Título: PMDB, um partido que coleciona indiciados
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 29/06/2007, Opinião, p. A20

O verbo "sangrar" tem sido usado à farta por senadores de oposição e de situação desde que o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), foi acusado de ter pago a pensão para uma filha de relacionamento extra-conjugal com o dinheiro da construtora Mendes Júnior e, para defender-se, apresentou documentos que uma perícia rápida da Polícia Federal constatou serem "frios".

O termo "constrangimento" vem sendo empregado com igual regularidade no plenário do Senado e dirigido ao presidente da casa, que insiste em se manter no cargo e presidir as sessões, por senadores do seu próprio partido. Ainda assim, enquanto alguns parlamentares constatam que o Senado "sangra" e confessam-se constrangidos, o caso Renan se arrasta, sem solução, por um Conselho de Ética que hora existe, hora renuncia. E o maior problema é que o constrangimento transcende a situação política de um único senador. Na verdade, o PMDB bate a cabeça porque não chega à conclusão sobre como julgar um dos seus sem expor os demais.

Matéria publicada ontem no site "Congresso em Foco" mostra que o PMDB, maior partido do Senado, tem 20 dos 81 senadores e responde, em bloco, por 62% dos processos contra senadores em tramitação no Supremo Tribunal Federal (STF). De toda a sua bancada, apenas três nunca foram indiciados pela Justiça Federal, pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça: Pedro Simon (RS), Paulo Duque (RJ) e Geraldo Mesquita Jr (AC). Dos que foram indiciados, 11 tiveram seus processos arquivados.

Se Renan deixar o foco, entra em cena o ex-governador do DF, Joaquim Roriz, e não apenas pelas gravações divulgadas recentemente que sugerem negociações suas pouco republicanas com uma empresa. Antes disso já era o campeão. Contra ele existem quatro inquéritos no STF e seis ações na Justiça Federal, assim distribuídos: quatro por crime contra a administração pública, dois por crime eleitoral, um por crime de imprensa e três outros que estão em segredo de justiça. O senador Leomar Quintanilha (TO) - feito às pressas presidente da Comissão de Ética pelo PMDB antes que PSDB e PT pudessem fazer um acordo para resolver o impasse de um julgamento que ninguém quer fazer - tem contra ele um inquérito contra a ordem tributária, que tramita em segredo de Justiça. O líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), teoricamente o responsável pelas articulações da bancada governista para tirar a pedra no sapato do governo que se tornou o caso Renan Calheiros - e agora o caso Roriz - responde a inquérito por crime de responsabilidade por desvio de recursos no STF e a uma ação civil pública na Justiça Federal, ambos em segredo de justiça. Um deles é segredo de Polichinelo, já que foi derrubado do Ministério da Previdência, no primeiro governo Lula, devido a denúncia de sua participação em uma operação de empréstimo feita pela Frangonorte, da qual foi sócio, junto ao Banco da Amazônia, oferecendo fazendas fantasmas em garantia.

Ganha um segundo lugar em problemas com a Justiça, em relação ao restante da bancada do partido, o líder do PMDB no Senado, Valdir Raupp (RO). São ao todo sete processos criminais contra o ex-governador: dois processos por crime contra a administração pública, duas ações por crime contra o sistema financeiro, uma ação por desvio de verbas e outra que está em segredo de Justiça.

Aqueles que estão no PMDB desde há muito e não têm nada a ver com os problemas criminais de seus pares são os que insistem na renúncia de Renan, declaram-se constrangidos e pedem apuração de fato do assunto. E são eles também que constatam que o partido, herdeiro da história da oposição institucional à ditadura militar que subjugou o país de 1964 a 1985, não é mais que uma pálida imagem do que já foi. Eles, pelo menos, não caíram na história agora sustentada por Renan, de que está sendo vítima de um complô político. Até agora, o componente político do escândalo não apareceu. A oposição tem se comportado no episódio com uma civilidade até excessiva. O apoio a Renan dentro do PMDB e da base aliada é cada vez menor, mas a vontade de desestabilizá-lo jamais moveu os oposicionistas.