Título: Partido monta escola para elaborar políticas sociais
Autor: Junqueira, Caio
Fonte: Valor Econômico, 25/06/2007, Política, p. A10

O estrago eleitoral feito pelo Bolsa Família no antigo PFL, principalmente em seu reduto histórico, o Nordeste, surtiu efeitos práticos no DEM. No intuito de se aproximar das classes populares e conquistar seus votos, o partido pretende entrar de vez na discussão dos problemas sociais brasileiros. Para tanto, dois caminhos são traçados. Quanto ao conteúdo, um instituto de desenvolvimento social será criado para debater e formular propostas. Na forma de comunicação, a legenda se prepara para "humanizar" seu discurso.

"Temos que nos preocupar com os problemas práticos diários das pessoas. Por exemplo. Temos uma bandeira: a extinção da CPMF. Mas dependendo de como você vai tratar isso na sociedade, as classes D e E não vão entender o que você está falando. Então, começamos a colocar uma questão prática nas nossas discussões internas para humanizar o debate. Não adianta falar da CPMF para a dona Maria que mora na periferia de Belém. O que isso tem a ver com a vida dela? Agora, dependendo da forma como a gente se comunicar, se você falar sobre o dinheiro da saúde para qual ela foi criada e que não veio, aí ela vai entender", afirma a ex-vice-governadora paraense na gestão Simão Jatene (PSDB), ex-secretária de Proteção Social do Pará e mulher do deputado federal Vic Pires Franco (DEM-PA), Valéria Pires Franco, 37 anos, responsável pela área de desenvolvimento social da sigla.

O mecanismo de aproximação com as classes populares será dado pela Escola Democratas de Desenvolvimento Social, um instituto de pesquisa e formulação de projetos que será criado no segundo semestre.

"O PFL sempre foi considerado um partido de elite. A gente percebeu que isso foi um ciclo que se esgotou. Queremos nos aproximar daquilo que é importante para a vida das pessoas. Um contato mais direto com a população, ir para dentro das comunidades, dos municípios, das lideranças comunitárias. O partido tinha um distanciamento muito grande. Daí a mudança de nome, a vinda de lideranças mais jovens, para a gente retomar o contato com a sociedade", diz Valéria.

A meta da Escola é trabalhar com os dados disponíveis no Cadastro Único, banco de dados do governo federal com informações sócio-econômicas dos lares de todos os municípios do país. A partir das deficiências detectadas, serão elaborados planos de trabalho. Dez políticas sociais foram escolhidas como pilares de atuação: saúde, habitação, segurança pública, foco nas mulheres, cultura, saneamento, educação infantil, qualificação profissional, esporte e lazer, e transferência de renda.

Em relação a este último item, há consenso no partido em relação ao Bolsa Família. Tido como algoz pefelista na região Nordeste e fortemente taxado de assistencialista nas eleições de 2006, o programa agora tem o apoio do Democratas. "Isso foi um grande marketing político que o PT fez muito bem. Apropriou-se de um programa que não começou com o Lula, mas teve um mérito que foi unificar o cadastro e permitir que com isso ele fosse otimizado e ampliado. Nós, Democratas, não somos contra a transferência de renda. Só achamos que ela é uma forma de combater a pobreza, mas não a única. Não pode se esgotar nisso. Há muitas outras carências nas famílias atendidas pelo Bolsa Família. O que queremos discutir são essas outras carências", afirma Valéria.

De acordo com ela, a Escola terá quatro eixos de atuação: articulação e mobilização, para promover as audiências públicas pelo país; Congresso Nacional, para subsidiar parlamentares com dados sociais; valorização profissional, para auxiliar e valorizar o trabalho de assistentes sociais pelo país; e novas tecnologias sociais, para discutir projetos sociais.

De olho nas eleições de 2008, o DEM pretende definir neste ano algumas bandeiras do partido na área social para que seus candidatos se comprometam. O primeiro passo será dado nos dias 5 e 6 de julho, em Brasília, quando todos os senadores, deputados e presidentes estaduais do partido discutirão, em um seminário interno, os temas meio ambiente, segurança pública, seguranças sociais e educação. Durante o segundo semestre, quando a Escola estiver em funcionamento, estão previstas dez audiências públicas em dez cidades diferentes do país, para discutir as políticas sociais que o partido pretende defender.

Um dos principais técnicos colaboradores é Marcelo Garcia, 37 anos, secretário de Assistência Social do município do Rio de Janeiro e ex-secretário nacional de Assistência Social durante o governo Fernando Henrique Cardoso: "Reconhecemos que a estratégia de transferência de renda que começou no governo Fernando Henrique e se consolidou no governo Lula é importante e deve ser mantida. Agora, abrindo os dados do Cadastro Único você percebe uma série de carências que as famílias possuem."

Questionado sobre a "entrada" de um partido historicamente conservador no debate social, ele é enfático: "A discussão social não tem propriedade. Ninguém tem o monopólio do debate e das idéias." (CJ)