Título: Metas de inflação no Brasil devem convergir para 3% no longo prazo
Autor: Prada, Marcela e Jensen, Juan
Fonte: Valor Econômico, 25/06/2007, Opinião, p. A12

O debate em torno da reunião do dia 27 de junho do Conselho Monetário Nacional está quente. Nessa reunião, o CMN definirá a meta de inflação para 2009. Apesar das últimas declarações do ministro da Fazenda e do presidente da República, que tornam baixa a probabilidade de mudança neste momento, existem dentro do governo estudos para reduzir a meta de inflação, atualmente em 4,5% ao ano, e a banda de tolerância, atualmente de dois pontos percentuais. Além disso, está em estudo a fixação de uma meta já para 2010.

Acreditamos como muito positiva a fixação da meta de 2009 em 4%, mantendo o intervalo de tolerância em mais ou menos dois pontos percentuais. Isso seria o reinício de um processo de convergência das metas para patamares mais baixos num horizonte de médio e longo prazo. A motivação para a revisão das metas vem não só do fato de a inflação e as expectativas já estarem em patamares mais baixos, não gerando custos de desinflação, mas também pelo fato de os principais países com os quais transacionamos bens e serviços no mercado mundial terem inflação mais baixa que a nossa.

De uma forma geral, em um sistema de metas de inflação há quatro questões importantes a serem definidas: a) a medida de inflação, se núcleo ou índice cheio; b) o horizonte de tempo, c) a definição da meta numérica a ser perseguida e d) o intervalo de tolerância.

Primeiramente, com relação à medida de inflação a ser adotada como meta, há uma tendência entre os países que adotam o sistema de metas de inflação de optar pela inflação cheia em vez de medidas de núcleo, tanto pela vantagem em termos de transparência da política monetária, quanto por não correr o risco de excluir itens importantes da cesta de consumo. Os núcleos, entretanto, são utilizados como referência para guiar a política monetária. No Brasil, portanto, não deve haver alterações na medida de inflação utilizada como meta, que já se trata da inflação cheia (IPCA).

Com relação ao horizonte para as metas, a experiência internacional mostra que, na adoção do sistema em países com inflação alta, costumam ser estipuladas metas anuais para o ano calendário, com valores decrescentes ao longo do tempo até a convergência para patamares considerados razoáveis que, normalmente, são fixados em linha com a inflação dos principais parceiros comerciais. Alcançado este patamar, em muitos casos, nota-se que as metas passam a ser fixadas para um horizonte de médio ou longo prazo ou para um período indefinido, com avaliação contínua do cumprimento da meta ao longo dos meses e não somente em dezembro de cada ano. A checagem contínua das metas tem como ponto favorável aumentar a credibilidade da política monetária. Mas a desvantagem é impor maior rigidez ao sistema, podendo resultar em maior volatilidade da taxa de juros e do crescimento do produto.

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Quanto ao valor da meta, uma simples comparação com os demais países emergentes que adotaram o sistema de metas mais ou menos na mesma época que o Brasil mostra que a meta brasileira está em um patamar mais elevado que a média (ver tabela). Na Colômbia, por exemplo, país que adotou o sistema de metas no mesmo ano que o Brasil, a meta para 2007 está entre 3% e 4,5% e o governo já se manifestou sobre uma meta de longo prazo entre 2% e 4%. Entre os países selecionados, o Brasil tem a maior meta, juntamente com África do Sul e Filipinas, mas sozinho é o que tem a maior margem de tolerância.

É claro que a convergência para metas mais baixas tem que ser feita com cuidado. No Brasil, no início do sistema de metas estabeleceu-se uma trajetória agressiva de redução das metas de inflação. O objetivo era, provavelmente, atingir uma inflação de 3% ao ano. Mas, em função das crises vividas em 2001 e 2002, não cumprimos as metas por vários anos e o processo de convergência para metas mais ambiciosas foi abandonado, mantendo-se metas de 4,5% desde 2005.

O momento atual é propício para mudanças em virtude da inflação corrente baixa e de expectativas bem ancoradas. Mas o processo de convergência tem que ser feito gradualmente para não incorrer nos mesmos erros do passado. Assim, a meta para 2009 poderia ser fixada em 4%, mantendo-se a tolerância de dois pontos percentuais. Também seria importante definir o objetivo de longo prazo, além do horizonte de tempo para alcançá-lo.

Acreditamos que o patamar de 3% possa ser almejado como meta de longo prazo, mas com uma convergência gradual, com redução de 0,25 ponto porcentual na meta ao ano a partir de 2010. Com isso, chegaríamos a uma meta de 3% em 2013, que poderia ser mantida para um horizonte de tempo indefinido.

Por fim, o intervalo de tolerância para as metas também poderia ser reduzido, dado que a melhora dos fundamentos nos últimos anos tornou a economia brasileira mais resistente a choques. Inclusive, o governo já discute internamente a redução da banda. Mas acreditamos que a redução deveria ser feita em etapas. Primeiramente o governo deveria focar o debate na redução das metas. Posteriormente, no estreitamento do intervalo de tolerância.

Marcela Prada é economista da área Macro da Tendências Consultoria Integrada.

Juan Jensen é economista, chefe da mesa Macro da Tendências Consultoria Integrada e professor do Ibmec-SP.