Título: Lei do Saneamento vai à sanção presidencial
Autor: Izaguirre, Mônica
Fonte: Valor Econômico, 13/12/2006, Política, p. A11

A Câmara dos Deputados aprovou ontem o projeto de lei que estabelece o marco regulatório para a prestação de serviços de saneamento básico no país. Não houve mudança em relação ao texto do Senado, por onde o projeto já tinha passado. Para virar lei, a matéria agora só depende de sanção do presidente da República.

A ausência de uma legislação específica que regule o setor é apontada pelas empresas prestadoras, tanto públicas quanto privadas, como um dos entraves à ampliação de investimentos. Uma vez implementada a lei, portanto, a expectativa é de haja expansão mais acelerada das redes de abastecimento d´água e de coleta de esgoto. Em 2005, o Brasil investiu em saneamento cerca de 0,22% do Produto Interno Bruto. Mas, pelos cálculos do setor, para universalizar os serviços em 20 nos, são necessários 0,63% do PIB ao ano.

Além de propiciar mais segurança jurídica às relações entre empresas prestadoras e os entes públicos titulares dos serviços, o que por si só já é visto como um estímulo, o texto aprovado ontem prevê um incentivo adicional a investimentos. Valores investidos gerarão crédito tributário, reduzindo a carga de Cofins e Pis/Pasep. Falta definir o prazo de utilização desse crédito, tarefa que o projeto remete à regulamentação infra-legal.

Os dois tributos consomem, em média, 7% do faturamento anual das empresas de água e esgoto. Só as de controle dos Estados vão gastar este ano cerca de R$ 1,1 bilhão com essas contribuições federais, informa a Associação das Empresas de Saneamento Básico Estaduais (Aesbe). A entidade espera que, ao sancionar o projeto do Legislativo, o presidente Lula não vete o artigo que prevê a nova forma de crédito tributário. Como houve acordo com a base governista no Congresso, essa é expectativa.

No que se refere ao marco regulatório, a principal inovação trazida pelo projeto é a exigência de que os serviços de saneamento básico sejam regulados e fiscalizados por agências reguladoras com independência decisória e autonomia administrativa e financeira. Na visão da Aesbe, a independência dos orgãos que autorizarão reajustes de tarifas e fiscalizarão o cumprimento de metas de desempenho é o que dá as empresas, sejam elas públicas ou privadas, segurança quanto à utilização de critérios técnicos e não políticos. O consumidor também ganha com a exigência de fiscalização independente, que se estenderá inclusive à qualidade dos serviços.

Em 2005, o governo Lula encaminhou ao Congresso uma projeto de marco regulatório. Elaborado sob a batuta de Olívio Dutra quando era ministro das Cidades e com tramitação iniciada na Câmara, o texto do Executivo atribuía a conselhos municipais com participação popular o poder de decidir sobre reajustes de tarifas de água e esgoto. Esse foi um dos principais motivos de polêmica em torno da proposta, cuja tramitação não foi adiante.

Vários versões de substitutivo foram apresentadas pelo relator, deputado Júlio Lopes (PP-RJ), ao projeto do governo, na tentativa de conciliar posições do Ministério das Cidades, do empresariado e outros segmentos interessados. Como essa divisão se refletia no posicionamento dos deputados envolvidos na discussão, o esforço não vingou.

Diante disso, Lopes defendeu e conseguiu das presidências das duas Casas a formação de uma comissão mista especial do Congresso e da Câmara dos Deputados para elaborar um novo projeto, cuja tramitação seria iniciada no Senado, onde era mais fácil conseguir consenso. Esse foi o projeto aprovado ontem também pela Câmara.

Durante as discussões ontem, o deputado Rodrigo Maia (RJ), líder do PFL, chegou a pedir retirada de uma parte do artigo 3, que, se aprovado, obrigaria retorno da matéria ao Senado. O problema foi contornado pela promessa do governo de vetar essa parte do texto. Ela reconhece o direito dos Estados de integrar os serviços em regiões metropolitanas, por intermédio de lei complementar estadual, apesar da titularidade ser dos municípios. Segundo o deputado Júlio Lopes, esse veto não traz problemas porque o projeto apenas repete a Constituição Federal nesse aspecto. Os Estados nada perdem, garantiu ele.

O projeto aprovado permite a prestação regionalizada dos serviços, inclusive mediante prática de subsídios cruzados entre diferentes localidades, para que municípios superavitários banquem o déficit de cidades onde as empresas têm prejuízo. Essa era uma das principais preocupações das empresas estaduais, principais responsáveis pelos serviços no país. Elas respondem por 76% do abastecimento d´água e por 55% da coleta de esgoto.

Antes do projeto que vai à sanção, o Congresso fez pelo menos outras três tentativas de aprovar um marco regulatório para o setor. O primeiro projeto, que não vingou, é de 1991.