Título: Produtividade da indústria nordestina cresce o dobro do país
Autor: Maia, Samantha e Salgado, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 17/11/2006, Brasil, p. A3

A produtividade na indústria do Nordeste cresceu bastante acima da média nacional neste ano. Até setembro, as indústrias daquela região conseguiram elevar sua eficiência produtiva em 5,2% em relação ao mesmo período do ano passado, enquanto na média nacional o ganho de produtividade foi bem mais modesto: 2,7%. Para economistas que estudam a região, o ganho reflete investimentos em fábricas mais modernas, com máquinas que demandam menos mão-de-obra.

No conjunto do país, o ganho de produtividade trouxe um perfil diferente daquele que marcou os anos de 2004 e 2005, quando a indústria aumentou simultaneamente o volume produzido e o total de horas pagas ou o número de pessoas empregadas. Em 2006, todo o ganho de produtividade foi obtido sem contratação de pessoal, segundo dados obtidos pelo cruzamento das pesquisas industriais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). No Nordeste, a indústria produziu 3,6% mais até setembro (em relação a 2005) e fez isso com um volume 1,6% menor de horas pagas.

Para o diretor-executivo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Edgard Pereira, o ganho de produtividade experimentado esse ano pela indústria brasileira decorre de um modelo de ajuste "bastante perverso" e acende uma luz amarela sobre o setor. Ele argumenta que reduzir horas trabalhadas e contratação é o último recurso utilizado pelas empresas. Em primeiro lugar, elas tentam reduzir custos em outras áreas, como transporte, logística, matérias-primas. "O pessoal é o último custo a ser afetado, pois a despesa para demitir é muito alta e existe sempre a possibilidade de a demanda reagir", explica Pereira. E aí, em caso de recontratação, os custos serão maiores ainda.

O crescimento da produção física da indústria nordestina (3,7%) foi superior à média nacional, de 2,7% até setembro. Na análise restrita à indústria de transformação, o desempenho nordestino é ainda melhor: 4,2%, contra 2,4% do Brasil. No emprego a situação se inverte. Na média, o emprego industrial cedeu 0,32% no país, e no Nordeste o recuo foi de 1,51% até setembro, segundo dados do IBGE. Esse resultado seria ainda pior se não fosse a indústria extrativa, que contratou 6,8% mais neste ano.

O Ceará foi o Estado que teve maior aumento de produtividade na região, de 11,6%. O professor do Departamento de economia da Universidade Federal de Pernambuco, Jocildo Fernandes Bezerra, diz que essa alta pode refletir o crescimento da demanda causado pela elevação da renda e da concessão de crédito. "O período de nove meses é curto para indicar um aumento do investimento, é mais provável que a produção tenha crescido com a utilização da capacidade instalada."

Segundo ele, nos últimos 20 anos o Estado sofreu uma mudança de estrutura produtiva, antes baseada em produtos de origem extrativa. Esse processo também explica a força de setores como o têxtil, que apresentou de janeiro a setembro deste ano um aumento de 15% na produção.

"Têxtil e calçados são setores fortes e os primeiros que se recuperam quando há um aumento da renda, da mesma forma que são os primeiros que caem quando há uma queda de renda", observa. Ele explica, contudo, que renda não significa transferências, como as do Bolsa Família, mas representa um maior número de pessoas inseridas no setor produtivo.

O economista Francisco de Alcântara Macedo, diretor do Instituto de Desenvolvimento Industrial do Ceará (Indi), explica que, além da demanda, o crescimento da produção gerado pela abertura de novas empresas, principalmente nos setores de calçados e têxtil, ajudou nos ganhos de eficiência na região. "Tivemos no segundo semestre uma melhora na produção de todo o Nordeste, mas o Ceará tem uma política de atração de indústrias, o que tem elevado os índices de produção."

Como não há aumento de emprego nem de horas trabalhadas, ele acredita que a produção cresce com o investimento em mecanização. "O que é bom, significa que a indústria do Ceará está conseguindo operar acima das concorrentes, já que tem produzido mais com menos pessoal." Ele explica que em muitos setores o aumento da produção agora reflete investimentos feitos há cerca de dois anos.

O economista Francisco Rosário, da Escola Superior de Administração, Marketing e Comunicação de Alagoas (Esamc-AL) também destaca a indústria extrativa e a de bens não e semiduráveis como as que puxam a produtividade no Nordeste. Segundo dados do IBGE, a produção da indústria têxtil cresceu 7,95%, de janeiro a setembro deste ano; bebidas e alimentos, 3%; calçados e artigos de couros, 3,11%, e minerais não-metálicos, 8,57%. "A indústria extrativa, que é muito forte na região, tem ganhado com a exportação, enquanto a produção dos não-duráveis tem sido puxada pela demanda interna."

Segundo ele, muitas empresas do setor alimentício têm se instalado na região para aproveitar o incremento do consumo, mas esse aumento de demanda não se sustenta no longo prazo por ser impulsionado por programas de transferência de renda, principalmente do Bolsa Família, e pelo crédito. "Não é tão simples a conta de que o aumento de demanda ocasionado pelos programas sociais trará crescimento do emprego lá na frente, porque os empregos que surgirem serão de mão-de-obra qualificada, e se o nível de educação no Nordeste continuar baixo, o trabalhador será importado de outras regiões", diz.