Título: Na mira do insider
Autor: Vieira, Catherine
Fonte: Valor Econômico, 26/06/2007, EU & Investimentos, p. D1

A governança faz diferença, mas a liquidez ainda é um fator mais relevante quando se mede a probabilidade de ocorrência de operações com informações privilegiadas - a chamada PIN - numa determinada ação. Esta é uma das principais conclusões de um estudo que acaba de ser finalizado pelo professor da Coppead-UFRJ, Ricardo Leal. O trabalho, que mede a PIN em ações dos quatro segmentos diferentes do mercado brasileiro (Novo Mercado, Nível 2, Nível 1 e listagem tradicional) mostra que, na média, o Novo Mercado e o nível 2 estavam mais vulneráveis no período estudado, que foi de 2001 a meados de 2006.

Porém, quando são analisadas ações com índice de liquidez semelhante, verifica-se que o nível superior de governança faz diferença positiva, diz o estudo. "Os níveis de governança influenciam o resultado, uma vez considerada a liquidez", diz o trabalho. Ele conclui ainda que aumentar em cerca de 25% a liquidez nos maiores níveis de governança, ou seja, nível 2 e Novo Mercado, seria suficiente para melhorar o quadro.

Segundo Leal, porém, é preciso ressaltar que as coisas no mercado brasileiro têm sido dinâmicas e que, de um ano para cá, após período analisado, o cenário já pode ter mudado para melhor. "O mercado tem evoluído rapidamente, as ofertas primárias e as novas listagens no Novo Mercado estão a todo vapor", diz ele. Além disso, as empresas passaram a contratar mais os chamados formadores de mercado , o que ajuda a fomentar a liquidez. As punições a casos de uso de informação diferenciada também têm sido uma contribuição positiva, ressalta o especialista.

Na pesquisa, foram analisadas 48 ações, sendo 12 de cada segmento disponível no mercado brasileiro. A seleção foi de acordo com a liquidez: em cada uma das quatro carteiras formadas foram incluídas as seis ações mais líquidas e as seis menos líquidas.

"Os resultados indicam que as ações do mercado tradicional apresentam a menor probabilidade de operação com informação, seguidas das ações do Nível, e pelas do Novo Mercado e Nível 2", diz o trabalho. "Os resultados são fortemente influenciados pela liquidez (...) Dentro de níveis de liquidez similares, os níveis de governança apresentam menores probabilidades de operação com informação", completa o artigo.

"O que nosso trabalho concluiu é que não basta ter o selinho do Novo Mercado e está tudo resolvido, é preciso, por exemplo, ter uma base diversificada de investidores e boa liquidez", lembra Leal. Segundo o professor, o resultado dos testes é consistente com o que seria esperado, uma vez que as ações de maior liquidez, por serem monitoradas por mais analistas e investidores já deveriam naturalmente estar menos vulneráveis a problemas de informações desiguais.

"É importante notar que quando falamos de informação privilegiada não estamos tratando necessariamente de algo ilegal que foi utilizado por alguém, não há como medir isso com exatidão nesse modelo", explica Leal. Ele ressalta que o simples fato de um investidor mais qualificado ter acesso a uma informação disponível, mas não amplamente difundida, ou ter maior capacidade para analisar determinado dado já pode ter impacto nas negociações com os papéis e ser caracterizado como uma informação diferenciada.

"As operações de compra e venda ocorrem por ações de operadores informados, potenciais informados e desinformados. Informação, nesse caso, é definida como o sinal que pode ser interpretado como informação privilegiada sobre o verdadeiro valor do ativo. O modelo assume que tal sinal seria resultado de 'insider information'", explica o trabalho do Coppead.

O modelo usado na pesquisa para medir a probabilidade de ocorrência de operação com informação privilegiada (PIN) foi desenvolvido em 1996 por David Easley e outros acadêmicos nos Estados Unidos e procura medir 'ex-post' (depois de ocorridos os eventos) a probabilidade de que tenham ocorrido transações baseadas em informações privilegiadas.

Leal lembra que as análises são feitas com base em indícios estatísticos fornecidos pelos modelos econométricos que analisam as operações diárias. "Claro que não analisamos quem foram os operadores porque esses dados são sigilosos", esclarece ele.

De acordo com o artigo elaborado por Leal, com a parceria de Claudio Barbedo e Eduardo Camilo da Silva, o modelo do PIN não havia ainda sido testado para os ativos do mercado brasileiro. Eles ressaltam ainda que o fato de a Bovespa ter a segmentação clara entre os quatro níveis de governança permitiu realizar um experimento único, uma vez que não há essa clara divisão em outros mercados.

A pesquisa ressalta que grande parte das ações para elevar a governança corporativa nas empresas está voltada para aumento e valorização da transparência e que os índices que medem a governança são indicadores do nível de proteção teórica que o acionista pode ter ao investir numa empresa, mas é difícil medir a eficácia dessas estratégias e como elas são de fato aplicadas. Assim nasceu a idéia de tentar analisar se os regulamentos dos mercados com níveis diferentes de governança previnem efetivamente a expropriação do acionista minoritário.