Título: Greve do servidor público precisa ser regulamentada
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 06/07/2007, Opinião, p. A12

O balanço recente dos movimentos reivindicatórios dos trabalhadores no setor público reforça a necessidade de adoção urgente de uma lei que regulamente as greves desses servidores. Há muito essa é uma exigência de uma parcela significativa da sociedade brasileira, na medida em que existe uma dicotomia no tratamento dado a trabalhadores da iniciativa privada e funcionários do setor estatal no que se refere aos seus direitos e deveres quando em greve. Deve-se, claro, aplaudir a iniciativa corajosa do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de propor uma regulamentação para as greves dos funcionários, conforme projeto que deve ser encaminhado ao Congresso Nacional no próximo mês, segundo as informações mais recentes do Ministério do Planejamento.

Pelo seu passado de operário e de sindicalista, o presidente Lula é o dirigente político ideal para tocar essa regulamentação, mesmo que ferindo suscetibilidades de líderes dos movimentos de trabalhadores e enfrentando protestos, como os que têm marcado discussões sobre o tema no Congresso e em outros fóruns de debate. As manifestações contrárias dos trabalhadores no setor público não devem, por isso mesmo, ser um empecilho para o envio do projeto para a análise de deputados e senadores.

Nesse contexto, a greve dos servidores do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente, o Ibama, pelo seu caráter essencialmente político, poderia ser considerado emblemático. Parados desde o dia 14 de maio, os funcionários protestam contra a criação do Instituto Chico Mendes, anunciada no dia 2 daquele mês pela ministra Marina Silva, do Meio Ambiente, como peça central da reestruturação da sua pasta, que estava sendo muito criticada pela demora em conceder sua aprovação para grandes projetos de infra-estrutura, como as usinas do rio Madeira. Diante da paralisação desses funcionários, o governo federal anunciou que iria suspender o pagamento dos seus salários - uma decisão que já foi para a Justiça, que a suspendeu. O curioso, nessa situação, é que uma iniciativa governamental para tentar equacionar um problema aflitivo para o país - o aumento na oferta de energia - acabou sendo usada pelos trabalhadores do Ibama para piorar o cenário.

Os funcionários públicos devem, é claro, ser ouvidos nesse processo de regulamentação das greves, assim como todos os demais interessados na questão, inclusive os contribuintes e usuários de serviços públicos. O projeto em elaboração interna no governo federal estipula regras rígidas para as greves, sendo um ponto muito importante o que determina que todos os serviços públicos são essenciais, não fazendo distinção entre eles. No projeto de lei que será enviado ao Congresso, existem quatro medidas que o governo entende como necessárias para inibir freqüentes interrupções no serviço público. A primeira é a garantia de manutenção dos serviços - deve ser fixado um quórum pré-determinado de servidores que deverão permanecer na ativa. A segunda medida estabelece a necessidade de as autoridades serem informadas com antecedência dos movimentos grevistas. A terceira medida é a realização de assembléia para formalizar a convocação de greve no setor público. O projeto deverá estabelecer um quórum mínimo para a realização das assembléias, que, caso não sejam realizadas, significará que a greve será considerada ilegal. E a quarta medida do projeto é a previsão de contratação temporária de servidores para suprir a falta dos grevistas. A justificativa desta medida é a necessidade de garantir a manutenção de serviços à população.

Por enquanto, as manifestações do funcionalismo público tem sido extremamente negativas. Há duas semanas, o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, foi vaiado quando participou de audiência na Comissão de Trabalho da Câmara, durante a qual fez defesa veemente da proposta de regulamentação da greve. Ele disse que a proposta está sendo negociada com os sindicatos dos servidores, mas avisou que, mesmo se não houver consenso, o governo a enviará ao Congresso. As greves, justificou, normalmente só trazem prejuízos ao povo. O presidente Lula também tem criticado, de forma recorrente, as paralisações do funcionalismo - e chegou a dizer que que greves de mais de 90 dias são férias.