Título: Mais proteção na previdência
Autor: Fariello, Danilo e Monteiro, Luciana
Fonte: Valor Econômico, 10/11/2006, EU & Investimentos, p. D1

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) colocou ontem em audiência pública a minuta que regula a segregação de recursos aplicados nos planos de previdência do patrimônio da seguradora na fase de acumulação. Essa medida tem levado o nome de blindagem da previdência. Atualmente, o participante do Plano Gerador de Benefícios Livres (PGBL) uo do Vida Gerador de Benefícios Livres (VGBL) corre um risco pouco conhecido. Se a seguradora tiver problemas financeiros, o dinheiro investido por ele estará ameaçado. É esse risco que será evitado com a blindagem, prevista na MP do Bem, convertida na lei 11.196/05, e agora será regulamentada pela CVM. O prazo para o envio de sugestões termina no dia 8.

Pelo conteúdo esboçado no documento, do ponto-de-vista do aplicador, a CVM aproxima o funcionamento dos planos de previdência ao dos fundos de investimento comuns, regulados pela Instrução 409 da CVM. Se o edital vir a valer integralmente, as seguradoras criarão produtos diferenciados dentro dessas normas.

Como há diferenças burocráticas fundamentais entre os modelos, para aderir aos fundos blindados, os participantes terão de informar a decisão às seguradoras e assinar um termo de migração. A CVM, que discutiu as regras com a Superintendência de Seguros Privados (Susep), procurou fazer com que a transição seja a mais simples possível para os participantes, diz João Marcelo Máximo dos Santos, responsável por Vida e Previdência da Susep. A superintendência ainda deverá soltar regras complementares às normas da CVM, mas apenas abordando questões técnicas que não mudam a essência.

Pela Lei 11.196/05, os participantes da previdência poderão migrar para os modelos blindados sem gerar evento tributário, ou seja, será possível mudar para os novos planos e preservar as condições da carteira anterior. A questão é importante principalmente para quem investe em PGBL ou VGBL pelo modelo de tributação regressiva, que leva em conta a data do aporte para o cálculo da alíquota. Na transferência, não será permitido às seguradoras cobrar taxa de carregamento ou taxa de saída.

No modelo atual, os recursos aplicados pelos participantes são creditados às seguradoras. As companhias então investem o dinheiro em um fundo de investimento no seu nome, explica Thyrso Pizzoferrato, responsável pela Mercer Investment Consulting no Brasil. Isso quer dizer que, se a companhia seguradora tiver problemas, as reservas dos planos de previdência não estarão totalmente protegidas, diz. Ou seja, em caso de falência, o dinheiro dos participantes entraria na massa falida da seguradora e o pagamento provavelmente iria para o fim da fila, depois de despesas trabalhistas e fiscais da empresa, entre outras. Hoje, o Fundo de Aposentadoria Programada Individual (Fapi, em desuso) é o único modelo de previdência que tem recursos separados do patrimônio da seguradora.

A importância da segregação dos ativos dos participantes daqueles da seguradora parece pequena hoje, mas tenderá a ser mais visível no futuro. "Com a queda dos juros, as seguradoras terão de aplicar em ativos de maior risco para pagar os benefícios aos participantes", diz o advogado especializado em Direto Previdenciário Pierre Moreau, do escritório Moreau Advogados. "A previdência é para o longo prazo, como 30 anos, e, ao assumir mais riscos, a possibilidade de que a instituição tenha problemas financeiros aumenta."

A novidade anima as companhias de menor porte, porque, no futuro, não será mais tão relevante ao participante analisar o risco de a seguradora quebrar ao investir, diz Silas Kasahaya, gerente comercial de Vida e Previdência Porto Seguro, para quem o mercado deve ficar mais competitivo. "Agora, efetivamente, mostramos para os clientes que há proteção real e que é indiferente, em termos de risco de instituição, em qual seguradora eles aplicam."

Pizzoferrato, da Mercer, avalia que, operacionalmente, a migração entre modelos pelas seguradoras e participantes não deve ser problemática. É recente ainda na memória do setor a crise advinda das mudanças tributárias no ano passado que, apesar de apenas apresentarem nova opção, retraíram os participantes. Mas essas novidades são mais simples e trazem mais credibilidade ao sistema, à medida que se separam as figuras de seguradora, administrador e gestor, diz Pizzoferrato. Pela nova regra, as seguradoras terão de contratar administradores fiduciários registrados pela CVM para controlar o recursos.

A vigência do benefício com a blindagem, porém, tem seu limite, já que a nova norma valerá apenas no período de acumulação de recursos. Quando o participante deixar de contribuir e negociar com a seguradora uma renda mensal, o dinheiro irá para o caixa da companhia e o risco de quebra volta a ser relevante.

Mesmo com essa limitação, o mercado acredita que a mudança trará maior credibilidade entre os participantes, pela redução do risco geral do sistema. Com a novidade, a previdência privada ganha mais força para continuar a crescer em ritmo acelerado, diz Kasahaya, da Porto Seguro.

Ao mesmo tempo que determinou a blindagem dos planos, a MP do Bem também permitiu o uso das reservas em previdência como garantia para obtenção de empréstimos imobiliários em condições melhores. O edital da CVM também traz a regulamentação dessa norma. Até o dia 8, o mercado poderá oferecer sugestões ao edital, que serão avaliadas pela CVM, para posterior publicação de norma definitiva.