Título: Estrela de Jaques Wagner sobe nos planos do PT para 2010
Autor: Costa, Raymundo
Fonte: Valor Econômico, 03/11/2006, Política, p. A5

Antes de 2010 há 2008, e antes das eleições municipais há o processo de reestruturação do partido, que se prenuncia longo e penoso, mas desde já o PT pensa na sucessão de Lula. E há uma novidade nesse quadro: o nome do governador eleito da Bahia, Jaques Wagner, cuja surpreendente virada na eleição ajudou até a segurar o "day after" da campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, psicologicamente abalada por ter de disputar um segundo turno que não estava em seus planos. O nome de Jaques surgiu no núcleo petista mais próximo do presidente.

O argumento tem sua lógica: Jaques venceu no quarto maior colégio eleitoral do país, derrotou a oligarquia carlista há décadas no poder, e vai governar um Estado situado geograficamente na região que foi avassaladoramente lulista no primeiro e no segundo turnos das eleições. Para se tornar uma opção efetiva, agora terá de sair-se bem no governo da Bahia. Uma tarefa difícil, sobretudo porque requer a substituição da burocracia pefelista há anos incrustada no poder. Para isso, deve ter ajuda do governo federal e do PT.

Uma das hipóteses avaliadas é que o atual presidente da Petrobras, Sérgio Gabrielli, possa deixar a estatal para ajudar na Bahia. Jaques e Gabrielli são amigos desde as salas de aula. O difícil é a troca no comando da Petrobras: Lula está satisfeito com o trabalho de Gabrielli, cujo nome é citado até para o Ministério da Fazenda, e não se cansa de lembrar que a empresa teve um lucro maior que a soma do lucro dos bancos privados.

Jaques Wagner vive uma realidade nova no PT. Nem o próprio Lula acreditava que ele pudesse vencer a eleição. Quando o ministro decidiu sair do governo para se candidatar, Lula o desaconselhou. Jaques insistiu. Lula concordou, mas advertiu que ele, depois, não pedisse para voltar ao cargo, porque não voltaria. Mas essa nova condição não significa que o governador eleito tornou-se uma unanimidade no PT. Os irmãos Viana (Jorge e Tião), do Acre, articulam em outras direções.

A era pós-Lula, na realidade, é a terceira das "tensões" que o PT deve experimentar a partir de agora. A primeira é a reestruturação do partido, também chamada de "despaulistização" ou de mudança do "centro geográfico" do comando do partido. Lula, que sempre delegou a tarefa a um "regente" do tipo José Dirceu, promete operar pessoalmente essa reestruturação. Até a véspera da eleição, a perspectiva para a presidência do PT girava em torno de dois nomes: o atual presidente interino, Marco Aurélio Garcia, e o do secretário-geral da Presidência, Luiz Dulci.

O nome do governador do Acre, Jorge Viana, também circulou, mas nesta semana passou a freqüentar as conversas petistas o nome do ex-presidente da Petrobras José Eduardo Dutra. A exemplo de Garcia e Dulci, é um nome da confiança de Lula. Poderia ir para o ministério, mas tem como obstáculo a regra ainda não revogada segundo a qual Lula não quer levar derrotados para o governo - Dutra perdeu a eleição para o Senado. O ex-presidente da Petrobras também tem um padrinho forte, o governador eleito de Sergipe, Marcelo Déda, que é compadre de Lula.

Dulci e Garcia preferem continuar no governo. Garcia assumiu a presidência do PT com uma posição muito clara: arrefecer a crise do dossiê, impedir o PT de atrapalhar a eleição e depois voltar. Dulci tem apoios importantes, como o da ex-prefeita Marta Suplicy e dos irmãos Viana, do Acre. Mas no Planalto, o ministro rasga elogios ao desempenho de Garcia: está indo muito bem, é boa figura, tem jogo de cintura. Dulci é o único remanescente do antigo "núcleo duro", mas deve perder funções, se permanecer no cargo: Lula acha que o ministro está "assoberbado", tendo de cuidar da Secretaria Geral, dos movimentos sociais e da publicidade de governo. Talvez a publicidade se desgarre da Pasta.

A segunda "tensão" é o relacionamento do PT com os aliados. Especialmente com o PMDB, que ameaça avançar sobre a fatia petista do governo. Mas está preocupado também com Ciro Gomes (PSB), a quem enxerga como potencial adversário para 2010. No que era chamado de "campo majoritário", há queixas contra a posição muito "anti-paulista" de Déda e Jaques Wagner, o que só serviria para engrossar o discurso de Ciro. E São Paulo representa 26% do eleitorado nacional.

No Planalto argumenta-se que a "despaulistização" não significa o afastamento dos paulistas, mas a mudança de métodos e de adequar a direção do PT à pluralidade surgida das urnas. Tanto que Marta Suplicy, vitoriosa em São Paulo, terá liberdade de escolha: se quiser, será ministra por quatro anos. Mas se quiser preparar sua volta à Prefeitura em 2008, contará com todo o apoio do governo. Vencedora, é opção para 2010.É a partir das eleições municipais que o PT passará a construir para valer a era pós-Lula. (Colaborou Cristiane Agostine, de São Paulo)