Título: No Brasil, economista reprovaria excesso de gasto público
Autor: Andrade, Cyro
Fonte: Valor Econômico, 17/11/2006, Especial, p. A14

Muito mais do que um questionador das idéias de Keynes e do que um matemático brilhantes, Milton Friedman foi um pensador e filosofou sobre muitas questões importantes de seu tempo. Essa é a visão que economistas brasileiros ouvidos pelo Valor têm do economista.

Dentre as contribuições mais lembradas estão o debate sobre consumo, ancorado no estudo da renda disponível, a defesa veemente do câmbio flexível e o fato de ter relativizado a importância do lado fiscal da economia. "Morre um dos maiores economistas do século, uma mente extremamente lúcida e um grande debatedor", diz o deputado federal e ex-ministro Delfim Netto.

Uma das grandes lições de Friedman, na avaliação de Delfim, é ter ensinado que é preciso se ter compromisso com a realidade. Isso quer dizer que os modelos matemáticos usados pelos economistas têm que produzir consequências testáveis.

A força do pensamento dele não vinha da matemática, mas sim da sua forte intuição para as questões econômicas, acredita a economista Eliana Cardoso, admiradora do trabalho de Friedman. "Se alguém merece o título de economista brilhante, esse alguém é ele", afirma. Eliana diz que Friedman usava, sim, modelos matemáticos para explicar e sustentar suas teorias, mas "não da forma mais obsessiva como alguns economistas usam nos dias de hoje". Luiz Gonzaga Belluzzo, economista muito mais simpático às idéias de Keynes, das quais Friedman foi crítico, compartilha dessa avaliação.

Para ele, o economista americano é um dos últimos sobreviventes da teoria quantitativa da moeda, que pregava o controle monetário. "Os economistas ortodoxos de hoje não dão mais tanta importância a essa questão. A política econômica está fundada no manejo das taxas de juros de longo prazo e nas expectativas dos formadores de preços", analisa o professor.

Mesmo sendo monetarista e preocupado com a estabilidade da economia e com a inflação, o americano não deixou de lado questões como educação, crescimento e desemprego. Eliana lembra que ele defendeu a distribuição de tíquetes para estudantes pobres como forma de permitir acesso às melhores escolas privadas.

Ernesto Lozardo, professor de economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV), aposta que Friedman reprovaria a situação atual dos gastos públicos do Brasil. "Ele pregaria um corte nos gastos fiscais para equilibrar o orçamento e fazer do governo uma máquina eficiente", diz. Lozardo explica que para o economista os gastos desmedidos de um governo podem jogar muita moeda na economia e gerar, assim, inflação. "Daí a preocupação em controlar a circulação de dinheiro".

Os economistas concordam que, mesmo tendo desenvolvido suas teorias mais importantes ao longo das décadas de 50 e 60, batendo de frente com as idéias keynesianas, Friedman é e ainda será por muito tempo atual. Se questionado a respeito da recente valorização do real em relação ao dólar, ele seria completamente contra qualquer intervenção do governo, seja a compra de moeda ou medidas para reduzir a entrada de moeda estrangeira.

Eliana explica que para ele o câmbio flexível é uma forma de se ter autoridade sobre a política monetária, já que em caso de choques externos é mais fácil o câmbio se ajustar do que todos os preços da economia.