Título: Etanol acelera e diversifica economia de Araçatuba
Autor: Lamucci, Sergio
Fonte: Valor Econômico, 05/07/2007, Especial, p. A14

A criação de empregos na região de Araçatuba avança neste ano a um ritmo mais de quatro vezes superior ao do Estado de São Paulo. Essa expansão acelerada reflete o dinamismo de uma região que ganhou impulso pelo crescimento do setor sucroalcooleiro, mas que hoje vai muito além, apesar da febre do etanol. Empresas que vendem máquinas ou prestam serviços às usinas avançam a passos rápidos, e algumas só não elevam a produção imediatamente por falta de mão-de-obra qualificada.

O crescimento acelerado que tomou conta da região se irradia para o setor de serviços, beneficiado pela expansão da classe média. Três companhias aéreas têm vôos regulares para o município - no começo do ano, era uma só. O número de leitos na rede hoteleira duplicou desde o fim de 2004, e hoje beira 2 mil. Como resultado, o emprego formal na região cresceu 22,6% de janeiro a maio, bem acima dos 4,7% da média do Estado.

A Zanardo Válvulas e Automação Industrial é uma das empresas que têm se beneficiado do boom do açúcar e álcool. No fim dos anos 90, no ápice da crise do setor, a empresa tinha oito funcionários. Hoje, são 80, que devem aumentar para 120 até 2008. O presidente da companhia, João Cláudio Zanardo, diz que, de seus 200 clientes cadastrados, 160 são usinas. "Se houvesse mão-de-obra qualificada à disposição, eu poderia contratar 20 pessoas imediatamente."

Na Saltec, empresa que começou a operar em novembro de 2005 com três funcionários e hoje tem 32, o plano é dobrar o número de empregados até dezembro. Especializada em motores elétricos, a empresa tem 62 clientes, atendendo usinas e empresas de outros setores, como alimentos. Satisfeitos com o ritmo de expansão dos negócios, os sócios Gilberto Pighinelli e Jorge Salibe Neto fazem coro à reclamação de falta de operários qualificados.

Nesse cenário, quem tem qualificação melhor se sai bem, como ocorreu com Ronaldo Gon Bordin. Desde o ano passado, Bordin é inspetor de qualidade na Zanardo, onde ganha R$ 1,3 mil por mês. Em 2002, havia trabalhado na mesma empresa na área de usinagem, recebendo metade desse valor.

Com a demanda por trabalhadores qualificados na região, Bordin arrumou outro emprego: à noite, ele dá aulas no Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), o que eleva a sua renda para cerca de R$ 2 mil. "O momento é favorável para quem tem maior qualificação por causa do crescimento do setor de açúcar e álcool", diz ele, repetindo o que se tornou um mantra na cidade.

Conhecida como a capital do boi gordo, a cana-de-açúcar começou a ganhar terreno em Araçatuba nos últimos anos. A pecuária extensiva perde espaço pela baixa rentabilidade. O presidente do grupo Unialco, Luiz Guilherme Zancaner, diz que, mesmo num momento de preços baixos para o setor sucroalcooleiro como o atual, o plantio de cana é duas a três vezes mais rentável do que a pecuária. Para ele, o boom do açúcar e do álcool mudou a cara da cidade, o que é visível no aumento do número de hotéis, restaurantes e empreendimentos imobiliários.

Na unidade de Guararapes (cidade próxima a Araçatuba), o Unialco deve moer 2,6 milhões toneladas de cana, alta de 22% em relação a 2006. O grupo tem mais uma usina, a Alcovale, em Aparecida do Taboado, Mato Grosso do Sul, e constrói outras duas: em Suzanápolis (SP), investimento de R$ 200 milhões, e Dourados (MS), de R$ 240 milhões.

O avanço do setor no Oeste paulista é impressionante. Em 2005, 62 usinas moeram cana na região, número que pulou para 72 em 2006 e vai atingir 82 em 2007. "Até 2010, a região deve ter 100 unidades", diz o presidente-executivo da União dos Produtores de Bionergia (Udop), Antônio César Salibe.

Ele explica que Araçatuba se beneficia desse movimento por ser o centro físico de uma região com um raio de 400 quilômetros, que abrange, além de São Paulo, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraná e Goiás. A localização torna a cidade atraente para empresas que pretendem atuar na cadeia do açúcar e do álcool. "O setor sucroalcooleiro é um baile muito grande, em que todo mundo pode dançar. Você pode entrar como usineiro, fornecedor de cana, prestador de serviços, representação ou como a microempresa que produz o parafuso da roda do trator."

Os negócios também vão bem para a ZBN Indústria Mecânica. De 2003 para cá, o número de funcionários passou de 30 para 80, de acordo com Celso Nicolete, um dos sócios da ZBN. A empresa trabalha na fabricação e recuperação de peças para as usinas, tendo se especializado em máquinas voltadas para a recepção, preparo e moagem da cana. A ZBN planeja a expansão dos negócios, pretendendo chegar a 150 funcionários em dois anos, incluindo os 30 que deverão trabalhar numa fundição. "Com ela, poderemos ampliar o leque de empresas que poderemos atender", diz Nicolete. O esforço é diversificar a atuação para outros setores, além de açúcar e álcool.

O secretário de Desenvolvimento Econômico de Araçatuba, Wilson Marinho da Cruz, diz que o bom momento econômico da cidade e da região não se baseia apenas no crescimento do setor sucroalcooleiro. Em breve, lembra, será inaugurada uma fábrica da Nestlé, a segunda na cidade, que vai produzir produtos infantis. A empresa informa que gastou R$ 120 milhões na unidade, que deverá exportar 50% da produção. A expectativa de Cruz é que a fábrica gere mais 500 novos empregos - na primeira são cerca de 300. Segundo a Nestlé, Araçatuba foi escolhida por três fatores: localização geográfica, sinergia de operação com a outra fábrica e malha viária da região.

Cruz cita outras empresas que vão atuar em Araçatuba, como a Alcalina Produtos Químicos e o Araçafrigo, um frigorífico que será inaugurado em agosto. Além disso, ele diz que a ida da Dedini Indústria de Base está "praticamente definida". A empresa informa que "estuda a possibilidade de implantar uma unidade em Araçatuba, mas ainda não há prazo nem investimentos definidos".

O crescimento da região chamou a atenção das companhias aéreas. Até o começo do ano, apenas a Pantanal atuava na cidade, voando entre Araçatuba e São Paulo, fazendo escala em Bauru. Em fevereiro, foi a vez da Air Minas passar a atender a cidade, com uma rota que liga os municípios de Belo Horizonte, Divinópolis, Varginha, São Paulo, Bauru, Araçatuba, Rondonópolis e Cuiabá. Em março, a Ocean Air entrou no negócio, fazendo a mesma rota da Pantanal. O diretor comercial da Ocean Air, Plínio Fernandes, diz que a empresa notou uma "oportunidade excelente", não só devido ao setor sucroalcooleiro, mas também pelas indústrias da região. "Esse é um mercado que tem um bom potencial para se desenvolver." A ocupação média dos vôos está em 60%.

A expansão acelerada começa a esbarrar em problemas estruturais. Na época de grandes eventos, como a Feicana/Feibio (Feira de Negócios do Setor de Energia), a rede hoteleira da cidade lota, e alguns visitantes são obrigados a se hospedar em cidades a até 100 quilômetros de Araçatuba.

O vice-presidente do Sindicato de Hotéis, Bares, Restaurantes e Similares de Araçatuba e Região, Liu Shiang Shien, estima que o número de leitos em hotéis pulou de cerca de mil, em 2004, para os atuais 1.979. "Há dois anos, imaginei que o aumento do número de vagas provocaria uma briga de foice entre os hotéis, mas estava enganado", afirma. Neste ano, deve ser inaugurado mais um hotel de grande porte, da rede Íbis.