Título: DEM aposta em 2008 para reverter declínio
Autor: Junqueira, Caio
Fonte: Valor Econômico, 25/06/2007, Política, p. A10

O partido que até 2002 tinha cadeira cativa no poder luta agora por um lugar na disputa política do país. Com o propósito de retomar a força que já teve no Congresso Nacional e nas Assembléias Legislativas, o Democratas, antigo PFL, estrutura-se com força para as eleições municipais de 2008. A estratégia inverte práticas pefelistas consagradas no decorrer da história da extinta legenda. Se antes suas candidaturas só eram lançadas se tivessem chances reais de vitória, agora qualquer uma deve ser lançada, contanto que demarque seu espaço político e se credencie para as eleições de 2010.

A meta é que, dos 5.546 colégios eleitorais brasileiros, cerca de 3,5 mil tenham candidaturas próprias do partido, o dobro de 2004, quando o então PFL lançou aproximadamente 1,7 mil candidatos a prefeito. Venceu em 792. Naquelas que serão as suas primeiras eleições desde a mudança do nome, essa contabilidade de prefeituras conquistadas passará a ter aspecto secundário para os líderes do partido. O principal objetivo passou a ser o número de votos somados obtidos nas urnas. Há três anos, foram 12,5 milhões. Em 2008, a intenção é alcançar os 15 milhões. Tudo para chegar em 2010 com um amplo leque de candidatos próprios a deputados federal e estadual cacifados eleitoralmente em seus redutos.

Com esse plano em mãos, praticamente todos os parlamentares do DEM estão convocados ou a serem candidatos a prefeito em 2008 ou, em uma hipótese subsidiária, participar ativamente da campanha eleitoral a partir do próximo mês, quando se inicia a composição das comissões provisórias municipais. A tarefa é traçar os cenários municipais e formar nomes interessados em disputar as prefeituras. Dentro da meta de 3,5 mil municípios, há prioridade para cerca de 200 deles por uma simples razão: a presença da televisão.

Com esses dois ingredientes - candidatura própria e televisão - o partido quer levar a imagem do seu candidato, apostando no recall para 2010, e, simultaneamente, amplificar a mensagem da legenda. No entanto, a questão que se apresenta é: qual a mensagem e para quem ela deve ser prioritariamente destinada? Para dar a resposta, o Democratas encomendou uma ampla pesquisa ao instituto de pesquisas GPP. Em um calhamaço com 137 páginas, destrinchou a população brasileira por renda familiar, região, grau de instrução e preferência política entre esquerda, direita e centro e cruzou esses dados com respostas sobre a imagem que ela tem dos partidos, opinião sobre temas polêmicos em debate no país e, claro, avaliação do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

A radiografia mostrou a gestão do petista com avaliação positiva de governo nas áreas econômica e social, mediana em educação e negativa em segurança e saúde pública. Revelou também uma população majoritariamente conservadora, contrária ao aborto, à legalização das drogas e à união civil homossexual. Com isso, o partido se conscientizou de que criticar o "assistencialismo eleitoral" do Bolsa Família pode atrapalhar seus planos. E que há brechas para um ressurgimento de uma agremiação conservadora. Traçou-se, pois, a mensagem. "Não vamos mais ficar batendo cabeça nas áreas em que o governo federal é bem-avaliado. Queremos é potencializar os problemas do governo Lula. Falar da segurança pública, da saúde, da alta tributação", afirma o deputado federal Rodrigo Maia (RJ) , presidente do partido.

Para transmitir bem a mensagem, o DEM trará especialistas espanhóis para treinar seus candidatos. Eles virão por meio de um intercâmbio com o Partido Popular da Espanha, que, junto com o DEM, integra a Internacional Democrata de Centro, associação mundial de partidos políticos.

Por ora, muitos políticos do Democratas estão receosos em se arriscar, sem chances, em 2008. Mas a cúpula afirma que irá "jogar duro" em cima disso. A própria forma como ocorreu a reestruturação tende a facilitar esse trabalho. Por determinação da cúpula, os antigos diretórios estaduais e municipais do PFL foram transformados em comissões provisórias. A vantagem desse mecanismo é que os dirigentes estaduais têm o poder de destituir, com uma "canetada", comissões provisórias municipais que não atendam aos interesses do partido para a disputa de 2008. Com isso, pretendem eliminar a utilização da legenda em locais em que elas têm servido a interesses de outros partidos ou de políticos que antes integravam o PFL, mas que migraram a outras siglas. Uma "faxina", como diz outro integrante da cúpula. Um caso específico citado é o Maranhão, onde o grupo Sarney detinha controle absoluto sobre os diretórios pefelistas.

Vários motivos fundamentam essa mudança no perfil competitivo da sigla. O primeiro deles e mais óbvio é a perda de cadeiras nos Executivos e Legislativos país afora, imposta nas últimas eleições. No Congresso, depois de ficar entre as duas maiores bancadas em todas as eleições desde a redemocratização, o PFL amargou um quinto lugar e uma bancada 20% menor do que em 2002. Das 27 unidades federativas, conquistou apenas uma, sem grande relevância política: o Distrito Federal. Bem diferente dos áureos tempos de 1990, quando ganhou sete Estados.

No entanto, a principal razão que redesenha os costumes eleitorais da legenda é a reforma política em discussão no país. Vislumbrando um fortalecimento das máquinas partidárias e alterações no sistema de disputa - seja para o voto em lista defendido pelo DEM, PMDB e PT, seja para o distrital, encampado pelo PSDB; ou ainda o fim das coligações nas eleições proporcionais -, os políticos do Democratas acreditam que o partido que não tiver quadros eleitorais estará fortemente sujeito ao desaparecimento em alguns anos.

A legenda também tenta se desvincular do PSDB, mas o prazo para isso ainda não é um questão fechada. Uma parcela da cúpula ligada ao ex-senador Jorge Bornhausen afirma que, para as eleições de 2010, o partido ainda deve estar junto com os tucanos. Outra, porém, mais próxima ao prefeito do Rio, Cesar Maia, aposta na diminuição dessa relação e em uma candidatura própria do partido para a Presidência. Para esses, o PSDB não tem interesse no fortalecimento do DEM. "Os tucanos não vêem que esse ciclo de poder em que todos chegaram ao poder central acaba em 2010. Eles querem que o ciclo de alternância seja entre eles e o PT", afirma um integrante da cúpula partidária. Para ele, o apoio dos tucanos a Arlindo Chinaglia (PT-SP) para a presidência da Câmara e a retirada de apoio à lista fechada na discussão sobre a reforma política são os sinais mais evidentes disso. "Eles não quiseram apoiar o Aldo Rebelo (PCdoB-SP) para não propiciar um novo pólo de poder. E na questão da lista, quiseram evitar que os quatro maiores partidos se fortalecessem para 2010", diz.