Título: Lula encontra 16 governadores e diz que quer diálogo com todos os partidos
Autor: Ulhôa, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 24/11/2006, Política, p. A6

Em encontro com 16 governadores - eleitos e reeleitos - da base aliada, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez um discurso de unidade, rejeitando a divisão entre governos de oposição e situação, e manifestou a intenção de dialogar com todos os partidos, inclusive o PSDB, e com "gente do PFL" - legenda que faz oposição mais dura e tem rejeitado aproximação. Os governadores, que na véspera falavam em apresentar agenda de reivindicações dos alinhados do Planalto, mudaram de estratégia. Foi uma reunião política, com ênfase para a necessidade de união para aprovação das reformas estruturais.

"Só não vai conversar quem não quiser conversar. Quem for civilizado e quiser fazer política civilizada terá espaço para uma boa conversa. Quem não quiser, nós temos que respeitar o direito de silêncio dos outros", disse Lula, em entrevista, ao chegar ao hotel de Brasília no qual era esperado.

No discurso aos aliados, o presidente disse que discutirá a montagem da equipe com a qual governará no segundo mandato depois de definida a "política de coalizão" que poderá ser adotada, a partir da negociação com os partidos.

"Vou conversar com todo mundo por quê? Porque eu acho que no segundo mandato nós temos que provar que é possível governar o Brasil diferente do que habitualmente o Brasil tem sido governado. Nós não podemos mais ficar disputando se eu vou apoiar o Wellington (Dias, governador do Piauí) porque ele vai me dar uma vaga em tal lugar, ou porque vai me dar um cargo. Eu estou disposto a construir um projeto de desenvolvimento para este país com começo, meio e fim, em que todos nós tenhamos responsabilidade de fazer a nossa parte", disse.

O presidente afirmou que, para ele, a disputa político-ideológica terminou com a apuração da eleição e agora não há mais governo de oposição ou de situação. Disse esperar que, na próxima reunião, estejam os representantes dos 27 Estados: "Se alguém quiser fazer oposição a mim, faça na eleição de 2010, quando eu não serei candidato. E, se eu tiver que fazer oposição a algum governador, eu também deixo para fazer em 2010".

Numa espécie de desabafo sobre as dificuldades que está enfrentando para montar sua nova equipe, Lula deu um "conselho" aos eleitos, de primeiro mandato. "Montar um governo é 50% do sucesso do governo. Convidar alguém para ocupar um cargo é muito fácil, agora, tirar alguém é muito difícil. Então, eu quero dizer para vocês o seguinte: nessa hora, não tem relação de amigo. Nessa hora, é relação de chefe de Estado. A gente tem que convidar as pessoas mais qualificadas para a função que o Estado brasileiro precisa... Eu quero dizer para vocês: ao invés de procurar apenas um amigo, procurem aquele que está esperando uma chance", disse.

Repetindo o que tem dito em conversas recentes, o presidente ressaltou a necessidade de "destravar o país" e explicou o significado: mudar leis, ter uma relação mais qualificada com o Congresso Nacional, com o Tribunal de Contas da União, conversar mais com o Ministério Público e com os ambientalistas - todos citados por ele como responsáveis, em alguns casos, por impedir obras e medidas. Falou também da necessidade de "destravar a economia", dando condições de investimento a Estados, municípios e União.

Os governadores deram uma manifestação pública de compromisso com a governabilidade e de apoio ao diálogo com a oposição. Eles desistiram de apresentar uma agenda com reivindicações, porque se convenceram do risco de estimularem divisão entre governistas e oposicionistas. "O movimento de hoje é político, para reforçar a posição do presidente da República e buscar uma união maior, um ambiente melhor na política brasileira para abrir espaço para se discutir com firmeza e com profundidade as reformas estruturais", afirmou Paulo Hartung (PMDB), governador reeleito do Espírito Santo, designado um dos porta-vozes do grupo.

Segundo ele, o momento é de "construção política", de ajudar o presidente a compor uma base de sustentação no Congresso ampla e qualificada, que permita a discussão e aprovação de medidas essenciais ao crescimento da economia e desenvolvimento do país.

"Nós queremos, por um lado, ajudar a montar uma base sólida, que dê uma governabilidade com qualidade e, por outro lado, ajudar a distensionar a política brasileira na relação governo e oposição. No sentido de criar um ambiente adequado para que se possa retomar a agenda de reformas estruturantes do país, necessária para que o país possa ter crescimento sustentável ao longo dos próximos anos", disse o pemedebista.

"No governo anterior, quando oposição e governo mantinham a corda esticada, nós vimos o resultado: passos tímidos na direção de reformas estruturantes, extremamente necessárias ao futuro do país", completou Hartung.

"Não era hora de criar uma pauta de reivindicação dos aliados. Nossa intenção não é dividir. Nossa intenção é elevar o nível da discussão", afirmou o governador reeleito do Amazonas, Eduardo Braga (PMDB). "Temos que estabelecer pontos que podem gerar um acordão", disse. Segundo ele, não é possível, por exemplo, fazer reformas previdenciária e tributária sem fazer uma reforma do Estado.

Nas três horas de conversa, em reunião antes do almoço com o presidente, os governadores eleitos do PT, como Jaques Wagner (PT), da Bahia, e Marcelo Déda (SE), de Sergipe, que defendiam a apresentação a Lula de uma agenda de interesses dos Estados - que incluiria o nível de endividamento dos entes federativos - foram convencidos pelos mais moderados a abandonar a idéia.

"Primeiro, é preciso ver que tamanho é esse governo de coalizão para depois saber qual será a reforma possível. Não podemos inverter a seqüência da pauta, senão repetiremos erros do passado", disse Braga, explicando por quê a reunião de ontem não produziu um documento com uma agenda de propostas.

Na reunião, afinaram o discurso. Todos saíram falando em "distensionamento" das relações entre governo e oposição. Estavam presentes 16 governadores eleitos ou reeleitos do PT, PMDB, PDT, PSB e MD (PI, RN, SE, BA, MA, CE, AC, AP, RO, PA, MS, MT, TO, AM, ES e RJ) e dois vice (PR e PE). Dois dos presentes apoiaram o candidato do PSDB a presidente, Geraldo Alckmin: Ivo Cassol (MD-RO) e André Puccinelli (PMDB-MS). "Todos souberam da nossa posição no primeiro e no segundo turnos da eleição. Aqui se trata de uma reunião de homens e mulheres que se pautam a olhar para a frente, para o futuro", disse Puccinelli. (Colaborou Paulo de Tarso Lyra).