Título: TCU culpa governo e corte de verbas
Autor: Basile, Juliano
Fonte: Valor Econômico, 13/12/2006, Brasil, p. A7

O Tribunal de Contas da União (TCU) eximiu a Aeronáutica e os controladores de vôo pela crise no setor a aéreo e pôs toda a culpa no governo. Em relatório aprovado, ontem, o TCU apontou o contingenciamento de recursos como a principal causa para o "apagão" aéreo. A culpa, segundo o relatório, é da Casa Civil e dos ministérios da Defesa e do Planejamento.

Segundo o ministro Augusto Nardes, relator das investigações sobre a crise aérea no TCU, foram cortados R$ 522 milhões do setor nos últimos três anos. Este valor é a diferença entre o que foi pedido pelo Departamento de Controle do Espaço Aéreo (Decea) - órgão vinculado ao Comando da Aeronáutica, responsável pelo controle dos Cindactas - e o que foi repassado pelo governo.

Para 2004, o Decea pediu R$ 715 milhões e a Secretaria de Orçamento Federal do Ministério do Planejamento concedeu R$ 468,7 milhões. Para 2005, o Decea pediu R$ 667 milhões e recebeu R$ 495 milhões. Para este ano, foram requisitados R$ 575,4 milhões e o Planejamento autorizou R$ 530 milhões. Ao todo, são R$ 463 milhões em cortes no Decea e mais R$ 59 milhões no Sistema de Controle do Espaço Aéreo Brasileiro - órgão também subordinado à Aeronáutica -, chegando assim aos R$ 522 milhões.

Apesar de o Planejamento ter subido ano a ano a previsão orçamentária do setor, e a Aeronáutica ter pedido verbas cada vez menores, Nardes não perdoou o governo. "A responsabilidade foi do governo pela falta de investimentos e por cortes sem critérios", acusou o ministro do TCU. "A crise não foi uma obra do acaso, mas o resultado de dificuldades de gestão."

Segundo ele, houve alertas constantes de falta de dinheiro, mas a resposta da Casa Civil foi a de que a política de contingenciamento não admitia exceções. Nardes afirmou que, numa reunião do Conselho Nacional de Aviação Civil, em 28 de julho de 2005, um representante da Casa Civil - ele não revelou o nome - esclareceu que o corte de verbas era linear, para todos os órgãos do governo, inclusive os da aviação, e, portanto, não era possível abrir exceções.

Nardes também acusou o Ministério do Planejamento de cancelar um concurso para a contratação de 64 novos controladores de vôo, em 2005. O TCU recomendou ao governo que estude a criação de uma carreira de controladores, com salários mais altos do que os atuais, de aproximadamente R$ 2 mil.

O ministro Walmir Campelo disse que os controladores fazem "bicos" para ganhar mais, quando deveriam trabalhar em regime de dedicação exclusiva. O problema, segundo Campelo, é que os controladores são, em sua maioria, sargentos da Aeronáutica e, na hierarquia militar, não podem ganhar mais do que coronéis e generais. "É imprescindível a valorização desses profissionais."

Como medida de urgência, o TCU pediu ao governo que use o sistema africano de "mão-dupla" nas vias aéreas. O sistema é utilizado para evitar choques de aeronaves em áreas de difícil comunicação, caso da Amazônia. Ao invés de voar em alturas diferentes, os aviões seguem na mesma altura, mas em distância mínima de 40 quilômetros um do outro. "Poderíamos ter evitado o acidente com a Gol se tivéssemos essas aerovias", disse Nardes.

O ministro do TCU também viu problemas no repasse de verbas pela Infraero. Segundo ele, a Infraero arrecada R$ 3 bilhões por ano com tarifas. Desse valor, gasta R$ 2 bilhões, repassa R$ 700 milhões para a Aeronáutica e R$ 231 milhões para o Tesouro. Para o tribunal, o ministério deveria reavaliar os repasses, de modo a garantir verbas maiores aos órgãos responsáveis pelo controle de vôos.

O TCU fará uma segunda auditoria no setor aéreo para avaliar penalidades aos gestores responsáveis pela ordenação de despesas à aviação. Ao final da auditoria - ainda sem data para ser concluída - o tribunal irá indicar multas aos gestores ou até a perda da função.

Nardes negou que tenha agido com descortesia ao declarar que o ministro Waldir Pires teria lhe confidenciado que é preciso rezar para evitar novos casos de atrasos nos vôos "Rezar, para mim, é algo positivo. Eu respeito a fé de cada um."