Título: Companhias montam conselhos estrelados
Autor: Mandl, Carolina e Moreira, Talita
Fonte: Valor Econômico, 20/11/2006, Empresas, p. B3

Antonio Kandir, Fernando Mitri e Ana Novaes têm trajetórias profissionais totalmente distintas. O primeiro seguiu o caminho da política; o segundo destacou-se como um importante executivo; Ana passou anos em busca de rentabilidade para carteiras de fundos de investimentos.

Mesmo assim, periodicamente eles se reúnem para discutir um assunto que pouco tem a ver, de forma direta, com a experiência de cada um: a Datasul.

Os três formam o time de conselheiros independentes da fabricante de software e, mais do que isso, estampam o perfil desse tipo de profissional nas companhias que estão chegando à bolsa.

De forma geral, os cem conselheiros independentes das empresas do Novo Mercado encaixam-se em três grandes categorias.

Numa delas estão figuras nacionalmente conhecidas, que já transitaram nos altos escalões do universo político e econômico. Kandir, ministro do Planejamento no governo FHC, encaixa-se nesse caso. O economista Maílson da Nóbrega, ex-ministro da Fazenda e conselheiro de três empresas do Novo Mercado - Abyara, CSU Cardsystem e Grendene -, também.

Em outro grupo, estão empresários ou executivos de outras companhias que não são concorrentes diretos. É o caso de Mitri, que já presidiu a IBM, passou por outras empresas de tecnologia da informação (TI) e hoje compartilha seu conhecimento no conselho da Datasul. Pedro Luiz Passos, um dos fundadores da Natura, divide com a Totvs algumas das experiências que teve na fabricante de cosméticos.

Militantes da governança corporativa e profissionais do mercado de capitais formam o terceiro grupo. O presidente do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), José Guimarães Monforte, é conselheiro independente da Natura. Também estão incluídos aí nomes como o do jurista Modesto Carvalhosa (EDP) e do ex-presidente da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) José Luiz Osório (Grendene).

"Buscamos ter uma complementaridade razoável no nosso conselho", afirma o vice-presidente administrativo e financeiro da Totvs, José Rogério Luiz. Segundo ele, "cada um dos conselheiros tem sua reputação formada fora da empresa, o que torna remotas as chances de ser influenciados pelos executivos".

Figura fácil em conselhos de administração - faz parte de mais cinco, além dos três no Novo Mercado -, o ex-ministro Maílson da Nóbrega acredita ser bastante procurado pelas empresas para contribuir com sua visão macroeconômica. "Todos os conselhos têm reservado um tempo das reuniões para debates sobre política, economia e os riscos do país. Isso está se tornando comum no Brasil nos últimos anos", avalia.

Currículos com experiência internacional têm sido bastante requisitados pelas companhias brasileiras. Ex-embaixador em Washington e Londres, o consultor Rubens Barbosa costuma dar opiniões sobre política e comércio exterior no conselho da CSU Cardsystem. "Isso ajuda a abrir os olhos da administração para elementos e fatores que ela poderia não incorporar de outra forma", diz.

Diplomatas também são procurados pelas empresas que buscam oportunidades fora do Brasil. "Tento dar às companhias um contexto sobre o processo de internacionalização dos negócios", afirma Marcílio Marques Moreira, ex-embaixador e ministro da Fazenda.

Essas figuras públicas não apenas cedem seu conhecimento. Fazer parte de um conselho de administração também traz recompensas que vão além da remuneração. "É uma oportunidade de ter contato com vários setores da economia. Isso ajuda no meu trabalho como consultor", explica Alcides Tápias, ex-ministro do Desenvolvimento e conselheiro de sete companhias, como Medial e Sadia.

Porém, alguns especialistas avaliam que ter um conselho recheado de nomes estrelados já não basta para agradar o investidor. "Falta entender que o conselho é um grupo que toma decisões, não é uma reunião de formidáveis", diz Sandra Guerra, consultora na área de governança.

Algumas companhias já começam a buscar uma maior diversidade de perfil de conselheiros. A Lojas Renner chamou para seu grupo a consultora de moda Gloria Kalil, que pode não ser especialista em dados econômicos, mas traz contribuições para o varejo de roupas.

A Diagnósticos da América, que faz exames de saúde, convidou Jorge Raimundo Filho, ex-presidente de uma indústria farmacêutica no Brasil. Augusto Cruz, que por anos esteve à frente da rede de supermercados Pão de Açúcar não tem intimidade com o comércio eletrônico, mas dá suas contribuições sobre o varejo no Submarino.