Título: Telefônica estréia em TV via satélite sem autorização do ministério
Autor: Moreira, Talita e Rittner, Daniel
Fonte: Valor Econômico, 24/11/2006, Empresas, p. B2

A Telefônica estreou ontem no mercado de TV via satélite em parceria com a DTHi Interactive, apesar de o Ministério das Comunicações ter advertido a operadora de que isso não poderia ser feito.

A Você TV, como o serviço foi batizado, começou a ser oferecida na região de Ribeirão Preto, no interior paulista com a oferta de até 56 canais.

O argumento da Telefônica é de que o acordo com a DTHi é estritamente comercial, não prevê a transferência de exploração do serviço de satélite (DTH) nem do controle acionário da empresa - por isso, não dependeria de análise prévia da Anatel, e sim do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Segundo comunicado da operadora, todos os aspectos da parceria "seguem rigorosamente a legislação e a regulamentação vigentes e precedentes".

A nota foi divulgada pela operadora no final da tarde, pouco antes de a Telefônica anunciar a saída de Fernando Xaiver Ferreira da presidência do grupo espanhol no Brasil. Segundo fontes próximas à companhia, a saída do executivo estaria relacionada à perda de capacidade de interlocução da empresa em Brasília.

O lançamento do serviço de TV criou mal-estar entre a Telefônica e o ministro das Comunicações, Hélio Costa.

O ministério viu o lançamento como uma tentativa da empresa de criar um "fato consumado" para escapar da regulamentação que está sendo preparada para o setor. A operadora lançou os serviços mesmo após Costa ter advertido,

na terça-feira, que novas autorizações para atuar em satélite estariam suspensas até a edição de uma portaria criando essas normas e que a operadora deveria esperar para implementar essa parceria com a DTHi (razão social da Astralsat). Por isso, a iniciativa da Telefônica foi mal vista pelos auxiliares próximos do ministro.

Esses assessores disseram ainda não ter definido os próximos passos de atuação do ministério, caso a companhia leve adiante os seus planos, confrontando a orientação do governo. Segundo os auxiliares, não há posição nem contra nem a favor da Telefônica, mas o ministério tem o dever de criar regras para um novo serviço contemplando três fatores: o interesse das empresas nacionais e a defesa dos consumidores.

Um ponto levantado é de que mais de 80% do conteúdo na programação de canais fechados da TV a cabo é estrangeiro - preocupação já manifestada pelo ministro em outubro, durante a abertura de um congresso do setor em Florianópolis. Dessa forma, a prioridade do governo seria impedir que uma eventual entrada de multinacionais na televisão por satélite significasse desnacionalização do conteúdo. "O capital estrangeiro pode ser parceiro, mas antes é preciso olhar o conteúdo", afirmou um auxiliar.

Nos próximos dias, será criado um grupo de trabalho com prazo de 60 dias para definir as regras do setor, mas a expectativa do ministério é de que os trabalhos fiquem prontos em menos tempo.

"A DTHi, que possui licença para a prestação de televisão via satélite e já atua no setor, com clientes em todo o País, continua sendo inteiramente responsável pela prestação do serviço de DTH. À Telefônica cabe ofertar este serviço, como complemento ao amplo portfólio de serviços disponíveis aos seus clientes", afirmou o comunicado divulgado pela operadora. Procurada pelo Valor , a Telefônica não quis dar entrevistas.

A polêmica já se anunciava no início desta semana. Na terça-feira, a operadora publicou comunicado em jornais dizendo que não seria necessária a anuência prévia da Anatel para estabelecer a parceria com a DTHi porque se tratava de um acordo comercial.

Mas, no mesmo dia, num seminário em São Paulo, o conselheiro da agência Pedro Ziller disse que a avaliação do órgão regulador necessária mesmo em parcerias comerciais e deveria ser feita à luz da resolução que trata do controle acionário das teles. Paralelamente, em Brasília, o ministério anunciou a suspensão da concessão de novas licenças.

Ontem, entretanto, a assessoria de imprensa da Anatel disse que, em parcerias comerciais não haveria a necessidade da anuência prévia do órgão regulador - contrariando o que Ziller afirmara dois dias antes.

Com a DTHi, a intenção da Telefônica é acelerar seu ingresso no mercado de TV e, assim, passar a oferecer a seus assinantes pacotes três em um: voz, dados e vídeos.

A operadora já havia se lançado em duas outras iniciativas para atuar no segmento. Uma delas é um pedido de licença de DTH feito à Anatel em maio, para o qual ainda aguarda resposta. Outra é a compra dos ativos de MMDS (microondas) e de 49% das operações de TV a cabo da TVA, do grupo Abril, por cerca de R$ 1 bilhão.

O grupo de origem espanhola tem o projeto de explorar serviços de televisão via satélite nos países em que atua na América Latina e já colocou sua programação no ar em alguns deles.