Título: Só renovação não previne crise, dizem deputados
Autor: Jayme, Thiago Vitale e Lyra, Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 25/06/2007, Política, p. A9

Um dos temas mais polêmicos da reforma política é o da renovação dos quadros políticos na Câmara dos Deputados. Críticos da lista fechada nas eleições para deputado dizem que o dispositivo perpetuaria no poder os caciques partidários, diminuindo o grau de renovação a cada legislatura. Levantamento feito pelo deputado Ibsen Pinheiro (PMDB-RS) mostra, no entanto, que a renovação tem sido grande, ao longo do tempo, sem que isso resulte necessariamente num Congresso menos propício a crises.

De 1994 até a atual legislatura, houve uma renovação de 95% na Câmara - de uma legislatura para outra, o percentual está entre 40% e 60%. Mesmo com tamanha mudança de nomes, o Congresso vive um dos piores momentos da História, com denúncias de corrupção cada vez mais freqüentes.

"A renovação, quando não ocorre, é péssima. Mas, se for em grande medida, pode gerar efeitos colaterais", diz Ibsen. Muitos parlamentares que não se reelegeram acabaram disputando outros cargos políticos. Existem ainda as baixas por doença ou morte. Mas há um grande contingente que simplesmente não consegue se reeleger.

Para o pemedebista, a renovação em excesso gera vícios no sistema. "A atividade parlamentar é, acima de tudo, um aprendizado", completou. "Temos muita renovação. Em contrapartida, estamos vivendo um processo de deterioração da legislatura. Não critico deputado fulano ou sicrano. Estou falando na média dos políticos eleitos para o Congresso", afirmou o vice-líder do Democratas na Câmara, José Carlos Aleluia (BA).

Para o parlamentar baiano, a degradação da política leva ao desinteresse dos jovens pela atividade. "Hoje quem se candidata tem uma visão mercantilista, de tirar proveito. Não pretende mudar conceitualmente a realidade brasileira", disse Aleluia.

O vice-líder do governo na Câmara, Henrique Fontana (PT-RS), também não vê o alto índice de renovação, isoladamente, como algo positivo. "Se o problema fosse só uma questão de renovação, a política brasileira já teria se qualificado", diz o deputado. "O eleitor tem o falso raciocínio de que basta trocar a pessoa para melhorar as coisas, em vez de tentar mudar o sistema político e a forma como se faz política." Para Fontana, é preciso mudar essa cultura. "Temos de mostrar que seis ou sete partidos apresentarão suas propostas e o eleitor vai optar por programas. Se um partido conduz mal a política, perderá espaço", disse o vic-líder.

O deputado Arnaldo Madeira (PSDB-SP) tem idéia mais radical de mudança no sistema eleitoral. Defende o voto distrital puro, segundo o qual, o Brasil seria dividido em 513 distritos eleitorais que elegeriam um deputado federal cada. "Se renovação intensa fosse boa, teríamos o melhor Congresso do mundo. Nosso problema, ao meu ver, é a falta de representatividade dos eleitos", observou. O partido de Madeira, o PSDB, também defende esse sistema, mas de forma mista e não pura, como Madeira. Metade dos eleitos viria dos distritos e a outra metade da forma como se vota hoje.

Tanto Ibsen quanto Aleluia concordam em outro ponto: é preciso acabar com o atual modelo e criar outro, qualquer que seja ele. "Não importa. Só o fato de mudar algo, já vale, tira a estabilidade do atual modelo", defendeu Aleluia. Ibsen reconhece que a conscientização sobre a falência do atual modelo não garante uma mudança para melhor. Para ele, na hora de debater as mudanças, cada um lutará para manter seus interesses.

Henrique Fontana acredita que a aprovação da reforma mudaria a forma como os partidos tratam os parlamentares envolvidos em corrupção. "Hoje, o partido diz que não tem nada a ver com ele, o descarta e pede votos ao eleitor", afirmou. Dessa forma, a renovação vinda das urnas não é qualificada. Com a lista fechada ou flexível, Fontana acredita que a renovação ou a manutenção dos nomes será feita de forma mais cuidadosa. "Com a lista, a sigla terá de tomar cuidado. Estará comprometida com aqueles nomes."

Para Henrique Fontana, a dificuldade de aprovação do texto está nos interesses pessoais de cada parlamentar. "A dificuldade reside no fato de que qualquer mudança assusta muito. Há sempre uma pressão interna por mudanças (na reforma) conservadoras", disse ele.

Sobre o financiamento público, ponto central da reforma na opinião do PT, Arnaldo Madeira pensa que é uma ilusão. "O caixa 2 vai aumentar porque a empresa que quiser ter um deputado do seu lado vai financiar sua campanha. Precisamos é aumentar os mecanismos de fiscalização", disse ele.

Na terça-feira, a Câmara volta a debater a reforma política. Uma emenda assinada por PT, PMDB, DEM, PCdoB, PPS e PSB deverá nortear a discussão. O texto prevê a lista fechada flexível. Pela regra, 50% das vagas na Câmara serão preenchidas com os votos na lista e a outra metade pela votação direta. O eleitor dará dois votos: um no partido, obrigatório, e outro no candidato, facultativo.