Título: Projetos de apelo popular confrontam governo e oposição no Congresso
Autor: Jayme, Thiago Vitale e Ulhôa, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 20/11/2006, Política, p. A5

O governo vai enfrentar votações indigestas nesta semana na Câmara e no Senado. O desgaste será imposto pela oposição. A base governista será convocada a votar contra medidas de apelo popular, defendidas principalmente pelo PFL nas duas casas. Na Câmara, o desafio será a votação dos destaques da medida provisória que reajusta os salários dos aposentados com rendimentos superiores a um salário mínimo. A oposição insiste em votar um destaque que eleva o índice oferecido pelo governo (5,01%) para 16%.

O governo tentou votar o tema nas últimas semanas, mas o receio de uma derrota o fez obstruir a votação e retardá-la um pouco mais. "Essa semana é a semana de ir para as cabeças. Cada deputado vai assumir a sua responsabilidade que tem com o país e votar o aumento possível, que é o de 5,01%", promete o líder do PT, Henrique Fontana (RS).

No Senado, o governo tentará evitar a aprovação de um projeto de lei do senador Efraim Morais (PFL-PB) que propõe a criação de um benefício natalino para as famílias participantes do Programa Bolsa Família - uma espécie de 13º salário. O projeto tramita em regime de urgência e no dia 8, a tentativa da oposição de votá-lo provocou bate-boca entre líderes governistas e senadores do PFL, que trataram com ironia a oposição do governo.

"O Bolsa Família foi a grande arma do PT. O presidente da República, só na Bahia, lançou 1,5 milhão, e eu quero beneficiar essas famílias. Elas têm o direito ao abono natalino. Isso é uma crueldade (o governo ser contra)", afirmou o senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA). "Não sei se há alguém contra o auxílio natalino para os beneficiários do Bolsa Família. Trata-se de uma matéria que pode ser votada até por unanimidade", disse o autor.

Para o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), o projeto é uma "maluquice" e não poderia ter origem no Legislativo, por criar despesa. "O projeto gera despesa permanente para o Executivo, sem previsão orçamentária. Um projeto desse não pode ser iniciativa de parlamentar. Só pode ser proposto pelo Executivo", disse Jucá.

O presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), quer aproveitar a semana - a primeira de uma seqüência de um mês sem qualquer feriado ou empecilho para votações em plenário - para destrancar a pauta. O esforço começa na terça-feira, quando o governo promete finalmente colocar para votar os destaques da MP dos aposentados.

O líder do PT avisa que será feito um chamado especial para a base do governo estar presente e votar. Lembrado que houve o mesmo esforço nas últimas semanas sem sucesso, Fontana chegou a brincar. "Precisa ser um chamado com mais vigor, então. Precisamos aprovar isso logo até pelas questões burocráticas, para podermos manter esse aumento para 2007", diz Fontana.

No Senado, o governo continua enfrentando dificuldades para aprovar na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) o projeto de lei que cria a Receita Federal do Brasil, também conhecida como Super-Receita, que substitui uma MP editada pelo governo em julho de 2005, que perdeu a validade em novembro daquele ano por não ter sido votada a tempo. O tema deve voltar a ser discutido na reunião da CAE de amanhã.

O projeto, que une as máquinas de arrecadação e fiscalização da Receita Federal e da Previdência Social, encontra muita resistência principalmente da parte do funcionalismo. "Ainda há muito ponto de atrito e a discussão é muito técnica. Vamos conversar com o relator, Rodolpho Tourinho (PFL-BA) nesta semana e com a Receita Federal", afirmou Jucá. Segundo ele, seria muito importante para o governo aprovar o projeto esse ano, para começar o próximo exercício com a nova estrutura.

O líder do governo também prevê dificuldades no plenário, na terça-feira, para evitar que os senadores aprovem o projeto que institui o 13º do Bolsa Família, já que a oposição é forte na casa. "Esse projeto vai gerar mais polêmica política. Mesmo aprovado no Senado, vai para a Câmara e lá não vão fazer essa maluquice", afirmou Jucá.

Efraim Morais diz que seu projeto tem o objetivo de "sanar uma falha" do Programa Bolsa Família. Instituído em 2003, o programa beneficia famílias com renda mensal per capita de até R$ 60 e aquelas com renda mensal per capita de R$ 60,01 a R$ 120. "Esse instrumento de transferência de renda tem-se demonstrado incompleto e essa lacuna aparece de forma mais evidente no mês de dezembro - época em que os gastos domiciliares aumentam", diz o autor da proposta de conceder benefício natalino.

Segundo ele, esse investimento do governo "será recompensado pela maximização dos efeitos econômicos e sociais". Ele cita estudos que mostram o efeito multiplicador desses benefícios no conjunto da economia e pesquisas mostrando que, nos 96 municípios participantes do programa, "o dinheiro do benefício incrementa o comércio local e retorna, em parte, para os cofres públicos".

A complicação em votar as nove MPs que trancam a pauta não termina aí. O item cinco da pauta é a MP dos Portos Secos. O texto altera as atuais regras do setor. O ponto mais polêmico é aquele que retira a necessidade de licitação para a abertura desses portos. O projeto é muito polêmico. O governo tenta votá-lo há dois anos e não consegue.

Terminada a seqüência de MPs, a Câmara tentará votar a Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas, o projeto que cria o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) e o segundo turno da PEC do Voto Secreto.