Título: Fim da estabilidade abre nova fase na Volks
Autor: Olmos, Marli
Fonte: Valor Econômico, 20/11/2006, Empresas, p. B7

Um dos mais inusitados e polêmicos acordos trabalhistas da história da indústria chega ao fim. A partir de amanhã, os funcionários da Volkswagen em São Bernardo do Campo (SP), maior fábrica de carros da América Latina, perderão a estabilidade no emprego, proteção que durou cinco anos.

Nenhuma outra empresa parece hoje disposta a repetir a experiência, vivida também pela Ford. O principal protagonista do acordo, Luiz Marinho, sindicalista à época da negociação com a multinacional alemã e hoje ministro do Trabalho, diz que a estabilidade foi a solução acertada para aquele momento.

Embora a empresa nunca tenha admitido, Marinho acredita que a iniciativa conseguiu alterar uma rota de decisões que levariam ao fim da produção de veículos no ABC. "Mas não é um remédio para todos os males", diz.

Mas se o ministro acredita que a estabilidade valeu a pena, porque preservou empregos e mudou o rumo da história da companhia no Brasil ao incluir hoje projetos de novos carros no ABC, dentro da Volks o fim do acordo é recebido em tom de comemoração não explícito. Sem as amarras da estabilidade, a Volks pretende suprimir cerca de 25% dos 12 mil empregos no ABC ao longo de dois anos, algo entre 3,1 e 3,6 mil vagas.

Fontes da empresa, que só deve se pronunciar na quarta-feira, um dia após concluído o período de mais de 1,8 mil dias do acordo, garantem que a proteção contra demissão resultou na acomodação de muita gente na fábrica. Marinho diz, no entanto, que um acordo desse tipo permite à empresa "trabalhar anos a fio sem conflitos". "Isso interfere até no índice de acidentes no trabalho", diz.

É verdade que um clima de calmaria ocupou o lugar de históricas tensões no caso da Ford, a estabilidade que também durou cinco anos e terminou em março. E também na fábrica da Volks em Taubaté (SP), onde os operários acabaram recebendo o benefício por conta do acerto no ABC.

Mas a situação não foi igual no famoso e enorme conjunto de prédios erguido há cinco décadas às margens da Via Anchieta. Ali o conflito trabalhista vem persistindo há anos. Nos últimos cinco anos a Volks trocou o comando da filial brasileira três vezes. Os estrangeiros escalados para contornar a situação tiveram que lidar com episódios como uma greve de dois meses ao final de 2005, um impasse sobre a participação nos lucros e resultados.

Na Volks, além do sentimento de responsabilidade por conquistas trabalhistas históricas persiste um também antigo embate entre a Articulação, tendência do PT e CUT, no comando do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, e a oposição, ligada ao PSTU, com foco de atuação mais concentrado na Volks.

Mas a estabilidade no emprego não é privilégio dos funcionários brasileiros. A Volks já a pratica na própria matriz. Mas, segundo a empresa, na Alemanha a estabilidade foi condicionada a níveis de produção e de produtividade. Quesitos que não estão sendo alcançados. Há planos para cortar 20 mil postos na Alemanha.

Foi baseado no conhecimento dos benefícios para os trabalhadores alemães que Marinho, negociador nato, foi para a Alemanha em 2001. "Fui pedir que eles respeitassem o trabalhador brasileiro da mesma forma como respeitam o alemão", afirma.

Apesar do marco de encerramento amanhã, o fim da estabilidade não provocará alvoroço. Graças a um acordo que começou a ser elaborado há cinco meses, a empresa conseguirá uma transição tranqüila. A saída do pessoal será estimulada com remunerações extras e será feita até 2008.

No Sindicato dos Metalúrgicos do ABC o clima ficou calmo depois que a entidade conseguiu aprovação para as demissões numa tensa assembléia em que a maioria disse sim, mas boa parte disse não.

A empresa promete um balanço das adesões ao programa de demissões voluntárias na quarta. Aqueles que aderirem ao plano até amanhã receberão gratificação de 1,4 salário por ano de trabalho. A segunda fase do plano vai oferecer um salário por ano de trabalho. Para essa fase, as inscrições estarão abertas até 31 de janeiro.

A meta, nessa etapa, é eliminar 1,3 mil empregos. Se o objetivo não for alcançado, a Volks abrirá novo programa em fevereiro, com remuneração extra de 0,6 salário para cada ano trabalhado. Se ainda assim a meta não for atingida, a empresa escolherá quem vai demitir, mantendo o adicional de 0,6 salário.

Os programa de incentivo busca voluntários. Mas está atrelado a áreas que precisam ser enxugadas. O empregados não pode aderir se a sua função não estiver na lista. Não será difícil perceber quem a empresa escolherá caso o programa de incentivos não dê resultado. Há dois meses, a Volks emitiu cartas de demissão para 1,8 empregados, canceladas posteriormente.