Título: Mercado aposta em corte de 0,5 ponto percentual nos juros Selic
Autor: Lucchesi, Cristiane Perini
Fonte: Valor Econômico, 24/11/2006, Finanças, p. C2

Se as previsões da maior parte do mercado financeiro se confirmarem, o Comitê de Política Monetária (Copom) vai cortar os juros básicos Selic em 0,50 ponto percentual, para 13,25% ao ano, na reunião dos dias 28 e 29. Desse modo, o presidente Lula terminaria seu primeiro mandato com juros básicos 11,75 pontos menores do que os 25% ao ano de janeiro de 2003, quando assumiu.

Mas, os juros que realmente importam para a economia, as taxas reais - projetadas para um ano no mercado futuro descontada a inflação projetada para o IPCA - caíram apenas 5 pontos percentuais até agora, de 13,5% ao ano quando Lula assumiu para 8,5% hoje. Nossos juros reais ainda estão entre os maiores do mundo, perdendo a primeira posição, no momento, só para a Turquia. A queda de 0,50 ponto na Selic não deve alterar isso.

Para 2007, as apostas da maior parte do mercado são de um corte de mais 1,25%, no mínimo, para 12% ao ano, nas taxas básicas Selic. Considerando-se as oito reuniões do Copom do ano que vem e um ritmo de 0,25 ponto percentual por reunião, previsto pela maior parte dos analistas, haveria mudanças na Selic em cinco reuniões e estabilidade em três. Há quem aposte nos 10% para o final de 2007. Em qualquer caso, as taxas projetadas no mercado futuro para janeiro de 2008, de cerca de 13% ao ano, embutem um prêmio considerável. Se os economistas estiveram certos, vale a pena assumir posições prefixadas nos juros em reais.

"Há uma zona de conforto grande para a política monetária", considera Octavio de Barros, diretor do Bradesco. Ele lembra que, com a queda nos preços do petróleo e com o reajuste dos transportes de São Paulo já neste ano, há espaço para uma revisão para baixo nas expectativas dos preços administrados para 2007. O Banco Central fala em alta de 5,7% e o Bradesco prevê aumento de 4% nesses preços. Também a pressão dos alimentos nos índices de preços parece temporária, avalia o economista.

Segundo ele, o grande debate nesta próxima reunião do Copom será em torno do crescimento da demanda, que tem sido mais forte do que o aumento na produção industrial. "A decisão do Copom não deverá ser unânime", concorda Solange Srour, economista-chefe da Mellon Global Investments. Para ela, a grande dúvida é se essa demanda extra vem consumindo apenas importações ou também estoques. "Será que esse descompasso vai durar e por quanto tempo?", indaga ela.

Por enquanto, os economistas não vêem sinais de inflação de demanda, embora estejam prevendo uma elevação da taxa do IPCA, de 3% neste ano para 4,1% no final de 2007, ficando abaixo da meta de 4,5% ao ano para o ano que vem, portanto. Zeina Latif, economista-chefe do ABN AMRO, lembra que às vésperas da última reunião do Copom, em meados de outubro, o mercado projetava para o ano que vem uma inflação maior pelo IPCA, de 4,30%. "Isso apesar de os índices de atacado terem sofrido pressão dos preços agrícolas", comenta.

Ela lembra que a desaceleração na economia mundial prevista para 2007 deve conter altas nos preços não apenas desses produtos, mas de todas as commodities de uma forma geral. Ninguém aposta em quedas bruscas, o que poderia prejudicar as exportações brasileiras.

Nem mesmo a substituição de diretores do Banco Central poderia causar apreensão, avalia a economista. "Hoje, temos uma política de metas de inflação consolidada e o BC tem credibilidade e autonomia na execução da política monetária", diz a economista. "Isso não depende mais de um nome ou outro", acredita.

Zeina Latif acredita que o câmbio deverá se manter comportado no ano que vem, o que ajuda o Banco Central em sua tarefa de segurar a inflação. Luiz Fernando Romano, diretor da Brascan Gestão de Ativos, calcula que o mercado de câmbio deverá ter entrada líquida de US$ 15 bilhões a US$ 20 bilhões em 2007. "Se o Banco Central não comprar, poderemos ter uma apreciação do real", diz.

O ritmo de expansão da base monetária preocupa, diz John Welch, estrategista da Lehman Brothers, para justificar sua aposta no corte de 0,25 ponto percentual da Selic. Segundo ele, o aumento de 25% em 12 meses não se justifica apenas pela intervenção do BC comprando dólares e injetando reais na economia. "Os economistas não olham mais para isso, mas, para mim, a base monetária sempre antecipa tendências", diz. Romano considera normal uma maior liquidez na economia neste época do ano, com o pagamento do 13 salário, inclusive para aposentados e pensionistas. Mas não vê razões para preocupação.

Para Welch, se o governo cortar a Selic 0,25 ponto percentual agora, poderá manter os cortes por mais tempo em 2007, com impactos positivos na curva de juros. "Com maior cautela, não há risco de termos aumentos de taxas em 2007", avalia Welch. No seu cenário internacional, a Lehman vê um crescimento mais forte na economia dos Estados Unidos - 2,5% - e no mundo - de 4% a 5% - em 2007 e acredita em alta nos juros americanos pelo Fed, o banco central americano. Com a economia internacional mais forte, a pressão de alta nos preços dos commodities seria maior também.

Para Solange Srour, o grande risco vem da seara fiscal. "O mercado não vai aceitar juros menores se acontecer uma deterioração nas contas públicas", afirma. Para ela, apenas cortes de impostos não serão suficientes para fazer a produção crescer de forma a reduzir a relação entre a dívida líquida do setor público e o Produto Interno Bruto. "Precisamos de corte de gastos também", diz. "O pacote fiscal é insuficiente", concorda Welch.

Na outra ponta, Paulo Tenani, chefe de pesquisa para mercados emergentes do UBS Wealth Management, defende cortes de 0,5% ao ano nas próximas reuniões, para chegar em 10% ao ano no final de 2007. "Isso não afetaria em nada a inflação ou o câmbio", argumenta.