Título: Fundo adverte para aumento dos gastos
Autor: Balthazar, Ricardo
Fonte: Valor Econômico, 03/11/2006, Finanças, p. C8

A aceleração recente dos gastos públicos no Brasil e em outros países da América Latina ameaça reverter parte significativa dos ganhos obtidos com a expansão da economia mundial nos últimos anos, adverte o Fundo Monetário Internacional (FMI) em relatório sobre perspectivas econômicas da região, divulgado ontem.

Na avaliação do Fundo, Brasil e seus vizinhos ainda têm dívidas muito elevadas e aproveitaram pouco oportunidades criadas pelo prolongado ciclo de expansão para reduzi-la. Agora que a desaceleração dos Estados Unidos cria novos riscos para a economia mundial, o aumento dos gastos públicos pode tornar esses países mais frágeis diante do novo cenário.

"Como a dívida pública permanece alta e as melhorias na posição fiscal [da região] devem muito ao ambiente externo e conjuntural favorável, essa é uma fonte significativa de preocupação", afirma o relatório. De acordo com o FMI, os gastos primários do setor público, excluído o pagamento dos juros da dívida e descontada a inflação, aumentaram 7,5% na região em 2005 e subirão 9,2% neste ano.

No Brasil, as despesas primárias do governo subiram 6,6% no ano passado e devem crescer 5% neste ano, segundo os cálculos do Fundo. Embora o fenômeno tenha sido observado em toda a região, ele é mais acentuado na Argentina, onde os gastos públicos devem aumentar mais de 8% neste ano, e na Venezuela, onde as despesas crescem a um ritmo superior a 27%, segundo o FMI.

O aumento acelerado das despesas públicas é reflexo da boa fase atravessada pela economia mundial e da explosão recente dos preços de mercadorias como o petróleo e metais como o cobre, que deram impulso às exportações da América Latina e também melhoraram a arrecadação dos governos da região.

Países como o Brasil aproveitaram o momento para abater suas dívidas e tornar seu manejo mais confortável, reduzindo a participação de papéis indexados ao dólar e estendendo os prazos de vencimento. Mas o relatório do FMI observa que, apesar de todo esse esforço, o endividamento da América Latina continua acima dos níveis observados antes das crises financeiras que atingiram a região a partir de meados da década de 90.

De acordo as estimativas do Fundo, a dívida pública da América Latina será equivalente a 54% do Produto Interno Bruto (PIB) no fim deste ano, combinados todos os países da região. É bem menos que em 2002, quando ela representava 77% do PIB regional, mas é mais do que a média observada em 1996, que era inferior a 50%. Argentina e Brasil são os países com os piores índices de endividamento.

O Chile, com dívida inferior a 8% do PIB no fim de 2005, é apresentado pelo FMI como um modelo por causa da maneira como administrou os frutos colhidos com o aumento dos preços do cobre, produto responsável por grande parte das exportações chilenas. O governo economizou o grosso da receita extra, resgatou parte da dívida e agora se prepara para usar os recursos para capitalizar o Banco Central e assegurar o pagamento de pensões e aposentadorias.

O Fundo lamenta que outros não tenham seguido o exemplo, preferindo aumentar seus gastos. "A postura fiscal em muitos países está se tornando expansionista num momento em que o crescimento rápido [da economia] oferece uma oportunidade para agir rapidamente para reduzir a vulnerabilidade causada pela dívida elevada", afirma o relatório. O FMI calcula que a América Latina crescerá 4,75% neste ano e 4,25% no próximo.