Título: Ajuste externo beneficia brasileiras
Autor: Vieira, André
Fonte: Valor Econômico, 06/11/2006, Empresas, p. B7

As florestas de abetos e pinus já não são abundantes como antigamente. Nem estão tão próximas das fábricas. As máquinas já não operam com a velocidade exigida pelos novos tempos nem possuem escalas com nível de competitividade. Neste cenário desolador, a outrora pujante indústria fabricante de papel do Canadá não tem encontrado outra saída senão encerrar as atividades de suas antigas fábricas. Definitivamente.

Em 27 de outubro, a Domtar, terceira maior fabricante de papel da América do Norte, fechou duas fábricas de uma só vez na província de Quebec. Vinte dias antes, a empresa canadense tinha encerrado as atividades de outras duas unidades. Quase 500 empregados perderam o emprego e outros 450 trabalhadores florestais foram cortados. Sem as quatro unidades, a Domtar terá reduzida em um terço sua produção de papel.

O fechamento das fábricas de papel no Canadá é um dos sintomas mais visíveis desta indústria que começa a perder dinamismo em meio à crescente posição obtida por outros produtores, como o Brasil. Em blog especializadas, como o "Forest Talk", o maior número de notícias se refere a fechamento de fábricas. No entanto, o problema não se resume ao Canadá, mas afeta também produtores nos EUA e países Escandinavos.

O que é um problema na América do Norte, vira oportunidade para a indústria no Brasil. No trimestre passado, a Klabin exibiu em seu relatório financeiro: "Uma notícia favorável foi o recente anúncio do fechamento de uma fábrica [...] no Canadá, com capacidade de produção de 300 mil toneladas/ano de kraftliner. [...] As fábricas de caixas de papelão ondulado serão abastecidas com kraftliner dos produtores americanos, o que deverá manter o mercado ajustado."

"O setor de papel e celulose do Canadá fechou 5,3 milhões de toneladas de capacidade entre 2004 e 2006. De papel para embalagens, foram 900 mil", informa Miguel Sampol, diretor-geral da Klabin, maior fabricante brasileira. "Nos EUA, em 2005, foram 6,7 milhões de toneladas, das quais 2,2 milhões de papéis para embalagens."

O setor de papel destes países, com tradição centenária e que ajudou a moldar suas economias industrializadas durante os séculos 19 e 20, parece demonstrar falta de dinamismo no início do século 21. O custo caixa, um medidor da competitividade da indústria, que define o valor para produção de uma tonelada, vai de US$ 400 a US$ 500 em alguns países, mais do que o dobro do encontrado no Brasil.

"Chega um momento em que o fluxo de caixa fica negativo e é melhor fechar a fábrica", disse Sampol. A indústria canadense tem alegado custos mais altos nas operações com madeira - as florestas estão mais longe das fábricas - e argumentado que os gastos com energia cresceram a ponto de inviabilizar produção mais competitiva. Pesam contra a valorização de 30% do dólar canadense em relação à moeda americana nos últimos três anos que tirou dinamismo das exportações do país ao seu maior mercado, os EUA.

Com a oferta mais escassa, as cotações têm atingido recordes. Isso pode levar fábricas menos competitivas de volta ao mercado. Mas isso não tem ocorrido. Os preços do kraftliner, utilizados na produção de embalagens, estão hoje cotados a US$ 630 a US$ 650 por tonelada na Europa. São os valores nominais mais altos da história. Pouco tempo atrás, era cotados a US$ 400 por tonelada e nem assim as fábricas pararam de fechar as portas.

À espera de preços ainda melhores, o cenário, no entanto, indica que as indústrias têm procurado a acertar o foco dos seus negócios, desfazendo-se de atividades menos rentáveis por outras mais promissoras. A International Paper (IP), maior fabricante americana de papel, fez ampla reestruturação mundial, vendendo ativos de papel revestidos e milhões de hectares de terras (era um dos maiores proprietários privados do mundo), levantando vários bilhões de dólares, para concentrar-se em dois negócios: embalagens e papel de imprimir e escrever.

Paulatinamente, a indústria tem procurado locais mais competitivos para instalar-se, como o Brasil. E o que acontecerá nos países do Hemisfério Norte? "Os EUA produzem 90 milhões de toneladas de papel. O mundo ainda precisará por muitos anos desta capacidade", disse Sampol. Segundo o diretor da Klabin, a migração da indústria para o Sul do globo será um processo contínuo, porém lento. "Mesmo com o fechamento, as empresas canadenses, americanas e suecas possuem grandes capacidades de produção e uma grande solidez financeira. A capacidade de resistência deles é enorme", disse.

Sampol não vê também uma redução da produção de papel, ao longo deste processo, devido ao maior uso de tecnologias digitais ou substituição por outros tipos de materiais. A demanda mundial por papel é de 360 milhões de toneladas, lembra. O mercado continuará crescendo na mesma proporção da economia mundial, diz. "Significa que ela poderá chegar logo a 400 milhões de toneladas."