Título: Governo dará apoio à venda de laptop que inclua Linux
Autor: Borges, André
Fonte: Valor Econômico, 27/11/2006, Empresas, p. B2

Depois de lançar o "Computador Para Todos", projeto que oferece financiamentos a juros baixos para fabricantes de PCs que produzam micros de mesa com valor de até R$ 1,4 mil, usando obrigatoriamente sistema operacional Linux, o governo federal começa a trabalhar no lançamento de um "Laptop Para Todos". Ou para alguns.

Diferentemente de seu projeto original, que tem como alvo a população que ainda não possui um PC em casa, o laptop popular será destinado, principalmente, a pessoas que já têm computador, mas que agora buscam recursos com mobilidade.

A iniciativa, conforme apurou o Valor, seguirá exatamente o modelo já praticado no projeto para os computadores de mesa, isto é, a definição de uma configuração básica de hardware como ponto de partida, e a exclusividade de utilização do sistema operacional Linux, o software livre, rival do Windows, da Microsoft. No pacote, também estão inclusos outros 27 softwares de apoio, como aplicativos para edição de texto, planilhas eletrônicas e apresentação digital.

A proposta do laptop popular será apresentada para os 53 fabricantes de PCs que hoje têm autorização do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) para fabricar o Computador Para Todos. A configuração mínima do equipamento apresentada aos fabricantes inclui itens como memória de 256 MB, disco rígido de 40 GB, processador de 1.4 Ghz e tela de 15 polegadas, além de placa de acesso à internet sem fio e peso abaixo de 3,5 quilos. O valor máximo estabelecido para o produto será de R$ 2 mil, mas a expectativa do governo é que este preço venha a cair para algo em torno de R$ 1,7 mil.

Para garantir o dinheiro barato aos fabricantes das máquinas, serão oferecidas linhas de financiamento, as quais vêm sendo estudadas junto do BNDES, Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil. A meta de alguns membros do governo é fazer com que os primeiros laptops populares cheguem às prateleiras do varejo já no início de 2007.

Com o seu notebook popular, o governo federal quer repetir o desempenho que vem registrando com o Computador Para Todos. De acordo com dados da assessoria da Presidência da República, o programa será responsável pela venda de quase 1 milhão de máquinas neste ano, o equivalente a cerca de 15% de todo o mercado de PCs do país.

O anúncio do projeto para as máquinas portáteis com exigência do sistema operacional Linux soa como resposta para uma pesquisa divulgada na última semana pela Associação Brasileira de Software (Abes). O estudo, elaborado pela empresa de pesquisas Ipsos Public Affairs, apontou que 73% das pessoas que compraram uma máquina do Computador Para Todos trocaram o sistema operacional Linux pelo software proprietário Windows. O problema é que, dos que pagaram pela troca, todos declararam ter gasto menos que o preço médio do sistema da Microsoft; e quase metade (47%) informou não ter desembolsado sequer um centavo.

Para o assessor especial da Presidência da República, Cezar Álvares, um dos principais coordenadores do Computador Para Todos, insinuar que o projeto do governo incentivou a pirataria "é um completo absurdo".

"É preciso lembrar que, antes da nossa iniciativa, todos esses PCs eram comprados no mercado cinza, mas hoje eles são adquiridos no mercado formal", afirma Álvares, destacando a crescente queda no volume de pirataria de hardware.

Quanto ao evidente uso de sistemas piratas, o assessor chama a atenção para o fato de que "seria muita ilusão" imaginar que aqueles que até então compravam um computador no mercado informal, iriam depois adquirir licenças originais de software proprietário, cuja soma dos programas poderia se aproximar ou até mesmo ultrapassar o preço pago pelo computador.

"Ainda temos muito caminho pela frente, mas se 27% daqueles que compraram uma máquina mantiveram o Linux, como aponta essa pesquisa, já temos uma vitória também no que se refere ao software", diz.

Segundo Álvares, seria interessante verificar também qual é o percentual de pessoas que compraram PCs com o sistema Starter Edition (versão limitada do Windows) e depois o trocaram por cópias ilegais do software completo. "Fica aqui um belo desafio para a Ipsos medir. Seria interessante ter essa informação."

A Abes, que tem entre os seus associados a Microsoft, participou da criação do Computador Para Todos. Desde o início do projeto, a entidade tentou convencer o governo a dar a opção de incluir sistemas proprietários no programa, mas esta possibilidade ficou restrita ao benefícios da Lei do Bem, que hoje dá isenção de Pis e Cofins (quase 10% do preço) para computadores que usem qualquer sistema, mas que custem até R$ 2,5 mil. "Qualquer um pode ter acesso aos incentivos fiscais, ninguém ficou fora disso", defende Sergio Rosa, diretor do Serpro e um dos coordenadores do programa setorial de ciência e tecnologia do governo. "Acontece que, para financiamento pelo governo, só pode ser com software livre, porque é ele que cria condições de concorrência e não gera custo com royalties."

A expectativa do diretor do Serpro é de que pelo menos 1 milhão de PCs do Computador Para Todos sejam vendidos no ano que vem. Neste momento, adianta Rosa, o governo começa a trabalhar, inclusive, numa segunda fase do projeto. O objetivo é atualizar a configuração das máquinas - que hoje incluem unidade de disquete, por exemplo, e deixarão de tê-la - ampliando as funcionalidades e, se possível, até reduzir seu custo. Um assunto, porém, nem se discute. Na arena do software, só continuarão trafegando os códigos do pingüim.