Título: Congresso republicano tem o seu 'canto do cisne'
Autor: Balthazar, Ricardo
Fonte: Valor Econômico, 04/12/2006, Internacional, p. A11

O Congresso dos EUA volta a se reunir hoje após duas semanas de recesso e sob forte pressão do setor empresarial para aprovar um pacote na área comercial que inclui benefícios para o Brasil e outros países da América Latina.

É possível que o pacote inclua a renovação do Sistema Geral de Preferências (SGP), um programa que permite a entrada de produtos do Brasil e de outros países em desenvolvimento no mercado americano sem o pagamento de tarifas. O SGP expira no fim do ano e só pode ser renovado com aval do Congresso.

Mas a falta de consenso entre as lideranças políticas tornou o ambiente no Congresso tão confuso nos últimos dias que é possível até que nenhuma das medidas em discussão seja aprovada, o que adiaria tudo para o próximo ano e criaria problemas para empresas que dependem de programas como o SGP para fazer negócios nos EUA.

Esta será a última semana de trabalho do Congresso neste ano e a última em que a agenda legislativa estará sob controle dos republicanos e do presidente George Bush. Vitoriosa nas eleições legislativas de novembro, a oposição liderada pelos democratas passa a dar as cartas em janeiro.

Há diversos interesses comerciais em jogo, mas a rivalidade entre os dois partidos tornou a situação ainda mais complicada. "Estão todos medindo forças e lutando para garantir as posições que vão ocupar com a posse do novo Congresso", disse ao Valor o vice-presidente de assuntos internacionais da Câmara de Comércio dos EUA, John Murphy.

Na sexta-feira, as principais associações empresariais do país enviaram aos líderes dos dois partidos uma carta pedindo a renovação do SGP e a aprovação de outras cinco iniciativas. A carta diz que as medidas são necessárias para manter a indústria americana competitiva e promover relações amistosas com os países em desenvolvimento.

Grandes corporações como Boeing, Coca-Cola, General Electric, Nestlé e a rede de supermercados Wal-Mart assinam a carta. Muitas empresas americanas usam programas como o SGP para obter insumos e matérias-primas a preços mais baixos que os praticados por fornecedores estabelecidos em países que não recebem os mesmos benefícios.

Além do SGP, as associações empresariais pedem a renovação de preferências para Bolívia, Colômbia, Equador e Peru, a extensão de benefícios para a África e o Haiti, e a aprovação de uma lei necessária para remover obstáculos existentes na relação entre os EUA e o Vietnã, que acaba de entrar na Organização Mundial do Comércio.

Apesar da simpatia que esses programas encontram no meio empresarial, há forte oposição em alguns setores. A indústria têxtil, que conseguiu bloquear a votação dessas medidas recentemente, teme que as preferências para a África, o Haiti e o Vietnã provoquem uma nova onda de importações de mercadorias baratas e abalem ainda mais as empresas americanas do setor.

Outras complicações têm raízes políticas. Líderes republicanos querem excluir o Brasil e a Índia da renovação do SGP, ou pelo menos reduzir os benefícios que eles recebem com o programa, como retaliação pelas posições que os dois países assumiram nas negociações da Rodada Doha de liberalização do comércio mundial, contrárias aos interesses americanos.

Da mesma forma, Bolívia e Equador correm o risco de perder suas preferências por terem se distanciado dos EUA nos últimos meses, enquanto o Peru e a Colômbia preferiram aprofundar sua ligação com o mercado americano assinando tratados comerciais mais abrangentes. Os dois acordos precisam ser aprovados pelo Congresso e devem ser analisados no ano que vem.

O caso do Brasil é delicado. Se o SGP não for renovado nesta semana, será preciso esperar meses até que o Congresso volte a se debruçar sobre a questão. Os democratas são a favor da manutenção do programa sem alterações, o que é bom para o Brasil, mas a demora na renovação causará prejuízos para os exportadores beneficiados pelo SGP.