Título: Governo brasileiro não vê mudança na relação com EUA
Autor: Balthazar, Ricardo
Fonte: Valor Econômico, 09/11/2006, Internacional, p. A13

Importantes para conter o unilateralismo na política externa americana e por acrescentar uma nova pitada protecionista na política comercial dos EUA, a vitória da oposição democrata nas eleições parlamentares é insuficiente, porém, para provocar mudanças significativas nas relações americanas com o Brasil. Essa é a avaliação de diplomatas, empresários e especialistas brasileiros.

No Itamaraty, aguarda-se com muito mais interesse a apresentação do próximo Orçamento dos Estados Unidos, quando o governo e o poderoso lobby agrícola locais darão indicações da margem de manobra que terão nas negociações comerciais.

"Existe sempre a visão de que o Partido Democrata tem uma posição mais protecionista em matéria comercial, mas isso nem sempre ocorre", comentou o presidente da seção brasileira do Conselho Empresarial Brasil-Estados Unidos, Henrique Rzezinski, que é dirigente da Embraer. "Em alguns momentos, o governo Bush foi mais protecionista que o governo democrata de Bill Clinton", comparou.

Para Rzezinski, executivo de grande experiência em negociações internacionais, as mudanças políticas nos EUA não trazem conseqüências facilmente previsíveis, como acontece no cenário ideológico europeu. Os empresários com negócios com os EUA só terão avaliação mais clara quando forem escolhidos os poderosos presidentes das Comissões no Congresso, afirmou. "Nós, na Embraer, estamos curiosos em relação à comissão de Transportes", exemplificou.

No Itamaraty, onde por tradição não houve reação oficial à escolha política dos eleitores americanos, também se lembrava ontem que os republicanos na atual legislatura mostraram-se mais protecionistas que muitos políticos democratas, como demonstrou o presidente da Comissão de Finanças do Senado, Bill Grassley, um dos principais porta-vozes do lobby agrícola contrário aos interesses brasileiros nos EUA. Os diplomatas brasileiros avaliam que não haverá mudança significativa na política dos EUA com relação ao Brasil.

Na negociação que mais interessa ao governo brasileiro, na Organização Mundial de Comércio, é o lobby agrícola supra-partidário americano quem impede o Executivo de fazer concessões maiores, em matéria de corte nos subsídios e nas tarifas de importação do setor rural, que distorcem o comércio global.

A nova maioria democrata poderia dificultar a extensão do "trade promotion authority", a TPA, autorização parlamentar para que o Executivo firme acordos sem risco de emendas no Congresso. Mas a atual TPA já traz mais restrições do período de governo democrata, e não há espaço político para introdução de temas vinculados às bandeiras democrata, como meio ambiente e regras trabalhistas.

Embora alguns analistas avaliem que os democratas enterrarão de vez qualquer possibilidade de extensão na TPA, que expira em julho, especialistas como Rzezinski crêem que eventuais avanços na OMC permitiriam a George Bush obter apoio para uma extensão de prazos.

Há dúvida ainda sobre se será o atual Congresso que analisará as propostas de mudança no Sistema Geral de Preferências (SGP), pelo qual vários países em desenvolvimento, entre eles o Brasil, se beneficiam de redução de tarifas de importação no mercado americano. Por isso, o governo brasileiro minimiza as possibilidades de que a vitória democrata provoque mudanças no debate.

O SGP expira em dezembro. Vários países sul-americanos vêm pressionando Washington pela manutenção das preferências.