Título: Economia pode crescer até 5% sem pressionar inflação, diz secretário
Autor: Ribeiro, Alex
Fonte: Valor Econômico, 22/06/2007, Brasil, p. A6

Circula dentro do governo um estudo do economista Nelson Barbosa, atual secretário de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda, que mostra que a economia pode crescer 4,5% em 2007 e 5% nos anos seguintes sem gerar pressões inflacionárias. Embora suas linhas gerais tenham sido apresentadas em maio, em um seminário sobre política monetária promovido em Washington pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), o trabalho permanece inédito no Brasil.

Ontem, pela primeira vez, o secretário apresentou as suas conclusões, depois que foi divulgado um estudo do economista José Ronaldo de Castro Souza, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que calculou que a economia pode crescer em 2007 a uma taxa anual de 3,8% sem acelerar a inflação.

Barbosa tem um papel de destaque dentro do PT. Foi chefe da assessoria econômica da campanha da reeleição do presidente Lula em 2006, cujo programa se posicionou contra as privatizações, mas isso não significa que tenha posições extremas. Enquanto muitos economistas não-ortodoxos negam ou simplesmente ignoram a existência do PIB potencial, ele reconhece que há um percentual máximo de crescimento que não acelera a inflação. "Existem limites físicos", afirma Barbosa.

O que o secretário faz em seu trabalho é apontar, com consistência matemática e teórica, as limitações das medidas do PIB potencial, argumentando que hoje seria muito mais adequado a política monetária ser calibrada com base em indicadores que medem o limite da capacidade produtiva de cada setor da economia.

O Ministério da Fazenda calcula o PIB potencial usando dez metodologias diferentes. "Todos os indicadores têm o defeito de olhar pelo retrovisor", afirma o secretário. O espelho retrovisor é um bom guia para quem dirige um carro em uma estrada reta, mas leva a erros cada vez que há uma curva adiante. As mudanças de tendência são muito freqüentes na economia, argumenta o secretário, e não são antevistas pelo PIB potencial. Isso faz com que, a cada dado estatístico novo divulgado, os cálculos do PIB potencial tenham que ser revistos.

No encontro do FMI, Barbosa apresentou um gráfico que exibe o PIB potencial calculado em diversos momentos, e o mesmo PIB potencial recalculado em períodos seguintes, incorporando novas estatísticas que vieram à luz. O resumo da história é que os dados disponíveis hoje permitem uma projeção pouco confiável do que de fato ocorre em seguida na economia. "Se as decisões de política monetária forem tomadas com base nessa projeção de PIB potencial, pode-se ter a falsa impressão de que a economia poderá se inflacionar caso o crescimento se acelere."

Essa miopia do PIB potencial fica muito clara quando o indicador é calculado por uma metodologia conhecida como filtro HP. Nela, basicamente se procura apontar a tendência do PIB potencial com base no que aconteceu com o mesmo PIB potencial no passado. Mas, segundo Barbosa, também há problemas graves quando o indicador é calculado por uma outra metodologia - a chamada função produção -, que teoricamente seria capaz de capturar as mudanças de tendência da economia.

Quando usam a função produção, os economistas basicamente procuram medir quanto o país pode crescer tendo em vista os atuais estoques de capital e trabalho e a produtividade desses dois fatores. Na teoria, seria um indicador inteligente, porque incorpora automaticamente fatos novos, como um eventual aumento nos investimentos e/ou aumento na produtividade.

O mundo real, porém, é muito mais árido que o teórico. Barbosa lembra, por exemplo, que o aumento da produtividade não é um fenômeno diretamente medido. Os economistas procuram estimá-lo com base nos dados passados - e uma metodologia muito usada é justamente o filtro HP, aquele que não consegue capturar mudanças de tendência. Mais: não existe no Brasil levantamento do estoque de capitais. Os economistas procuram estimá-lo por meio do acúmulo dos investimentos realizados a cada ano, descontada uma taxa de depreciação, mas são incapazes de incorporar mudanças no ritmo dos investimentos.

As limitações do cálculo do PIB potencial ficaram claras há alguns meses, quando o IBGE revisou a série do PIB, e os economistas perceberam que a economia pode crescer mais do que se supunha. "Hoje, os economistas estão calculando o PIB potencial em 3,8%", afirma Barbosa. "Daqui a quatro ou cinco anos, vão refazer seus cálculos de novo, e descobrir que pode crescer 5%."

O que leva Barbosa a calcular um PIB maior? Dois fatores. Primeiro, os investimentos cresceram fortemente, fruto, segundo ele, do nível de crescimento maior do PIB, da queda dos juros, do esforço do governo para baratear o investimento e do bom cenário internacional, além do ambiente macroeconômico estável. Segundo fator: a produtividade continua a se expandir, puxada pelo aumento dos investimentos, pelos ganhos de escala e pela formalização maior da economia. Numa conta rápida, ele diz que o aumento da força de trabalho contribui com 1% para o PIB, o capital com 2,5% e o aumento da produtividade, com 1,5%.

Em resumo, Barbosa diz que o PIB potencial é um bom indicador para apontar, de forma sintética, a tendência da economia. Serve também para lembrar que o crescimento da economia tem seus limites. Mas, argumenta, não deve estar no centro das decisões de política monetária. Existem informações muito mais precisas sobre o limite do crescimento nos indicadores da utilização da capacidade em cada setor da economia. Usando esse termômetro, há espaço ainda para mais demanda e juro menor. Os setores com maior uso da capacidade, diz, são justamente os que investem mais, ou os que estão mais sujeitos a competição de importados, como os bens duráveis.