Título: Renan pede anulação de perícia da PF e convoca sessão para votar LDO
Autor: Ulhôa, Raquel e Jayme, Thiago Vitale
Fonte: Valor Econômico, 11/07/2007, Política, p. A9

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), partiu ontem para a ofensiva. Abriu uma frente jurídica de questionamento ao seu processo e outra política na tentativa de retomar a iniciativa do cargo. Na primeira, encaminhou ao Conselho de Ética e Decoro Parlamentar petição apontando o que considera uma série de "máculas" e erros no processo aberto contra ele há um mês e meio. Pede a definição dos limites da investigação e a anulação da perícia realizada pela Polícia Federal nos documentos que apresentou.

Noutra frente, anunciou sessão do Congresso Nacional que votará a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), marcada para às 19h de hoje. Reunião de líderes realizada ontem deixou clara a insatisfação dos deputados com a permanência do senador alagoano no cargo.

"O Renan não é louco de presidir a sessão e chamar a atenção para ele de novo. Se ele presidir, vai ser um teatro. Será péssimo para a imagem do Congresso", disse o líder da Minoria, Júlio Redecker (PSDB-RS), durante a reunião. Os demais líderes ficaram em silêncio quando o tucano falou. Foi o discurso mais duro contra o pemedebista no encontro, realizado na sala do presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP).

Quando Redecker terminou de falar, vários líderes concordaram com ele. O único representante do PMDB na reunião, deputado Colbert Martins (BA), não se manifestou. "Há um convencimento dos líderes de que o Renan não vai conduzir a sessão", revelou o líder do PP na Câmara, Mário Negromonte (BA), depois da reunião. "Vamos votar a LDO. Sem o Renan, obviamente", confirmou o líder do PR, Luciano Castro (RR).

Em particular, o líder do governo na Câmara, José Múcio Monteiro (PTB-PE), confessou a Redecker que Renan não deveria mesmo presidir a sessão. As pressões da Câmara se juntam àquelas já manifestadas no Senado. Na semana passada, vários senadores pediram a Renan que deixe a presidência da Casa. No início da noite de ontem, o pemedebista começava a ceder, pelo menos na questão da sessão do Congresso. Avisou à imprensa que só presidiria a sessão "se for necessário".

Paralelamente, Renan encaminhou ofício ao procurador-geral da República, Antônio Fernando Barros e Silva de Souza, solicitando que a procuradoria verifique a autenticidade dos citados documentos, relacionados a operações de vendas de gado de sua propriedade. A perícia realizada pela PF a pedido do Conselho de Ética apontou uma série de inconsistências na documentação.

A iniciativa de Renan - considerada pelo PSDB como tentativa de emperrar as investigações do Conselho de Ética - mostra sua disposição de recorrer até as últimas instâncias judiciais contra eventual condenação por quebra de decoro, que poderia levar à cassação do mandato.

Em confronto verbal mantido no plenário com o líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM), que voltou a defender seu afastamento da presidência do Senado, o pemedebista desafiou os que querem sua renúncia do cargo - a quem chamou de "Catão" (general romano que foi um carrasco com seus adversários) - e afirmou que irá "até o fim" na defesa dos seus direitos.

"Vou cumprir o meu papel como presidente do Senado. E aquele que quiser ser Catão aqui vai ter que ser Catão mesmo, vai ter que sujar as mãos, vai ter que colocar uma forca lá fora, ou uma fogueira, e pegar o presidente do Senado, inocente, sem nenhuma prova contra ele, e colocar para arder, para queimar. Até chegar essa hora, continuarei aqui nesta cadeira, cumprindo meu papel, sem restrição de partido de ninguém", disse Renan.

Ele reagiu a afirmação de Virgílio, segunda a qual não poderia, na condição de presidente do Senado, recorrer contra os procedimentos investigatórios. "A preocupação que tínhamos era com a possibilidade de vossa excelência, como presidente, porventura fazer valer o peso desse cargo para, de alguma forma, dificultar ou emperrar as investigações", disse Virgílio.

"As duas petições que enderecei ao Conselho de Ética foram petições públicas, na defesa dos meus direitos, dos quais eu não abrirei mão. Se quiserem a minha cadeira, e se esse desejo for um desejo político, ocasional, oportunista, circunstancial, vão ter que sujar as mãos, vão ter que dizer ao Brasil e ao mundo por que é que estão tirando o presidente do Senado Federal da sua cadeira", respondeu Renan.

Na petição enviada ao presidente do Conselho de Ética, Leomar Quintanilha (PMDB-TO), Renan alegou não ter podido exercer o seu direito de defesa e relacionou procedimentos que, segundo ele, ferem a Constituição. Representação do PSOL pediu investigação de suposta quebra de decoro pelo fato de Renan ter usado um lobista da Mendes Júnior para fazer pagamentos pessoais, à mãe de uma filha sua. A suspeita é que os recursos eram da empreiteira.

Na petição, Renan e seus advogados (Eduardo Ferrão e Baeta Neves) dizem que as apurações têm se desviado da acusação inicial. Apontam falta de "marcos objetivos da acusação", sem os quais sua defesa fica prejudicada. Pedem identificação dos limites objetivos da representação, anulação da perícia da Polícia Federal e retomada do procedimento do conselho a partir da votação do parecer de Epitácio Cafeteira (PTB-MA). Esse parecer determinou o arquivamento do processo e foi oficialmente anulado pelo presidente do conselho.

Renan contestou a competência da PF para periciar os documentos que apresentou para comprovar rendimentos suficientes para arcar com suas despesas pessoais. Alegou que a PF não tem atribuição de investigar eventual quebra de decoro parlamentar e não poderia agir sem o aval do Supremo Tribunal Federal (STF). Ontem, o presidente do conselho entregou à Mesa Diretora do Senado o pedido para que a PF aprofunde as investigações das operações citadas nos documentos de Renan. Caberá à Mesa enviar o pedido à PF, que terá 20 dias de prazo para responder.

O PSOL apresentou aditamento à representação inicial, solicitando que o conselho investigue também a denúncia de favorecimento da cervejaria Schincariol por parte de Renan. Hoje, Quintanilha decidi se aceita ou não a ampliação da investigação. Se considerar que os fatos são desconexos, o PSOL fará outra representação, específica para o caso.