Título: Roberto Rodrigues defende parcerias público-privadas
Autor: Zanatta, Mauro
Fonte: Valor Econômico, 07/11/2006, Agronegócios, p. B12

Roberto Rodrigues pretende publicar dois livros no ano que vem. Um deles sobre a história recente da agricultura brasileira, outro sobre a evolução do cooperativismo no país. Os trabalhos serão baseados em cerca de 450 artigos escritos de 1985 para cá, revisitados e devidamente comentados.

A seleção dos artigos, e de discursos e entrevistas, foi feita com a ajuda de uma bibliotecária e duas assistentes, e já estava pronta antes de Rodrigues assumir o Ministério da Agricultura, em janeiro de 2003. Depois de três anos e meio na equipe do presidente Lula, de onde saiu em julho passado, resenhas de artigos antigos que estavam no prelo passaram a receber novos comentários, em um processo já bastante adiantado.

"Os livros só não foram publicados antes porque virei ministro", afirma Rodrigues. Para quem espera desabafos ou confidências bombásticas sobre seu turbulento período à frente do ministério, portanto, pode ser uma decepção.

Sobre essa experiência, Rodrigues ainda mantém discrição e é econômico nos comentários, mesmo após uma auto-imposta quarentena encerrada no último dia 2.

Ao Valor, reafirmou que será lembrado por muitos como o "ministro da crise", como disse em entrevista concedida antes de deixar Brasília, e que "cumpriu sua missão", como reiterou ao anunciar seu afastamento em meio a divergência. Mas admite que ainda não sabe se valeu ou não a pena.

"Ocupei muitas posições na vida e sempre tive o mesmo defeito, que é 'casar' com aquilo que estou fazendo. Sempre tive dúvidas, mas sempre me convenci de que tudo o que fiz ao longo desses mais de 40 anos de agronegócio valeu a pena. Espero chegar a essa mesma conclusão em relação ao ministério".

Os últimos meses, diz, têm sido alentadores, sobretudo depois do desgaste sofrido com as críticas envolvendo a crise de renda dos produtores de grãos ao longo das safras 2004/05 e 2005/06 e da descoberta de casos de aftosa no rebanho bovino do Mato Grosso do Sul e do Paraná, no fim do ano passado - mais recentemente, também teve seu nome relacionado à polêmicas sobre a revisão dos índices de produtividade que norteiam a reforma agrária e à campanha pela reeleição do presidente Lula.

O alento tem vários motivos. O primeiro, afirma Rodrigues, foi ter visto o atual ministro da Agricultura, Luís Carlos Guedes Pinto, seu amigo há 46 anos, manter os principais pontos da política agrícola que vinha sendo desenvolvida; o segundo veio com os resultados positivos dos instrumentos oferecidos pelo governo para sustentar o mercado de soja; e o terceiro é quase diário, e envolve o sem-número de homenagens e troféus recebidos desde que deixou a pasta.

Além desses pontos, ressalta resultados obtidos para a proteção dos produtores - "sobretudo com os novo títulos do agronegócio e com o seguro rural" -, no comércio exterior - "o G-20 nasceu praticamente na minha mesa" -, e com a consolidação, no seio do governo, da idéia de que a agroenergia é um novo paradigma mundial - "o Brasil pode liderar esse avanço".

Para Rodrigues, sua passagem pelo governo também contribuiu para conferir ao Ministério da Agricultura uma visão estratégica de longo prazo melhor definida - "como um país agrícola não tinha isso?" -, num trabalho que, segundo ele, só será compreendido em sua plenitude nos próximos anos. "Cumpri todos os compromissos que assumi com o governo e com o setor, apesar da crise".

Aos 64 anos, com boa aparência e o bom humor de outros tempos em recuperação, Rodrigues recebeu o Valor na sala que ocupa na sede da Associação Brasileira de Agribusiness (Abag), uma das diversas entidades representativas que já presidiu. Em plena avenida Paulista, o também ex-presidente da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) tenta ordenar as diversas atividades que começou a desenvolver nesse "pós-governo".

Ferrenho defensor de parcerias público-privadas para o desenvolvimento do agronegócio, com a criação de Sociedades de propósitos Específicos (SPE) para ampliar aportes em pesquisas - "precisamos criar um fundo para isso e podemos ter até um 'MIT' sobre agroenergia no país" -, Rodrigues é um exemplo daquilo que prega.

Na quinta-feira, torna-se professor visitante no Cepea/Esalq, e também reassumirá cadeiras que já ocupou no campus de Jaboticabal (SP) da Unesp (Cooperativismo e Organização Rural). Já foi empossado na presidência do novo Conselho Superior de Agronegócios da Fiesp e será coordenador-geral do Centro de Agronegócios da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Voltou às palestras - "estou cobrando, porque não recebo nada de Fiesp e FGV" - e articula a criação de um fundo de private equity para investir em agroenergia. "Nesta área, estamos diante de desvios de seriedade em alguns projetos. Não podemos esquecer que a crise da abundância é mais grave que a crise da escassez", afirma.

Legalista, consciente das dificuldades em negociar com países ricos e sabedor dos limites das políticas públicas, Rodrigues afirma que não quer ser "o" líder de nada ou voltar à presidência de qualquer entidade. Aos mais chegados, sempre disse que não gosta de voltar a cargos que já ocupou.

Olhar para trás, apenas no romance que está escrevendo, que já consumiu 100 páginas. Ambientada em Jaboticabal (SP), onde tem uma fazenda que produz cana, soja e se orgulha de ter 350 mil árvores plantadas - boa parte com amigos (mais ou menos) próximos -, a história terá como pano de fundo o desenvolvimento agrícola da região, do qual participou. Mas os mesmos amigos afirmam que ele ainda tem outras histórias, mais recentes, para contar.