Título: Xerox quer ampliar atuação no Brasil
Autor: Magalhães, Heloisa
Fonte: Valor Econômico, 01/12/2006, Empresas, p. B3

Visitas a subsidiárias tornaram-se rotina para a principal executiva da Xerox Corporation, Anne Mulcahy. Mas, desta vez, ela veio ao Brasil com uma novidade: a de estimular a estratégia da multinacional americana de prospectar oportunidades para compra de empresas. A busca será por criadoras brasileiras de software ou de serviços que agreguem valor às atividades e ao foco da Xerox no processamento e gerenciamento de documentos.

Ela chegou ao Brasil no início da noite de segunda-feira no avião fretado pela companhia, que utiliza usualmente. Jantou com o comitê executivo da subsidiária brasileira, o que agradou a Anne em especial, pois quatro mulheres ocupam cargos de direção na empresa e compõem o comitê formado por dez executivos. No dia seguinte, antes das 8h, já estava conversando com outro grupo de funcionários da companhia.

Antes da viagem de volta, à frente de seus executivos, reuniu-se com parceiros de negócios e grandes clientes como Embratel, Bradesco Seguros, Telemar, Interprint, BMK, entre outros. Entre um compromisso e outro, a executiva contou um pouco do seu dia-a-dia ao Valor e como liderou o processo de recuperação da Xerox. Ela assumiu o comando, em 2001, na fase delicada em que a rainha das copiadoras havia perdido a força de seu reinado e corria risco de falência.

"Viajo para ouvir. Quero ter retorno dos clientes, dos empregados, de como estamos indo. Aqui, estou procurando saber o que o Olivier (Ferraton, presidente da Xerox Brasil) pode fazer melhor. Viemos também conversar sobre o futuro, apresentar para onde a companhia está indo. A Xerox é a relação com os clientes", afirma.

Para ela, países como o Brasil, com pouca disponibilidade de recursos para investir em pesquisa e desenvolvimento devem ser focados na inovação: "Aqui existe criatividade para diferenciar produtos não apenas baseados no preço baixo, mas focados em competências próprias, inovação, como software e serviços". Mas frisa: "É preciso atenção especial ao sistema educacional voltado para formação de pessoas para criar um ambiente de negócios".

A Xerox do Brasil, que já andou de namoricos avaliando a compra de empresas que prestam serviços para a área financeira, não vai apenas partir para aquisições. Em janeiro, abre espaço na sede no Rio como incubadora em parceria com universidades. Estão sendo pinçadas cinco a dez criadoras e integradoras de software com potencial alinhado à estratégia de negócios da companhia que passam a utilizar a infra-estrutura e logística na sede da subsidiária, no Rio.

A executiva aproveitou para antecipar ao Valor que Olivier Ferraton, vai ficar mais tempo no Brasil. O contrato do executivo francês que já comandou a Xerox na Nova Zelândia e no Leste Europeu, inicialmente de dois anos, estaria terminando. Mas, a pedido dele, vai ser renovado por mais dois anos.

A Xerox já tem ido às compras nos Estados Unidos. Em outubro anunciou o fechamento do processo de aquisição da prestadora de serviços de pesquisa e gestão de informações legais e regulatórias Amici. A Xerox pagou pela companhia US$ 175 milhões. A companhia também fechou a compra da VMPie, de software voltado para fluxo de documentos, por US$ 54 milhões.

"Nossas aquisições são de empresas que nos ajudem a crescer na prestação de serviços. Sejam elas de software, soluções ou processos para produção e gerenciamento de documentos, hoje uma das áreas-chaves da companhia."

Anne diz que a tecnologia da Xerox não é mais apenas de cópias ou de impressão: "Temos que ajudar nossos clientes a reduzir o uso de papel porque estão digitalizando seus negócios. Eles vivem mais em um mundo eletrônico do que em um mundo de papel físico, por isso precisam de scanners, produção de imagens, gerenciamento de conteúdo", receita.

Não é de hoje que Anne identificou que visitas a subsidiárias são fundamentais. Assim que foi indicada para presidir a Xerox, ela entrou em um avião e começou a percorrer os escritórios espalhados pelo mundo. Era agosto de 2001, quando, além do risco de falência e pesadas dívidas, a empresa estava sob investigação da Securities and Exchange Commission (SEC), órgão regulador do mercado financeiro nos EUA, por suspeita de irregularidades na subsidiária do México.

Ela administrava o delicado dia-a-dia, mas não se furtou de passar três meses viajando: "Você quer agir rapidamente porque está em dificuldades, mas antes é importante entender o que realmente está se passando. E só se entende depois de conversar com todos os clientes e empregados. Isso ajudou a encontrar os verdadeiros problemas para resolver."

A estratégia de recuperação foi sendo desenhada pouco a pouco. Ela ia definindo três prioridades de cada vez e fixava outras só à medida que as já delineadas iam sendo atendidas. Negociou com 58 bancos ao mesmo tempo na fase mais sensível e 54 aceitaram renovar os créditos da companhia, que acumulava dívidas superiores a US$ 17 bilhões. Na cadeia de relacionamento, procurou desenvolver também o que considera fundamental: clima de confiança com os funcionários e os acionistas.

"É fundamental fazer as pessoas entenderem o que deve ser feito. Mas o coração delas precisa acreditar que a direção escolhida está no rumo adequado. Precisam se envolver, seguir junto", afirma a executiva.

O modelo deu tão certo que, em agosto de 2002, ela passou a acumular a função de presidente do conselho da companhia.

Neste último terceiro trimestre, a Xerox, já em nova fase, comemorou lucro de US$ 0,54 por ação, comparado aos US$ 0,05 em igual período de 2005. O fluxo de caixa operacional ficou em US$ 530 milhões e a receita total em US$ 3,8 bilhões. Em 2005, fechou o ano com receita de US$ 17,5 bilhões.

"Quero tornar a Xerox uma grande empresa. Temos ainda muito a fazer. Uma companhia é mais do que grandes resultados. É responsabilidade social, grandes valores, que sejamos orgulhosos de compartilhar", diz.

Anne afirma que não pode ser identificada como uma "salvadora de empresas". A executiva diz que vem recuperando a Xerox porque conhece muito bem o negócio e não tem o perfil de executivos que entram numa empresa só focados na recuperação. "Minha prioridade são meus filhos (dois rapazes de 19 e 21 anos), mas a Xerox é a minha vida", afirma.

Ela diz que, no jantar com a diretoria da empresa no Brasil, conversou muito com as mulheres sobre dupla jornada, o delicado equilíbrio entre família e atividade profissional: "Acho que mais mulheres deveriam ver que isso é possível", afirmou.

Anne iniciou em 1976 sua trajetória na empresa que tem seu nome vinculado a cópia: afinal, quem não fala "xerocar"? Ela começou na área de vendas, onde atuou por 14 anos. Graduada em jornalismo e literatura, passou pelo comando da área de recursos humanos a presidente da divisão de desktop. Foi depois diretora-superintendente antes de chegar ao topo.