Título: Aliados de Renan apostam que tramitação demorada diminua pressão por renúncia
Autor: Ulhôa, Raquel e Lyra, Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 22/06/2007, Política, p. A8

Depois de sucessivos equívocos políticos, que foram agravando progressivamente a situação do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar decidiu praticamente desconsiderar os procedimentos adotados até agora em relação ao processo por suposta quebra de decoro contra ele e recomeçar tudo. Com isso, a estratégia de Renan e seus aliados mudou: como fracassaram na tentativa de arquivar sumariamente a representação do P-SOL, agora preferem uma tramitação demorada. Apostam na redução da pressão da mídia e da opinião pública.

O próprio Renan, que até a véspera defendia pressa na solução do caso para que o país voltasse à normalidade, mudou o discurso. "Não tenho mais nenhuma preocupação com prazo, que era importante para mim para que fizesse as provas. Já fiz, elas foram periciadas, e essa questão de prazo é do conselho. Não é mais minha", disse ontem. Senadores do PMDB chegaram a falar em levar o processo em banho maria por até 120 dias.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva expressou ontem a aliados a preocupação com o desdobramento do caso Renan Calheiros no Senado. Lula teme que o clima pesado prejudique as relações com a base aliada na Casa e a votação das matérias que interessam ao governo.

Em relação a Renan, Lula não comentou nada sobre salvamento ou não do presidente do Senado. Mas um petista próximo de Lula percebeu o presidente "bastante entristecido" com o episódio. "O Lula gosta do Renan, tem um sentimento de afeto, mais do que uma relação simplesmente política", confidenciou o petista, ao Valor.

"Vão empurrar com a barriga. Já que não mataram o processo de uma vez, apostam no esquecimento", avaliou Demóstenes Torres (DEM-GO), um dos integrantes do conselho que desde o início mais defendem aprofundamento da investigação.

Com o pedido de licença médica do relator, Epitácio Cafeteira (PTB-MA), e a renúncia do relator-substituto, Wellington Salgado (PMDB-MG), 12 horas de ser indicado, o presidente do conselho, Sibá Machado (PT-AC), tem três opções: designar outro senador para a função, nomear uma comissão de três para exercer a tarefa ou manter Cafeteira, convencendo-o de aceitar mudanças no relatório que apresentou.

De acordo com líderes partidários, politicamente a melhor saída seria uma comissão suprapartidária, para diluir a responsabilidade pelo julgamento do presidente do Senado. Evitaria a suspeição levantada contra senadores mais ligados a Renan. Além disso, Sibá teve dificuldade para designar relator desde o princípio, já que ninguém quer aceitar.

O senador Eduardo Suplicy (PT-SP) colocou-se à disposição do Conselho de Ética para relatar o processo. Suplicy afirmou que não foi sondado por Sibá para a relatoria, apesar de o presidente do conselho argumentar que nenhum governista ainda se ofereceu para a função. O senador disse que está pronto para cumprir a tarefa se for necessário.

Apesar de Suplicy integrar a base aliada do governo, no Conselho de Ética ele não é da chamada "tropa de choque" de Renan. O senador petista defende maiores investigações sobre o presidente do Senado depois que a Polícia Federal revelou indícios de irregularidades na prestação de contas da movimentação financeira de Renan.

Aliados de Renan trabalham para que a relatoria seja ocupada por um senador pemedebista, mesmo partido do presidente da Casa. Sibá disse hoje estar disposto a deixar o cargo com o PMDB com o argumento de que, como maior bancada, o partido possui essa prerrogativa.

Para Demóstenes, que é promotor de Justiça, o conselho precisa investigar se houve crime para concluir pela quebra de decoro ou não. Segundo ele, a Polícia Federal tem que aprofundar a perícia dos documentos apresentados por Renan, relativos a vendas de gado, para comprovar que tinha recursos. Segundo ele, é preciso fazer a "investigação ideológica", para conferir se as operações registradas nos papéis foram efetivamente realizadas - do contrário, ficaria configurado crime de falsidade ideológica.

Perícia parcial realizada pela PF apontou "inconsistências" nos documentos. O corregedor do Senado, Romeu Tuma (DEM-SP), que foi diretor-geral da PF, disse que a corporação não pode aprofundar a investigação, a não ser que haja pedido do Supremo Tribunal Federal, fórum encarregado de investigar parlamentar acusado de crime.

"O que o conselho pode fazer é elaborar uma lista dos documentos que poderiam esclarecer as dúvidas e pedir que o próprio Renan os encaminhe, como talonário de nota fiscal, registros contábeis e talões de cheque", disse Tuma.

No fim do dia, Renan, negou, em plenário, que estivesse por trás dos boatos que atingiram senadores de oposição. Segundo esses boatos, o senador Demóstenes Torres teria viajado aos Estados Unidos com uma amante, com tudo pago pelo Senado. Demóstenes explicou que todo ano viaja a Nova York, para a sessão da ONU, e leva uma assessora, e não uma amante, com ele, porque não fala inglês. Boatos atingiram também o líder do DEM no Senado, José Agripino Maia (RN), que estaria devendo R$ 50 milhões a um banco. A assessoria de Agripino confirmou que ele tem uma dívida com o Banco do Nordeste de R$ 2 milhões, e não de R$ 50 milhões, como foi especulado. (Com agências noticiosas)