Título: Países terão livre comércio de carros
Autor: Landim, Raquel e Olmos, Marli
Fonte: Valor Econômico, 30/11/2006, Brasil, p. A4

O governo brasileiro conseguiu dobrar as resistências do México e garantir o livre comércio de carros de passeio entre os dois países a partir de 1º de janeiro. O resultado das negociações, que terminaram ontem na Cidade do México, contrariou as expectativas, que apontavam para o adiamento do início do mercado livre e a manutenção das cotas de importação com tarifa zero.

Em contrapartida, o Brasil aceitou alongar o prazo para a liberalização do comércio de caminhões, que estava previsto originalmente para 2011. Para autopeças, os dois países concordaram em ampliar a lista de produtos beneficiados com isenção de impostos. Fontes envolvidas na negociação informaram ao Valor que o acordo será assinado hoje pelos dois governos.

O entendimento foi fechado às vésperas da posse do novo presidente do México, Felipe Calderón, que ocorre amanhã. Segundo fontes que participaram das negociações, o acerto foi negociado e selado pelo governo do presidente Vicente Fox, mas os negociadores mexicanos tinham o respaldo de Calderón.

As discussões, que duraram dois dias, foram bastante duras. Os representantes da Associação Nacional de Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) seguiram de perto as negociações. Desde o início, o México informou que não aceitaria o livre comércio de carros. O acordo original entre os dois países, que entrou em vigor em 2003, previa cota de importação com tarifa zero, que aumentava de 130 mil para 210 mil veículos, com livre comércio em 2007.

O governo mexicano argumentava que apenas o Brasil estava se beneficiando do acordo. As exportações brasileiras no setor automotivo para o México aumentaram de US$ 1,3 bilhão em 2002 para US$ 2,38 bilhões no ano passado. Já as importações vindas do México patinaram em torno de US$ 150 milhões no período. Em 2006, o México deve amargar um déficit de US$ 1,3 bilhão com o Brasil no setor.

Segundo um negociador presente à reunião, a delegação brasileira demonstrou aos mexicanos que o Brasil está exportando apenas veículos compactos, que o México não produz. Os carros chegam a preços competitivos, o que ajuda a segurar a inflação. "Não se trata de substituição de produção local", diz a fonte.

A indústria automotiva mexicana se especializou em modelos de grande porte voltados para o mercado dos Estados Unidos e acabou atendendo mais esse cliente do que seu próprio mercado. O México exporta com tarifa zero para os EUA graças ao Acordo de Livre Comércio da América do Norte (Nafta).

A delegação brasileira também argumentou que as exportações de veículos mexicanos para o Brasil estão aumentando. De janeiro a setembro deste ano, o Brasil importou US$ 314 milhões do México no setor automotivo, um alta de 120%, devido ao lançamento no país de modelos mexicanos como Fusion, Jetta, Accord e Sentra.

Na mesa de negociação, os brasileiros disseram que as exportações de veículos de alto valor agregado do México para o Brasil podem chegar a 45 mil unidades em 2008. Também pesou a necessidade cada vez mais forte do México de diversificar o destino de suas exportações, que hoje são altamente dependentes dos EUA. "É um bom acordo para os dois países", diz a fonte.

A maior resistência dos mexicanos estava no setor de caminhões e veículos pesados. Nesse caso, o Brasil concordou em alongar o prazo para livre comércio. Só a partir de 2009 os dois países vão sentar na mesa de negociação e discutir cotas que possibilitem uma abertura gradual do mercado.

Para autopeças, o acordo original também previa o livre comércio em 2011. A data não foi mantida. Os dois países concordaram em aumentar a lista de produtos que não pagarão imposto de importação a partir de 2007. Essa lista incluirá praticamente todo o universo tarifário, mas permitirá ao México manter algumas exceções que o país considera importantes. Procurada pelo Valor, a embaixada do México não quis se pronunciar.