Título: Nordeste semeia pesquisas para colher mais cana
Autor: Mônica Scaramuzzo e Paulo Emílio
Fonte: Valor Econômico, 28/12/2004, Agronegócios, p. B8

Com sua produção limitada por topografia e clima irregulares, a cultura da cana-de-açúcar no Nordeste do país vai ganhar mais atenção dos pesquisadores brasileiros. A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) iniciará estudos, em parceria com universidades da região, para estimular a expansão dos canaviais no Nordeste, disse ao Valor Clayton Campanhola, presidente da Embrapa. Atualmente, a produção nordestina de cana é concentrada em Alagoas e Pernambuco, que respondem por cerca de 75% da colheita total da região. Mas a Embrapa acredita no potencial das áreas de cerrado para a expansão da atividade canavieira. "O sul do Maranhão e o sul do Piauí, além da região norte do Tocantins, têm potencial para o cultivo da cana-de-açúcar", afirmou Campanhola. Nesta safra, a 2004/05, a colheita de cana no Nordeste pode alcançar 63 milhões de toneladas. Se confirmadas as previsões, será um crescimento de 5% sobre o ciclo 2003/04, segundo Renato Cunha, presidente do Sindicato das Indústrias de Açúcar e Álcool de Pernambuco (Sindaçúcar/PE). "O bom resultado vai depender do regime de chuvas até o final de janeiro", disse. A colheita deve terminar em março. Um grupo de trabalho já está em formação para a implementação dos estudos visando à expansão, e este grupo terá apoio de universidades, sobretudo em Alagoas, segundo Campanhola. "Como a topografia é acidentada, o que impede a expansão da cultura, parte dos pesquisas vai se concentrar no manejo do solo, com estudos sobre os riscos de degradação", disse. Outra parte de pesquisas se concentrará em variedades mais resistentes ao clima da região, afetada pela seca. "Estamos na fase de captação de recursos. Temos ainda que decidir onde será a sede física para dar continuidade a estes trabalhos", afirmou. Segundo Campanhola, o projeto de revitalização da cultura da cana no Nordeste ficará pronto no final de janeiro. Com logística privilegiada, as usinas da região também estão investindo em tecnologia para garantir maior eficiência e expandir negócios no exterior. Para a safra 2004/05, os investimentos estão estimados em até R$ 315 milhões somente em Alagoas e Pernambuco. Neste ano, as usinas do Nordeste também começaram a exportar açúcar VHP (Very High Polarization), com maior valor agregado. Para o professor e coordenador do Programa de Melhoramento Genético da Cana (PMGCA) da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), Geraldo Veríssimo, as perspectivas para o desenvolvimento de novas variedades a partir do convênio com a Embrapa são positivas. "A Embrapa já atua de forma conjunta conosco aqui no campus da Ufal. A idéia é ampliar esta parceria. As conversações entre as duas entidades ainda estão em curso e esperamos que tudo seja equacionado rapidamente", disse. Segundo o pesquisador, o projeto prevê desenvolvimento de novas variedades de cana através da expertise dos dois órgãos e da utilização de tecnologias como a biologia molecular. A Ufal é hoje uma das principais referências em melhoramento genético da cana da região. Seu banco de germoplasma registra mais de 2 mil acessos. As pesquisas desenvolvidas pela Ufal - com recursos próprios ou por meio de convênios, como o firmado em outubro com o setor sucroalcooleiro alagoano, no valor de R$ 1 milhão por ano - resultaram no desenvolvimento das chamadas variedades de cana denominada República Brasileira (RB). A família RB conta com 57 variedades já lançadas, sendo 25 cultivadas em larga escala em todo o Brasil. Veríssimo disse que as estimativas indicam que apenas uma variedade, a RB 72454, ocupa mais de 1 milhão dos 5,5 milhões de hectares dos canaviais nacionais. Cunha, do Sindaçúcar, também destacou os estudos feitos pela Rede Interuniversitária para o Desenvolvimento Sucroalcooleiro (Ridesa), composta por sete universidades rurais federais do país. Ele acredita que nos próximos quatro anos a região possa colher mais de 70 milhões de toneladas de cana por ano. As usinas do Nordeste não atingem mais essa marca desde que a região foi atingida por uma forte seca no final da década de 90.