Título: Governos da Venezuela e Brasil criticam pressão de industriais
Autor: Rocha, Janes
Fonte: Valor Econômico, 29/06/2007, Brasil, p. A5

A pressão dos empresários brasileiros sobre o Congresso para que não seja aprovada a entrada da Venezuela no Mercosul foi duramente criticada ontem, tanto pelo governo brasileiro quanto pelo venezuelano. "É uma medida de cegueira e, em alguns casos, percebo um discurso de natureza política e ideológica", afirmou o assessor especial para Assuntos Internacionais da Presidência, Marco Aurélio Garcia, ao sair da reunião de ministros de Relações Exteriores na abertura da 33ª reunião do Conselho do Mercado Comum.

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) divulgou documento criticando a entrada da Venezuela no Mercosul. Garcia disse que o governo "sempre leva em conta a opinião dos empresários, assim como dos sindicatos", mas tem que zelar, em primeiro lugar, "pelo interesse nacional".

O vice-ministro venezuelano de Relações Exteriores para a América Latina e Caribe, Rodrigo Sanz, disse que seu país não aceita pressões de grupos econômicos, por mais poderosos que sejam. "São inaceitáveis as declarações dessa associação (a CNI), que vê a integração como simples comércio e como maximização de lucros de suas empresas", atacou o funcionário.

Embora não declarado publicamente, havia uma clara insatisfação entre os participantes da reunião com a demora da Venezuela em oficializar o cumprimento de suas obrigações para entrada no bloco. O presidente Hugo Chávez desmarcou sua participação na reunião dos presidentes do Mercosul, que começa hoje na capital paraguaia. Ele e seu chanceler estavam em uma visita oficial à Rússia.

A contrariedade dos sócios do Mercosul com Chávez ficou patente, tanto na entrevista de Garcia quanto na de Reinaldo Gárgano, chanceler do Uruguai. Quando questionado sobre se o governo iria insistir com a aprovação da entrada da Venezuela no Congresso, Garcia respondeu: "Vamos ver o que Chávez quer. O que não queremos é que a entrada (da Venezuela) seja aprovada e logo depois ele (Chávez) diga que não vai cumprir (as regras para entrada no bloco) agora, que quer jogar para mais 12 anos, quatro anos..."

Gárgano disse que interpelou Sanz, na reunião, perguntando se realmente a Venezuela está interessada em entrar no Mercosul. Segundo ele, o vice-ministro teria respondido positivamente, mas Gárgano não parecia muito convencido. Sanz reiterou que a Venezuela está interessada em concluir o processo de integração com o Mercosul, mas ressalvou: "O ritmo dos programas de liberalização econômica e desoneração tarifária tem que ver com o processo de adequação da economia. Nenhum país abre a fronteira para destruir sua base de indústria nacional. Por isso o processo é gradual."

Sanz também criticou o Senado brasileiro pela ameaça de não aprovar o protocolo de adesão da Venezuela, depois que Chávez chamou os congressistas de "papagaios de Washington", quando o Congresso criticou a não-renovação da concessão da RCTV.

Em entrevista no Hotel Yacht Golf, onde se realiza a reunião, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, disse que esperava algum tipo de retratação de Chávez aos comentários que desagradaram os políticos brasileiros. "Uma palavra simpática do presidente Chávez em relação ao Congresso que, afinal de contas, foi eleito legitimamente. Acho que isso ajudaria, a boa vontade sempre é positiva, de lado a lado", afirmou.