Título: Processo contra Renan volta ao Conselho de Ética
Autor: Lyra, Paulo de Tarso e Ulhôa, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 04/07/2007, Política, p. A10

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), sofreu ontem duas significativas derrotas políticas, que mostram a perda gradual de sua autoridade na Casa e do apoio entre os colegas. A primeira derrota foi a decisão da Mesa Diretora devolvendo ao Conselho de Ética a representação do PSOL que pede investigação contra ele. O pemedebista queria o arquivamento ou, em última instância, que a decisão fosse tomada pelo plenário da Casa, onde acreditava ter maioria. À tarde, Renan foi submetido a duas horas de constrangimento durante a sessão, ouvindo 15 senadores defenderem seu afastamento da Presidência do Senado.

Com a decisão da Mesa, o Conselho de Ética retomou na noite de ontem a investigação contra Renan, interrompida após uma sucessão de manobras regimentais e jurídicas, promovidas por seus aliados. Renan ouviu os sucessivos apelos por sua licença e rejeitou a idéia. "Entendo que devo permanecer na Presidência do Senado, mesmo que com isso contrarie apetites políticos de ocasião", disse o senador alagoano.

A decisão da Mesa representou um novo fôlego ao trabalho do conselho. Os senadores, presididos pelo petista Tião Viana (AC), reconheceram a existência de erros no processo. Mas decidiram que o Conselho tem autonomia para saneá-los. "A Mesa reconheceu a admissibilidade da representação e a remete ao conselho para saneamento de eventuais vícios jurídicos", afirmou Viana. A decisão autoriza o Conselho a continuar as investigações contra Renan e transfere para aquele foro a decisão de considerar legal ou não as perícias feitas pela Polícia Federal.

O senador César Borges (DEM-BA) negou que a Mesa tenha exigido do Conselho a restrição no foco das investigações. "O conselho saberá agir dentro dos limites do bom senso", apostou o baiano. A questão da relatoria ainda estava em aberto. Ficou decidido que, até às 16h de hoje, os líderes dos partidos apresentarão os nomes do triunvirato de relatores do Caso Renan. Já está acertado que o PMDB indicará um relator, o bloco governista apresentará outro e o bloco PSDB/DEM, o terceiro.

A decisão da Mesa de remeter novamente o processo de Renan Calheiros ao Conselho de Ética representou um duro golpe nas estratégias de Renan. Ele sabia que a hipótese do arquivamento era praticamente impossível - numericamente, não tinha votos para isso na Mesa Diretora e, politicamente, sabia que seus pares não chegariam a tanto. "O que ele pensou que fosse acontecer? Que nós, com um abacaxi desses na mão, simplesmente arquivaríamos? Não dá, não conseguiríamos sair da Presidência do Senado sem tomar pedradas", confirmou ao Valor um dos integrantes da Mesa Diretora.

Para esse parlamentar, "não havia como desejar o inalcançável". Ele lembra que Renan vem, reiteradas vezes, adotando estratégias protelatórias em seu processo. Pior, estratégias improdutivas. "Se ele jogasse pesado e resolvesse, tudo bem. Mas só vem se complicando", confirmou um parlamentar da oposição. "Imaginem um cachorro correndo atrás de um caminhão. Se o caminhão frear, o cachorro tem que frear também. O problema é que Renan não quer frear nunca", comparou um senador integrante do Conselho de Ética. A hipótese do arquivamento, relatam integrantes da Mesa, sequer foi cogitada. Como também foi descartada a priori a idéia de remeter o processo contra Renan Calheiros ao Supremo Tribunal Federal.

Surgiram, então, duas opções. A primeira era transferir a responsabilidade da decisão ao plenário do Senado. O conjunto da Casa seria responsável por definir se o processo contra Renan Calheiros deveria ou não retornar ao Conselho de Ética. A maioria da Mesa do Senado defendia que o voto em plenário fosse aberto, já que ainda não estava em discussão o mérito da cassação de Renan. "Mas agir assim seria um pré-julgamento", afirmou um aliado de Renan, reverberando um argumento do próprio presidente da Casa. Ao perceber que o debate se alongaria, sem definição, os senadores optaram por remeter novamente o processo ao Conselho de Ética.

No plenário, o PSDB, que vinha mantendo postura mais cautelosa que o Democratas em relação às acusações contra Renan - de suposta quebra de decoro por usar um lobista da Mendes Júnior para fazer pagamentos pessoais -, foi duro. Da tribuna do Senado, o presidente da sigla, Tasso Jereissati (CE), afirmou que o afastamento de Renan do comando da Casa "é absolutamente necessário para que a população entenda como um processo limpo, sem interferências, sem manobras, sem nenhum tipo de truque que venha a toldar o processo de investigação".

Em apartes, o afastamento de Renan foi defendido por seis senadores tucanos, dois integrantes do Democratas, dois pemedebistas - Jarbas Vasconcelos (PE) e Pedro Simon (RS) -, o petista Eduardo Suplicy (SP), José Nery (PSOL-PA) e Cristóvam Buarque (PDT-DF). Jefferson Péres (PDT-AM) também informou posição do seu partido em defesa do afastamento de Renan da presidência até o final do processo contra ele, "sem o que a investigação cairá no descrédito, com grave dano à imagem do Senado e do próprio Congresso Nacional". Renato Casagrande (PSB-ES) disse que não pediria a saída de Renan, mas afirmou que "o presidente do Senado, querendo ou não, causa influência no Conselho de Ética". Casagrande chegou a ser convidado pelo presidente do Conselho de Ética, Leomar Quintanilha (PMDB-TO) para relatar o processo de Renan, mas acabou desconvidado.