Título: Bolsa defensiva
Autor: Fariello, Danilo
Fonte: Valor Econômico, 28/06/2007, EU & Investimentos, p. D1

Atualmente, a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) bate recorde atrás de recorde de alta. Para muitos investidores, isso é um estímulo a ingressar de cabeça em ações. Para outros, mais precavidos, a valorização exacerbada significa alerta, porque o mercado poderá passar por correções no curto prazo depois de ter subido tanto. Nos dois casos, uma alternativa de aplicação para investir em bolsa são os fundos de dividendos. Essas carteiras têm papéis de empresas mais maduras, que não exigem tantos investimentos de curto prazo e, portanto, podem oferecer uma boa distribuição de lucros aos acionistas. Por conta desse pagamento fixo, essas ações tendem a ter menor oscilação no pregão.

Apesar do caráter mais conservador desses produtos, se comparados aos fundos de ações ativos ou referenciados a determinados índices, o cenário de hoje apresenta uma situação inusitada. Neste momento de forte alta das ações, as carteiras de dividendos, na média, têm apresentado retorno maior do que os demais fundos e índices.

Gestores dizem que favorecem a comparação o fato de essas carteiras de dividendos terem a vantagem de não possuir ações da Petrobras, que têm subido menos do que o mercado recentemente. Apenas essa ausência já faz a média dos fundos subir mais, diz Ronaldo Patah, responsável pela área de renda variável da Unibanco Asset Management (UAM).

Na outra mão, o mercado brasileiro em geral ainda é muito menos maduro do que o externo. Isso, somado ao forte crescimento econômico interno e internacional, faz com que mesmo as empresas brasileiras mais maduras ainda apresentem um bom potencial de alta. "O retorno desses fundos tem sido dado mais pelo aumento do valor das ações do que pelo pagamento de dividendos", diz Valmir Celestino, gestor de renda variável do Banco Safra.

Segundo dados do site Fortuna, de 20 fundos de dividendos que levam o termo no nome, 14 rendem acima dos 22,02% do Ibovespa no ano, até sexta-feira. Enquanto isso, seis oferecem rentabilidade abaixo do índice mais popular da bolsa. O ganho dessas carteiras no ano varia entre 17,54% e 35,39%. Os fundos da categoria já captaram, neste ano, mais de R$ 1,2 bilhão e somam patrimônio de R$ 3,8 bilhões. A captação desses fundos responde por praticamente um décimo do valor total investido em fundos de ações neste ano.

Se o valor das ações que pagam bons dividendos varia ao sabor do mercado, como as grandes da bolsa, o pagamento dos lucros aos acionistas garantirá uma relativa proteção. Marcelo Gerbassi, gestor de renda variável da Icatu Hartford, diz que, apenas em pagamento de dividendos, um grupo de empresas selecionadas pode oferecer 15% ao ano do valor das ações ao investidor, o chamado "dividend yield". "Esses valores ainda são muito altos no Brasil, enquanto no exterior o 'dividend yield' fica em torno de 5% do valor da ação, em geral."

Por conta desse pagamento-extra, conta Gerbassi, esses fundos tendem a ser mais estáveis do que os demais de ações, e mais sofisticados - porque implicam uma escolha ativa dos papéis que oferecem melhores quantias em forma de dividendos.

Apesar de terem subido mais, Patah, da UAM, "arrisca dizer" que esses fundos ainda são mais defensivos do que outras carteiras comuns de ações. "Numa eventual crise, as ações mais líquidas, que não fazem parte desses fundos, são vendidas inicialmente e sofrem maior oscilação." Para ele, esses fundos só seriam mais seriamente prejudicados do que os demais de renda variável se houvesse uma crise permanente mais extensa. "Essas são empresas de bens e serviços fundamentais, que, portanto, são menos abaladas com oscilações macroeconômicas", diz Patah.

Entre as empresas citadas como preferidas para preencher as carteiras de dividendos estão companhias do setor elétrico, telefonia fixa e siderurgia, principalmente. A CPFL, por exemplo, distribui aos acionistas 35% do lucro anual, a Cemig, 28%, a Tractebel, 26%. É ponderando o valor pago em dividendos e a projeção de alta dos papéis que os gestores montam os fundos. Gerbassi cita como outras opções atualmente os papéis de Telesp, Geração Tietê, Eternit, Fosfértil e Comgás, além das elétricas. "Esses dividendos garantem um pé na renda fixa para os investidores que querem começar a aplicar em ações", diz Gerbassi, da Icatu.

No Unibanco, os fundos de dividendos estão disponíveis a investidores que queiram aplicar a partir de R$ 1 mil, diz Patah. "É uma boa alternativa de diversificação de investimentos, destinada à parcela mais agressiva." O fundo mais acessível do Unibanco cobra taxa de administração de 4% ao ano. Já a carteira similar destinada a quem investir a partir de R$ 100 mil cobra taxa de apenas 1,5% ao ano. Situação similar é encontrada em outros bancos de varejo com dois fundos da categoria.

Gerbassi, da Icatu alerta, porém, que investir em fundos de dividendos - e ações em geral - é recomendado apenas como alternativa de aplicação no longo prazo, principalmente no cenário atual, que a bolsa já sobe pelo quinto ano seguido.

As instituições divergem sobre o modo em que os dividendos são entregues aos cotistas dos fundos, principalmente por questões tributárias. Os dividendos sofrem incidência de imposto de renda diretamente na fonte, ou seja, antes de serem distribuídos pelas empresas. Portanto, se entregues diretamente ao cotista sem passar pelo fundo, não se paga nada a mais. No entanto, alguns gestores preferem incorporar os dividendos às cotas, como ocorre na maioria dos fundos de ações, e reinvesti-los nos papéis. Neste caso, pode haver dupla tributação, mas os gestores que adotam esse sistema dizem que o prejuízo ao investidor tem pouca representatividade no retorno dos fundos.