Título: CNI cobra ação e menos discurso
Autor: Vieira, Marta
Fonte: Correio Braziliense, 06/01/2011, Economia, p. 18

Indústria pede medidas concretas para conter a valorização do real frente ao dólar

O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Braga de Andrade, reclama medidas urgentes e imediatas para o país conter os duros efeitos da desvalorização do dólar frente ao real sobre as exportações brasileiras e o avanço das importações.

Os empresários esperavam a divulgação de medidas cambiais na entrevista coletiva convocada pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, na terça-feira, mas tamanho barulho acabou funcionando como um balão de ensaio, deixando um horizonte sem definição. ¿O que acalma o mercado (financeiro) são as medidas efetivas. Às vezes, o fato de se falar que serão tomadas medidas até deixa a gente um pouco mais inquieto, porque você não se sabe quais serão elas¿, criticou.

Das declarações do ministro, avalia Andrade, só restaram sinais de que o governo está atento e vai agir ¿para proteger¿ a economia brasileira somente quando achar necessário. ¿No momento em que ele (Mantega) convocou a coletiva, a gente teve a impressão de que havia alguma medida concreta, mas ele falou apenas que o salário mínimo vai ser R$ 540¿, ironizou o presidente da CNI.

O saldo comercial de US$ 20,27 bilhões da balança comercial brasileira no ano passado deixa clara a dificuldade da indústria no mercado internacional, na avaliação do empresário. Por trás da cifra, está o bom desempenho das commodities (minérios e produtos agrícolas com cotação no mercado internacional), favorecidas pelo aumento dos preços dos metais e pela recuperação da demanda por esses bens no mundo, depois da crise financeira mundial. O sucesso foi de minério de ferro, grãos e carnes. Ainda assim, pelas projeções da CNI, as expectativas do governo de que o saldo da balança se repita este ano estão longe da realidade. Diferentemente, a entidade espera um deficit no comércio do país com o exterior este ano.

Custos Para Andrade, a situação do câmbio frustra e contribui significativamente para a redução das chances nacionais no disputado mercado mundial. ¿A indústria brasileira hoje não tem competitividade para participar do mercado externo, porque o câmbio está supervalorizado. Temos ainda muitos custos tributários inerentes aos produtos exportados e a nossa infraestrutura não é adequada¿, destacou o presidente da CNI. ¿Esperamos medidas urgentes, imediatas, que possam reverter essa situação.¿

Ele alertou ainda que a balança comercial brasileira não pode ter o seu saldo baseado apenas em commodities. ¿Tem de haver produtos manufaturados, os que têm conteúdo tecnológico¿, cobrou Andrade. Sondagens realizadas pela CNI mostram que a desvalorização cambial já vem mostrando reflexo no ritmo da produção industrial há meses. Os números relativos a novembro, que foram divulgados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostraram recuo de 0,1% frente a outubro (leia mais abaixo), embora tenha havido expansão de 5,3% na comparação com novembro de 2009. No acumulado de 2010, as fábricas produziram 11,1% a mais, ante o mesmo período do ano anterior.

Câmbio volta a fazer estrago O real supervalorizado frente ao dólar voltou a fazer estragos na indústria em novembro. No mês, houve uma retração de 0,1% no desempenho das fábricas brasileiras, na comparação com outubro, mostraram os números do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgados ontem. Em relação a um ano antes, as linhas de produção avançaram 5,3%. Mas o percentual não é animador, dado cenário recente, de elevações muito tímidas alternadas a quedas na produção desde setembro ¿ efeito direto da guerra cambial. Em outubro, a indústria havia crescido 0,3% e, em setembro, apenas 0,1%.

De outubro para novembro, 12 ramos da produção industrial brasileira amargaram queda, 14 tiveram aumento e um ficou estável. De acordo com o IBGE, a indústria de alimentos se destacou em decorrência do terceiro declínio consecutivo, com baixa de 2,1% em novembro. O resultado negativo foi influenciado pelo segmento de bens de consumo duráveis, em que a produção diminuiu 0,7%, e de bens de consumo semiduráveis e não duráveis, que sofreu redução de 0,5% . Na direção oposta, cresceu a produção de álcool e o refino de petróleo (3%), de máquinas, aparelhos e materiais elétricos (7,2%).

Dois dígitos Em relação a novembro de 2009, a alta dos bens de capital foi de 9%, acumulando uma expansão de 22,4% em 12 meses. Outro destaque foram os bens intermediários, que cresceram 1% em novembro, ante outubro, com dessazonalização, e 5,8% na comparação com o mesmo mês do ano passado. Em 12 meses, a produção dos intermediários ¿ utilizados na fabricação de outros bens ¿ aumentou 12,9%. Há consenso no mercado de que essa será a tendência futura na indústria.

Contudo, apesar dos estragos do câmbio, o crescimento da produção industrial em 2010 ficará acima dos dois dígitos, batendo o recorde da série iniciada em 1991 (o melhor desempenho anterior, em 2004, foi de 8,3%). Falta apenas o mês de dezembro para fechar a conta. Além do real valorizado ¿ o que aumenta importações e reduz as exportações ¿, para a maioria dos especialistas as causas da estagnação das indústrias está também no ajuste de estoques no segundo semestre do ano passado.

A redução da exportação de celulares, por exemplo, contribuiu para que materiais eletrônicos e equipamentos de comunicações tivessem queda de 3,6% na média móvel de três meses até novembro, o pior desempenho entre 27 ramos industriais. Mas, em novembro, a maioria das fábricas apresentou crescimento na comparação dessazonalizada (sem o efeito estatístico temporário) com o mês anterior, ao contrário do que vinha acontecendo de agosto a outubro. Esse dado pode ser um sinal de melhora.

Automóveis salvam A produção de automóveis trouxe o impacto positivo mais importante na produção industrial no acumulado de 2010, até novembro. O segmento mostrou um salto de 25,4% no período. Os piores resultados no ano são fumo (menos 8,6%) e outros equipamentos de transporte (menos 1%), influenciados pela retração na produção de aviões.