Título: Contratos ainda dividem cadeia citrícola
Autor: Basile, Juliano e Lopes, Fernando
Fonte: Valor Econômico, 01/12/2006, Agronegócios, p. B11

Anunciado no início de agosto, após três meses de negociações mediadas pelo senador Aloizio Mercadante (PT-SP), o acordo entre citricultores e indústrias de suco de laranja em torno de um reajuste emergencial dos contratos de fornecimento da fruta para a produção da bebida ainda é motivo de divergências e provoca celeuma.

Produtores, sobretudo aqueles reunidos na Associação Brasileira de Citricultores (Associtrus), reclamam que nem todas as grandes indústrias estão aplicando o reajuste acertado - até hoje não assinado -, e representantes destas dizem que a correção dos contratos de longo prazo para um piso de US$ 4 por caixa de 40,8 quilos está, sim, sendo feita.

No meio do caminho, as autoridades antitruste do governo afirmam que não se opõem ao pagamento da diferença, e que não precisam avalizar o acordo, como querem as empresas para se defender de futuras brigas judiciais.

O objetivo das negociações foi compensar os produtores pela disparada das cotações do suco de laranja no mercado internacional, em virtude da queda da oferta de laranja na Flórida depois de danos provocados por furacões em 2004 e 2005. Em maio de 2004, a tonelada do suco no exterior saía por US$ 800; hoje se aproxima de US$ 3 mil, de acordo com analistas.

Agora, segundo produtores, nem todos os contratos estão sendo reajustados sob alegação de que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) proibiu acordos coletivos no segmento. A Associação Brasileira dos Exportadores de Cítricos (Abecitrus) nega, e informa que os acordos estão sendo reajustados, mas segundo estratégias individuais de cada empresa - no caso Cutrale, Citrosuco, Citrovita e Dreyfus. "Durante as negociações, pedimos a presença da SDE [Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça] para evitar problemas com um eventual contrato padrão, proibido no passado. O acordo está sendo cumprido pelas empresas", diz Ademerval Garcia, presidente da Abecitrus.

Analistas ouvidos pelo Valor confirmam parte das duas versões: segundo eles, as correções têm sido feitas caso a caso, mas de fato em muitos casos as conversas ainda não refletiram em mais dinheiro no bolso do citricultor.

No que depender das autoridades antitruste, a situação já poderia ter sido resolvida. Até porque, conforme ofício lido pela presidente do Cade, Elizabeth Farina, na última sessão do órgão, o acordo para ressarcimento dos citricultores foi mesmo monitorado pela Secretaria de Direito Econômico (SDE) do Ministério da Justiça.

"Enviamos um representante da SDE quando os produtores discutiram o adicional por caixa de laranja para certificar que era uma negociação individual de cada produtor com algumas indústrias", explicou o secretário Daniel Goldberg. "Não houve uma negociação com todas as indústrias sentadas na mesma mesa, mas a discussão do caso de cada produtor, em separado", completou Goldberg, enfatizando que a SDE não viu problemas. Vale lembrar que, das grandes indústrias, atualmente só a Cutrale faz parte da Abecitrus, e que só a Cutrale esteve em todas as reuniões com os citricultores.

Segundo produtores, as indústrias de suco estão alegando que não podem cumprir o acordo para ressarci-los por causa do veto ao Cade à proposta de elas pagarem R$ 100 milhões para encerrar o processo em que são acusadas de cartel. "São coisas completamente distintas", advertiu o conselheiro Paulo Furquim. "As indústrias podem até deixar de ressarcir os citricultores, mas não podem dizer que o fazem por causa do Cade. Se o fizerem estarão usando levianamente o nome do Cade", disse Furquim. A Abecitrus nega que esse argumento tenha sido usado.