Título: Juízes protestam contra foro especial
Autor: Basile, Juliano
Fonte: Valor Econômico, 06/07/2007, Política, p. A6

O Supremo Tribunal Federal (STF) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) não estão preparados para julgar processos envolvendo autoridades protegidas por foro privilegiado e deveriam repassar aos desembargadores a instrução destes processos. Os tribunais superiores deveriam se focar em outras demandas da sociedade, pois estão atolados de processos para julgar e o foro traz a sensação de impunidade à população. Essa foi a posição defendida pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) em ato realizado ontem contra o foro privilegiado e a corrupção.

Segundo estudo da AMB, o Supremo julgou, desde 1988, apenas seis dos 130 processos envolvendo autoridades e todos foram absolvidos. No STJ, foram 483 processos, 16 julgamentos e apenas cinco condenações.

"Vivemos uma situação de impunidade real", afirmou o presidente da AMB, Rodrigo Collaço. "Tanto o STF, quanto o STJ não tem julgado os processos envolvendo foro privilegiado", completou.

A AMB está defendendo a aprovação de projetos de lei no Congresso para retirar processos envolvendo ministros de estado e parlamentares dos tribunais superiores. A entidade quer que os desembargadores instruam estes processos, cabendo aos tribunais superiores apenas a decisão final. Atualmente, o STF julga ministros de estado, o presidente da República, senadores e deputados federais. E o STJ julga governadores de estados e desembargadores dos tribunais de Justiça.

A AMB defende a criação de "salas de instrução" nos tribunais superiores para julgar políticos. A instrução seria delegada a desembargadores. Nos estados, a entidade defende a criação de câmaras especializadas para julgar crimes envolvendo corrupção.

Em outro projeto de lei, a AMB quer que os processos de crimes contra o patrimônio tenham tratamento prioritário. "Se o dinheiro público estiver em jogo, o processo tem que ir para o começo da fila", afirmou o senador Pedro Simon (PMDB-RS), autor da proposta no Congresso.

Simon disse que o Supremo não tem mais condições de julgar todos os processos contra políticos. "Onze ministros não podem julgar milhares de casos. Alguma coisa deve ser feita, pois eles não têm condições de instruir estes processos", afirmou o peemedebista.

A senadora Ideli Salvati (PT-SC) lembrou que o foro privilegiado foi criado para tirar o processo do estado de atuação do político. Mas, agora, essa questão deve, segundo ela, ser reestudada, pois os processos contra políticos simplesmente não estão sendo mais julgados.

De acordo com o estudo da AMB, o Supremo recebeu 818 mil processos entre 2000 e maio deste ano. No STJ, a situação é pior: chegaram 1,5 milhão de novos processos no período.

"Tanto o STF quanto o STJ não são preparados para julgar esses processos", disse Collaço. "Por essa razão, mais do que o foro privilegiado, nós temos um foro de impunidade porque quase não há julgamentos efetivos por parte desses tribunais", completou o presidente da AMB.

O presidente da AMB ressaltou que o excesso de processos e a falta de estrutura dos tribunais superiores para julgá-los com rapidez acaba beneficiando quem tem foro privilegiado e criando a sensação de impunidade na população. "É impossível para o ministro deixar de lado os milhares de casos que tem para julgar com o objetivo de ouvir testemunhas ou praticar atos de instrução que são típicos de instâncias inferiores", disse Collaço. "O juiz não pode condenar alguém porque é mal visto pela opinião pública, nem inocentar porque é bem visto. Mas, o Judiciário deve atender uma demanda da sociedade por Justiça."