menos custos. A gente não pode fantasiar o que seja custo de transação: quando as coisas são difíceis eu preciso de mais ajuda para fazer, essa ajuda tem um custo. Então, é natural que as pessoas que atuem na intermediação de qualquer processo eventualmente tenham perdas passageiras com processos mais simples.

Valor: O mesmo acontece com a forte resistência de alguns agentes ao Protocolo de Madri?

Ávila: O presidente da Associação Brasileira da Propriedade Intelectual (Gustavo Leonardos) assinou um artigo em um grande jornal em que diz que na sua visão o benefício da adesão do Brasil ao protocolo será pequeno quando comparado à perda de receita na administração de 50 mil pedidos de estrangeiros por ano. Ou seja, ali está se falando de um custo de intermediação. No Protocolo de Madri, temos a certeza de que o impacto não será esse. Há expectativa do aumento nos negócios envolvendo propriedade intelectual quando se simplifica o processo.

Valor: Dentro do grupo que fez o diagnóstico do INPI já se pensava na adesão ao Protocolo de Madri?

Ávila: O ministro Furlan, logo que entrou no ministério, mencionou a relevância de o Brasil participar do Protocolo de Madri, pela fácil inserção das marcas brasileiras no mercado internacional que o tratado traz. Hoje há poucas marcas brasileiras no exterior, e uma das razões é que isso é muito custoso. É um custo de acompanhamento, pois cada lei estabelece um prazo distinto para cada uma das etapas do processo. Então se você quer ter uma marca em 15 países, vai ter que pagar uma pessoa em cada país para acompanhar cada um dos processos que está tramitando. O protocolo é uma porta de entrada, é só um meio pelo qual o depósito é feito. Quando chegam nos "INPIs", as marcas entram na fila dos depósitos e são tratadas como todas as outras. A decisão da concessão da marca, pelo protocolo, é individual de cada país. Não existe marca mundial. Eu posso, por meio do protocolo, depositar em dez países e só em metade deles obter o registro. Na outra metade a marca pode não ser registrável porque já havia outra.

Valor: Quando o Brasil vai aderir ao Protocolo de Madri?

Ávila: Esse é um processo complexo que já está acabando no Executivo. Falta ser encaminhado formalmente pelo presidente da República ao Congresso Nacional. O INPI já está pronto a partir de julho do ano que vem. Havia um argumento sério para que Brasil protelasse a entrada no protocolo, que era a ineficiência do INPI. Nesse aspecto o problema está tecnicamente resolvido. Não quer dizer que o Brasil deva entrar a partir de julho, aí há outras considerações. Pode ser a partir de 2008 ou 2009.

Valor: O sr. tem conversado com os empresários?

Ávila: Minha percepção é a de que os empresários, efetivamente os usuários finais dos serviços do INPI, apóiam inteiramente a modernização do órgão e a simplificação de procedimentos. Há também uma manifestação clara e positiva da Fiesp e da Firjan em relação ao protocolo.

Valor: O sr. acha que uma eventual mudança de ministro muda a forma de ver o INPI?

Ávila: Não sei. Primeiro porque não sei se o ministro muda. E depois não sei qual será o ministro se mudar. De toda maneira, acredito que se constrói uma percepção generalizada da importância de ter um INPI profissionalmente gerido, um INPI forte, um INPI que possa cumprir com eficiência o seu mandato. Acho que isso não muda.