Título: O investidor vai às compras
Autor: Pavini, Angelo
Fonte: Valor Econômico, 05/12/2006, EU & Investimentos, p. D1

Nos últimos três anos, as pessoas físicas e clubes de investimento compraram R$ 4,729 bilhões em ofertas públicas de ações. Mas, apesar desse apetite enorme, a participação do varejo nas ofertas caiu este ano em relação aos anos anteriores. Segundo dados da Bolsa de Valores de São Paulo, até outubro, pessoas e clubes compraram R$ 2,139 bilhões dos R$ 27,126 bilhões de ações vendidas em ofertas públicas, o que equivale a uma participação de 7,88%. No ano passado, esse percentual era de 8,95% e, em 2004, chegou a 11,38%. Se levado em conta só o valor vendido no Brasil, sem a oferta internacional, essa fatia sobe para 8,78% neste ano, mas ainda assim abaixo dos 10,90% do ano passado e dos 16,24% de 2004. Esses números incluem as ofertas do PIBB, fundo de ações do BNDES que deu ênfase para a venda para pessoas físicas.

A queda na participação das pessoas físicas nas ofertas, por incrível que pareça, é um reflexo do sucesso dessas operações, explica José Olympio Pereira, diretor do banco de investimentos do Credit Suisse. Com a forte procura por parte dos grandes investidores, as empresas e os organizadores aumentam a oferta, mas apenas para os estrangeiros e institucionais. "Mas para as pessoas físicas, o valor é o mesmo, e aí a participação delas, que era de 10% no valor inicial, cai para 8%, 7%", explica. Em geral, as ofertas estão sendo aumentadas em 35%, que não vão para o varejo. Além disso, várias empresas como MMX, BrasilAgro e Abyara e não fizeram ofertas de varejo. E há o caso de Submarino, que desistiu das pessoas físicas no meio da oferta.

Pereira lembra que, apesar da fatia menor, a procura de pessoas físicas e clubes por ações nas ofertas é grande. Tanto que, cada vez mais, na hora de dividir os papéis reservados para o varejo, não sobra nem o mínimo prometido pelas empresas pelo sistema de "copinhos". "Em muitas ofertas, o investidor não leva nem o primeiro copinho, geralmente de R$ 5 mil", explica. Um dos casos recentes foi o da Ecodiesel que, apesar da polêmica do sócio oculto e das desistências, teria registrado quase dez mil compradores, o dobro da média dos lançamentos recentes.

Ele destaca ainda o sucesso das ofertas iniciais de ações. "Das 40 aberturas de capital que tivemos nos últimos três anos, 36, ou seja, 90% estão cotadas acima do preço da oferta", afirma. "E essa boa experiência do mercado de capitais incentiva as pessoas a comprar."

Apesar da forte procura, Pereira não vê espaço para um aumento do percentual de 10% para pessoas físicas, pelo menos no caso de aberturas de capital. "É o padrão, mesmo olhando outros países", diz. "Não temos controle do que é a visão de longo prazo do varejo e destinar uma parcela maior pode criar instabilidade dos papéis no futuro". Já em empresas conhecidas, como Petrobras e Vale do Rio Doce, que já estão no mercado, o perfil do comprador é mais de longo prazo e a parcela pode ser maior.

Apesar disso, Pereira contesta a tese de que as pessoas físicas entram nas ofertas apenas para especular e vender no lançamento - os chamados "flipers" -, motivo pelo qual as empresas e organizadores preferem vender para estrangeiros e institucionais. "Se olharmos o primeiro dia de negociação, 30%, 40% da oferta circulam no mercado, ou seja, muito mais que os 10% das pessoas físicas", lembra. Segundo ele, há institucionais e estrangeiros que não conseguem tudo que queriam na oferta e resolvem vender.

O mesmo acontece com as pessoas físicas, diz o presidente da Bovespa, Raymundo Magliano Filho. "O investidor não consegue um volume razoável e acaba vendendo logo", diz. Para ele, os investidores estão mais conscientes após a queda das ações em maio. "O investidor precisa saber que a bolsa tem momentos de alta e baixa e que é preciso ter visão de longo prazo para entrar no mercado" .

Para o ano que vem, Pereira, do Credit Suisse, espera que esse cenário continue. "Com a bolsa em alta e o sucesso das ofertas, mais investidores participarão e o número de empresas que vão abrir o capital pode superar as 25 deste ano", diz.

Na Itaú Corretora, o valor médio de oferta por investidor nos lançamentos está em R$ 20 mil, diz Roberto Nishikawa, diretor geral da corretora. "E a participação tem aumentado, apesar de os grandes investidores, como de private bank, não estarem entrando pesado por causa do rateio muito grande, que reduz o lote final", explica. A média de rateio na corretora está em 26%, ou seja, de cada R$ 100 pedidos, o investidor acaba ficando com R$ 26. "Mas isso é uma média geral, se o investidor pede menos, R$ 5 mil, a chance é de ele levar quase tudo."

Nishikawa diz que o investidor em ofertas em geral não tem muita informação e vende os papéis mais rapidamente. E muitos acompanham de perto os setores para ver qual está tendo maior sucesso após a oferta. "Se o papel subiu muito na estréia, quando vem outra do mesmo setor as pessoas entram com mais interesse, independente de análises", diz Nishikawa. É o caso, por exemplo, da construção civil. "Recomendamos que as pessoas olhem o prospecto, conheçam a empresa, pois comprar para vender logo no primeiro dia é especulação, o papel pode tanto não subir quanto subir mais alguns meses depois."