Título: Movimentos sociais definem agenda
Autor: Felício, César e Junqueira, Caio
Fonte: Valor Econômico, 16/11/2006, Política, p. A6

Os movimentos sociais não esperarão o início do segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para pressionar o governo federal por mudanças. Dezembro foi o mês escolhido pelas entidades para reforçar as ações em todo o país. A agenda de mobilização prevê nove reuniões, mobilizações e atos públicos até o fim do ano, para reforçar o pedido de reestruturação da política econômica, aumento do salário mínimo e maior participação popular no governo.

A expectativa dos movimentos sociais é de conquistar mais espaço de interlocução e pressionar o governo a uma guinada à esquerda. O primeiro grande evento organizado pelas entidades será a marcha do salário mínimo e reajuste da tabela do imposto de renda, convocada pelas centrais sindicais para o dia 6 de dezembro.

Ontem, os movimentos sociais passaram o dia reunidos em Brasília, na Assembléia Popular "Mutirão pelo Brasil que queremos" e hoje divulgarão a pauta de reivindicações das entidades para os próximos quatro anos. Foi a terceira reunião nacional dos grupos sociais em uma semana e deve estabelecer uma agenda mínima seguindo as diretrizes da carta divulgada no sábado, na 5ª Plenária Nacional da Coordenação dos Movimentos Sociais.

A reforma política é um dos itens destacados na pauta e as entidades pregam a fidelidade partidária e o sistema de listas para a escolha dos candidatos. "Queremos uma reforma política democrática, que respeite a pluralidade partidária banindo a restritiva e autoritária cláusula de barreira".

A cobrança por alterações na política econômica é a mesma feita no primeiro mandato do governo petista. "Não daremos trégua à política econômica conservadora", pregam as entidades. "Só com uma nova política econômica superaremos as amarras que nos impedem de ver efetivada a reforma agrária, a reforma urbana, a ampliação das políticas sociais com mais investimento em saúde e educação públicas", defendem. "Rejeitamos qualquer proposta de manutenção da atual política econômica. É preciso romper com a ortodoxia do Banco Central, expulsando de lá a direita tucana que à frente do BC pratica a política de juros altos, arrocho fiscal e superávit".

A política externa é um dos campos melhor avaliados pela base popular do governo. "Os movimentos sociais da América Latina apoiaram o governo Lula. O país nunca teve um presidente tão respeitado internacionalmente pelas entidades como tem agora", analisou o dirigente da CUT, João Felício, responsável pela secretaria de Relações Internacionais da central sindical. Entre os pedidos que serão levados ao presidente Lula, está o reforço da integração latino-americana, "sem desrespeitar a soberania dos povos, como ocorreu recentemente no acordo feito através da Petrobras com a Bolívia".

As entidades miram também na mídia e pretendem pressionar o governo para mudar as regras de concessão de canais de rádio e televisão, para "acabar com o criminoso monopólio". Na pauta, está o pedido de "financiamento público para as entidades do movimento social, além da criação de canais públicos na televisão aberta".

Entre as diretrizes, estão também campanhas para pedir a anulação do leilão da Companhia Vale do Rio Doce, um "processo criminoso e ilegal".

Nas eleições, o apoio dos movimentos sociais à campanha de Lula veio apenas no segundo turno, com a condição de mais espaço junto ao governo. "Não queremos cargos nem secretarias. Manteremos nossa autonomia, mas temos a nossa agenda", afirmou Felício. As entidades prometem fazer uma forte pressão no segundo mandato. "Vamos ter uma postura bem diferente. Vamos cobrar e participar do governo. Estamos conscientes de que o governo é de coalizão e de que os interesses do governo não são os mesmos dos movimentos sociais", apontou Dirceu Fumagalli, da coordenação nacional da Comissão Pastoral da Terra. "Ou nós pressionamos ou colocamos em risco o nosso próprio projeto de nação. Teremos dificuldade de dar continuidade", disse Fumagalli.