Título: Multis remeterão US$ 33 bi
Autor: Martins, Victor
Fonte: Correio Braziliense, 06/01/2011, Economia, p. 17

Com dólar barato e lucros em alta, companhias estrangeiras com atuação no país vão tirar o que podem de suas filiais para melhorar os balanços

Enquanto o governo enfrenta dificuldade para conter o derretimento do dólar, um problemão para as exportações do país, as multinacionais com filiais no país estão fazendo a festa remetendo cifras bilionárias para casa. Com o real supervalorizado e a alta lucratividade dos negócios, as empresas aproveitam para comprar um volume maior de dólares e reequilibrar as contas das matrizes, que ainda sobre os efeitos da crise financeira mundial detonada em 2008. Pelas contas do Banco Central, as multis remeterão, em forma de lucros e dividendos, pelo menos US$ 33 bilhões neste ano ¿ 15% a mais do que em 2010.

O Brasil, a exemplo de outros países emergentes, tornou-se a tábua de salvação para várias multinacionais, um contraponto ao atoleiro no qual se meteram as economias da Europa, do Japão e dos Estados Unidos. Há casos em as filiais brasileiras já superaram, em termos de receitas e de lucros, as matrizes. Isso acontece em setores como o automobilístico e o financeiro. Em 2008, quando o mundo ruiu junto com a quebra do banco norte-americano Lehman Brothers, os ganhos das filiais brasileiras foram vitais para que muitas multis não fechassem o ano com prejuízo.

Para alguns especialistas, se as economias maduras continuarem em dificuldade ao longo de 2011, o que muitos não descartam, as estimativas do BC para as remessas de lucros podem ser superadas. Mesmo sem apostar em um número, analistas ponderam que as transferências para o exterior têm chance de chegar a maior cifra desde 1947, quando a autoridade monetária passou a levantar esses valores.

¿Muitas das empresas estrangeiras estão aproveitando a situação econômica bastante positiva de suas filiais para usarem o Brasil como muleta¿, afirmou Jankiel Santos, economista-chefe do Espírito Santo Investiment Bank. ¿Lá fora, a situação não é das melhores. A ideia deles é retirar recursos de onde não cause prejuízo¿, explicou. A estratégia tem sido adotada principalmente por Holanda, que, de janeiro a novembro do ano passado, levou US$ 4,2 bilhões do Brasil. Na sequência, a medida tem sido adotada por Estados Unidos (remessas de US$ 3,1 bilhões), Espanha (US$ 2,1 bilhões), França (US$ 1,4 bilhão) e Alemanha (US$ 1 bilhão).

Ranking De acordo com dados do Banco Central, a indústria e o setor de serviços foram os que mais buscaram recursos no Brasil: o primeiro, US$ 10,9 bilhões até novembro de 2010; o segundo, US$ 7,6 bilhões. A indústria automotiva lidera o ranking das empresas que mais enviaram recursos para casa: US$ 3,4 bilhões até o penúltimo mês do ano passado. Para Volvo e Fiat, por exemplo, o país está entre os mercados mais rentáveis, senão o melhor para alguns segmentos de vendas. Em segundo lugar na lista dos que mais buscaram dinheiro no país figuram as instituições financeiras, com US$ 2,1 bilhões. A indústria química e de metalurgia também tem registrado envios expressivos ¿ juntas, mandaram US$ 2,6 bilhões para as matrizes.

Para Silvio Campos Neto, economista-chefe do Banco Schahin, toda essa movimentação de remessas representa um Brasil em crescimento e com forte potencial de rentabilidade. ¿Existe falta de oportunidades no mundo e excesso de boas por aqui¿, avaliou Neto. As nações que têm enxergado essas chances de ganho e apostado mais fortemente no Brasil, segundo dados do BC, têm sido Suíça, Estados Unidos, Holanda, Áustria e França ¿ sozinhas, aplicaram US$ 22,4 bilhões no país até novembro, o que representa 60% do investimento estrangeiro direto do período.