Título: As normas do Coaf para o setor imobiliário
Autor: Silva, Paulo R. Teixeira da
Fonte: Valor Econômico, 12/12/2006, Legislação & Tributos, p. E2

Começou a vigorar no fim de novembro a Resolução nº 14, editada em 27 de outubro passado pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), órgão especial de inteligência do Ministério da Fazenda. A resolução obriga as empresas do ramo imobiliário a comunicar ao órgão quaisquer operações consideradas suspeitas. As novas normas do conselho aumentam a fiscalização de transações imobiliárias, visando o combate à corrupção e à lavagem de dinheiro.

A lavagem de dinheiro é a conduta de quem regulariza, legaliza ou legitima o dinheiro obtido com atividades ilícitas, tendo por objetivo a introdução do produto de determinados crimes antecedentes no mercado legal, através de operações comerciais e financeiras. A matéria é regulamentada pela Lei nº 9.613, de 3 de março de 1998, que tipificou os crimes de lavagem de dinheiro e determinou, através do Decreto nº 2799, de 8 de outubro de 1998, a criação do Coaf, com a finalidade de disciplinar, aplicar penas administrativas, receber, examinar e identificar as ocorrências suspeitas de atividades ilícitas previstas na Lei nº 9.613, sem prejuízo da competência de outros órgãos e entidades, para, se for o caso, denunciar os envolvidos ao Ministério Público.

O Coaf segue o modelo das unidades financeiras de inteligência - órgãos presentes em diversos países e que se definem como "agências nacionais, centrais, responsáveis por receber, analisar e distribuir às autoridades competentes as denúncias sobre informações financeiras com respeito a presumidos procedimentos criminais requeridas pela legislação e normas nacionais para impedir a lavagem de dinheiro", segundo a definição do Grupo de Ação Financeira sobre Lavagem de Capitais (Gafi).

O termo lavagem é expresso de forma distinta nos países que possuem legislação especifica, como "money laundering" nos Estados Unidos, "lavado de ativos" na Argentina, "blanqueo de dinero" na Espanha e "branqueamento de dinheiro" em Portugal. Todos esses termos significam a mesma coisa; ou seja, atividade de "oficializar" recursos que foram obtidos por meios ilícitos. O processo de lavagem envolve três etapas: colocação, quando se utiliza as atividades comerciais e financeiras para a introdução de valores no circuito legal; ocultação, ou operações que visam a dificultar o rastreamento contábil; e a integração, quando os valores são incorporados formalmente ao mercado legal. Com a edição da Lei nº 9.613, ficaram estabelecidas as condutas criminosas e as normas que objetivam prevenir e punir os crimes de lavagem, merecendo destaque a obrigação de comunicar as operações suspeitas.

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Por força da nova legislação, as empresas imobiliárias estarão obrigadas a remeter regularmente informações ao Coaf no que tange a transações cujo pagamento seja igual ou superior a R$ 100 mil, especialmente no caso de recursos oriundos de paraísos fiscais. Além disto, as empresas terão a obrigatoriedade de informar todas as operações consideradas suspeitas, conforme lista de doze situações relacionadas no anexo à Resolução nº 14.

Em suma, a nova legislação obriga a uma efetiva ação preventiva, de forma que as empresas imobiliárias se organizem para o cumprimento da resolução, criando um canal institucional, organizando e mantendo atualizado o cadastro de seus clientes e informando transações suspeitas, como forma de aperfeiçoar o combate a crimes financeiros.

A idéia embutida na resolução é obrigar que as diversas empresas integrantes do mercado imobiliário, tais como construtoras, incorporadoras e corretoras de imóveis, detectem e analisem os clientes que se enquadram em uma série de situações previstas como suspeitas, por exemplo, transações imobiliárias cujo pagamento seja realizado em espécie ou com recursos de origens diversas (cheques de várias praças e/ou de vários emitentes). Também são alvo de suspeitas as negociações com aparente superfaturamento ou subfaturamento do valor do imóvel ou transações incompatíveis com o patrimônio, a atividade econômica ou capacidade financeira presumida dos adquirentes, as quais deverão ser denunciadas ao Coaf no prazo de 24 horas.

É de se notar que tal resolução ressalvou que as denúncias "de boa-fé" não acarretarão responsabilidade civil e administrativa para aquele que comunicou (parágrafo 2º, artigo 11 da Lei nº 9.613), mesmo que o fato comunicado não represente crime. Seria prudente, todavia, que somente fossem denunciados pelas empresas os fatos que reúnam indícios evidentes de ilicitude, interpretando-se a resolução com bom senso e razoabilidade para se evitar situações injustas ou arbitrárias.

Paulo Roberto Teixeira da Silva é advogado especialista em direito imobiliário do escritório Albino Advogados Associados

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