Título: EUA querem limitar a ação de juízes de painéis da OMC
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 29/06/2007, Internacional, p. A14

Os Estados Unidos, o país mais envolvido em disputas comerciais, está propondo o controle sobre os juízes da Organização Mundial do Comércio (OMC) nas decisões de contenciosos.

Com a Rodada Doha à beira do abismo, os países discutem a revisão do mecanismo de solução de controvérsias. Esse mecanismo já examinou 364 disputas desde a criação da OMC, em 1995, e pode ser mais acionado se as barreiras protecionistas aumentarem ou se Doha realmente fracassar. Os maiores envolvidos na solução de controvérsias são EUA, União Européia, Canadá, Brasil, Índia, Coréia, México, Japão, Tailândia e Argentina. Até agora, 76% dos casos foram lançados por esse grupo.

A revisão do órgão de solução de controvérsias deveria ter sido completada em 2003, mas não avançou por causa das divergências entre os países. A necessidade de revisão é em geral aceita, para fazer do mecanismo algo mais eficaz e mais rápido (uma disputa dura hoje pelo menos 16 meses). Normalmente, os perdedores nas disputas reclamam que os juízes tomam muita liberdade na interpretação das regras ou mesmo que tentam criar novas normas, substituindo a negociação entre os países.

Pelo atual mecanismo, a adoção das decisões dos painéis (comitês de investigação) e do Órgão de Apelação é automática. Mas os americanos reclamam que os argumentos e as conclusões dos relatórios "podem às vezes ir além do que os países consideram ser necessário para resolver a disputa ou, em certas circunstâncias, ser mesmo contra-produtivos para resolver o caso".

Por isso, Washington propõe mecanismos para "melhorar a flexibilidade [dos beligerantes] para resolver as disputas e o controle dos membros sobre o processo de adoção [das decisões]".

A proposta americana é de a OMC passar a ter um mecanismo pelo qual os países envolvidos em disputa possam "eliminar por acordo mútuo as conclusões no relatório que não são necessárias ou úteis para resolver a disputa, e assim continuando a permitir as partes a manter o controle sobre os termos de referencia [do caso]".

Dessa forma, os EUA defendem que um painel "não inclua na parte final de seu relatório nenhuma conclusão ou raciocínio básico que as partes tenham concordado em não ser incluído".

Para ter acesso à decisão dos juízes antes de sua divulgação, os EUA propõem a criação de um "relatório provisório" também no Órgão de Apelação, espécie de corte suprema do comércio internacional. Assim, os países poderiam eliminar do texto o que não lhes agrada, reduzindo a independência dos juízes e o escopo da decisão jurídica. Além disso, é mais fácil um pais rico "convencer" um pobre a aceitar cortes no documento.

A oposição à proposta tem sido grande, o que deixou os EUA praticamente isolados.

Na prática, o país que traz uma denúncia acaba sempre sendo o vencedor na disputa. Ocorre que, muitas vezes, o país reclamante apresenta uma enormidade de queixas num único caso e os juízes rejeitam vários pontos. Na própria avaliação dos EUA, de 73 disputas até outubro do ano passado, o país reclamante teve 24 resolvidas de maneira satisfatória, sem chegar até o fim dos casos; outras 26 foram ganhas nos pontos principais; e só em 4 seus argumentos não prevaleceram. Como acusados em 103 contenciosos, os EUA calculam que 17 disputas foram resolvidas sem terminar o caso na OMC; 30 foram perdidas; e em 14 teriam conseguido ganhar em pontos importantes. Até pela sua participação como o mais envolvido, os EUA foram o país que mais teve argumentos rejeitados.

De todos os conflitos na OMC, em apenas 15 casos os juízes acabaram autorizando retaliação. Atualmente, o Brasil tem uma demanda de autorização para retaliar os EUA na disputa do algodão.

O México quer apresentar proposta pela qual, em vez de retaliação, os países dêem preferências a compensações, por exemplo, através de redução tarifária para determinado produto do país que conseguiu provar ter sofrido prejuízo com ação do parceiro.