Título: Comercializadoras rejeitam papel de assessoramento
Autor: Capela, Maurício e Scaramuzzo, Mônica
Fonte: Valor Econômico, 25/06/2007, Empresas, p. B6

Bastou um empurrão do governo federal para que a geração de energia a partir do bagaço de cana tomasse corpo no Brasil. Desde que a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) promulgou a resolução 247/06 em dezembro passado, permitindo que as usinas de álcool e açúcar vendessem seus megawatts (MW) excedentes diretamente para o cliente final, os negócios têm aumentado dia após dia. Até porque, antes da resolução da agência, somente as distribuidoras tinham sinal verde para comercializar essa energia adicional.

Agora, com a resolução 247/06, uma porta se abriu para as comercializadoras de energia no mercado livre. Falta apenas a regulamentação das regras por parte da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), que poderá sair ainda em 2007, para que as comercializadoras possam incluir o MW do bagaço de cana no seu portfólio. Hoje, o mercado livre possui 600 grandes consumidores, o que lhe dá uma fatia de 25% do consumo de energia no Brasil.

"Atualmente, a comercializadora auxilia a usina no contrato de negociação do seu excedente de energia com o consumidor final. Mas quando pudermos contabilizar esses megawatts de biomassa à nossa comercialização de energia, teremos condições de mitigar a sazonalidade desse tipo de matriz e de ampliar o mercado para o bagaço", afirma Mateus Andrade, superintendente da Delta.

Comercializadora de energia, a Delta negocia 400 MW médios por mês, sendo que uma pequena parte decorre de fontes alternativas. Mas segundo Andrade, em dois anos, a empresa terá pelo menos 100 MW médios dessas matrizes diferenciadas, ou seja, de bagaço de cana e Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs).

Hoje, contudo, a negociação da energia de bagaço de cana ainda é tímida no país, algo como 1,7 mil MW. Mas as projeções já apontam para bem mais. Há estimativas que calculam o potencial entre 6 mil MW e 8 mil MW em um intervalo de poucos anos.

Cientes de que essas projeções ganham cada vez mais força no mercado, as comercializadoras de energia, além de atestá-las, afirmam ainda que é crescente a procura pelo insumo. "O fato de os produtores de álcool e açúcar começarem a olhar o bagaço de cana como um produto e não mais como um subproduto do processo aumentará a oferta de energia", afirma Paulo Toledo, sócio-diretor da Ecom.

O próprio executivo já sente isso na companhia. Mesmo que as comercializadoras de energia ainda não possam negociar o MW do bagaço entre os produtores e os consumidores finais, o fato é que o simples assessoramento de contratos já provoca impacto nos negócios.

Hoje, dos 300 MW médios que a Ecom comercializa por mês, pelo menos 10% já decorre desses contratos de assessoramento. E a tendência é crescente.

De fato, o viés é de alta nessa matriz. Tanto que a Comerc conta que atualmente todas as fontes alternativas representam apenas 8% dos 800 MW médios que a companhia tem sob sua gestão. Mas no futuro, assegura Marcelo Parodi, co-presidente da Comerc, a estimativa é que os insumos alternativos detenham 15%.

"O mercado é grande e é pulverizado. Mas há também a sazonalidade que a geração de energia a partir do bagaço tem. E é por isso que este insumo precisa de gestão, já que sua comercialização poderia ser combinada, por exemplo, com a energia de uma Pequena Central Hidrelétrica (PCH)", explica Parodi.

A combinação com outras fontes de energia também não é ignorada quando o assunto é preço. Tanto que acredita-se que o valor de um megawatt/hora (MWh) do bagaço de cana deverá ser muito próximo ao da PCH.

Segundo os comercializadores, por serem insumos alternativos, a semelhança é liquida e certa. "A PCH terá seu MWh por volta de R$ 135, enquanto a biomassa girará perto dos R$ 140", afirma Paulo Toledo, da Ecom. (MC)